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quinta-feira, 8 de maio de 2008

REFORMAS MICROECONÔMICAS - E CRESCIMENTO DE LONGO PRAZO - ARTIGO INDICADO PELO PROFESSOR RUY

MINISTÉRIO DA FAZENDA
Secretaria de Política Econômica
REFORMAS MICROECONÔMICAS - E CRESCIMENTO DE LONGO PRAZO
Brasília, dezembro de 2004.
MINISTRO DA FAZENDA
Antônio Palloci Filho
SECRETÁRIO DE POLÍTICA ECONÔMICA
Marcos de Barros Lisboa
Chefe de Gabinete
Marcelo Leandro Ferreira
Secretários-Adjuntos
Otavio Ribeiro Damaso
Roberto Pires Messenberg
Equipe Técnica
Angelo José Mont´Alverne Duarte
Antônia Portela de Lima
Bruno Carazza dos Santos
Esteves Pedro Colnago Junior
Evandro Fazendeiro de Miranda
Fábio Ribeiro Servo
Lucyneles Lemos Guerra
Roberto Shoji Ogasavara
Sergio Rosa Ferrao
Silvio Furtado Holanda
Telma de Castro
A Secretaria de Política Econômica agradece as informações fornecidas pelas demais Secretarias do
Ministério.
A Secretaria de Política Econômica agradece, em especial, ao Secretário da Reforma do Judiciário, Dr.
Sérgio Rabello Tamm Renault, e a equipe da Secretaria da Reforma do Judiciário do Ministério da
Justiça, pela colaboração na seção sobre a Reforma do Judiciário.
Quaisquer erros remanescentes são de nossa inteira responsabilidade.
1. INTRODUÇÃO............................................................................................................... 5
2. ESTABILIDADE MACROECONÔMICA E SUSTENTABILIDADE FISCAL............ 16
3. REFORMAS MICROECONÔMICAS.......................................................................... 25
3.1 MERCADO DE CRÉDITO E SISTEMA FINANCEIRO NACIONAL......................................... 29
3.1.1 Aperfeiçoamento e Melhoria dos Instrumentos de Crédito .......................................32
3.1.1.1 Consignação em Folha de Pagamento ........................................................32
3.1.1.2 Instrumentos de Crédito e Securitização para o Setor Imobiliário .................34
Patrimônio de Afetação de Incorporações Imobiliárias ................................36
Títulos de Securitização de Créditos do Setor Imobiliário ............................37

Carta Garantia ..........................................................................................37
Valor Incontroverso..................................................................................38
3.1.1.3 Instrumentos de Crédito e Securitização para o Agronegócio .......................38
Instrumentos de Crédito do Agronegócio ....................................................40
Contrato de Opção Privado........................................................................41
Seguro Rural Privado ................................................................................42
3.1.1.4 A Cédula de Crédito Bancário (CCB).........................................................42
3.1.1.5 A Alienação Fiduciária de Bens Móveis Infungíveis e Fungíveis .................43
3.1.2 Instrumentos para Reduzir a Assimetria de Informação............................................44
3.1.2.1 Sistema de Informações de Crédito do Banco Central – SCR.......................46
3.1.2.2 Bancos Privados de Dados de Proteção ao Crédito ......................................47
3.1.3 Aperfeiçoamento do Marco Regulatório do Setor de Seguros ...................................48
3.1.4 Autonomia Operacional do Banco Central..............................................................50
3.2 MELHORIA DA QUALIDADE DA TRIBUTAÇÃO................................................................ 52
3.2.1 Desoneração da Poupança de Longo Prazo .............................................................55
3.2.1.1 Conta Investimento ...................................................................................55
3.2.1.2 Novo Regime de Tributação de Renda Fixa e Variável................................56
3.2.1.3 Novo Regime de Tributação Previdência Complementar ............................57
3.2.1.4 Redução das Alíquotas de IOF sobre Seguros do Ramo Vida.......................57
3.2.2 Mudanças na COFINS...........................................................................................58
3.2.2.1 Fim da Cumulatividade da COFINS............................................................58
3.2.2.1 Adequação do PIS/COFINS nas Operações de Hedge.................................59
3.2.3 Redução dos Impostos para Novos Investimentos ....................................................59
3.3 MEDIDAS ECONÔMICAS PARA A INCLUSÃO SOCIAL ...................................................... 61
3.3.1 Medidas de Estímulo às Microfinanças...................................................................61
3.3.1.1 Microcrédito ............................................................................................61
3.3.1.2 Focalização do Microcrédito Produtivo ......................................................63
3.3.2 Medidas para o Fortalecimento da Agricultura Familiar...........................................64
4
3.3.3 Medidas que Reduzem a Regressividade da Estrutura Tributária ..............................64
3.3.4 Medidas para Facilitar o Acesso da População de Baixa-Renda ao
Financiamento Habitacional...................................................................................65
3.3.4.1 Direcionamento de Recursos da Poupança no Âmbito do SFH.....................65
3.3.4.2 Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH) ......................66
3.3.5 Medidas para Estimular a Formalização de Pequenos Negócios e das
Relações de Trabalho ............................................................................................67
3.3.5.1 Estímulo ao Empreendedor de Baixa-Renda...............................................67
3.3.5.2 Desoneração Parcial da Folha de Pagamentos .............................................70
3.4 REDUÇÃO DO CUSTO DE RESOLUÇÃO DE CONFLITOS ................................................... 71
3.4.1 Reforma do Judiciário ...........................................................................................72
3.4.1.1 Reforma Constitucional............................................................................74
3.4.1.2 Aperfeiçoamentos Administrativos do Poder Judiciário...............................75
3.4.1.3 Reforma Processual..................................................................................76
Reforma Processual dos Títulos Judiciais ...................................................76
Reforma Processual dos Títulos Extrajudiciais............................................77
Outros Projetos de Reforma no Código de Processo Civil............................78
Reforma Processual Trabalhista .................................................................79
Reforma Processual das Execuções Fiscais.................................................80
Mecanismos Alternativos de Resolução de Controvérsias - Mediação..........80
3.4.2 Lei de Falências e de Recuperação de Empresas......................................................81
3.4.2.1 Recuperação Extrajudicial.........................................................................82
3.4.2.2 Recuperação Judicial................................................................................82
3.4.2.3 Regime de Falência ..................................................................................83
3.5 AMBIENTE DE NEGÓCIOS ............................................................................................. 87
3.5.1 Defesa da Concorrência .........................................................................................88
3.5.1.1 Reformulação do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência ..................88
3.5.1.2 Concorrência no Setor Bancário ................................................................88
3.5.2 Redução do Tempo para Abrir e Fechar Firmas.......................................................89
3.5.3 Investimentos em Infra-Estrutura ...........................................................................93
3.5.4 Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE).............................95
3.5.5 Pesquisa e Inovação..............................................................................................96
3.5.6 Desburocratização das Exportações........................................................................97
4. REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 100
5
1. INTRODUÇÃO
O Brasil apresentou significativo crescimento econômico entre o começo da década de
cinqüenta e o fim dos anos setenta do século passado, com uma taxa média de 7,4% ao ano.
Embora parte desse crescimento tenha sido absorvido pela grande expansão populacional no período,
os dados de crescimento do produto por trabalhador foram bastante significativos. A taxa anual de
crescimento do produto por trabalhador na economia brasileira foi de 3,4%, entre 1960 e 1970, e de
3,3%, entre 1970 e 1980. Contudo, a partir do início dos anos oitenta esse ímpeto de crescimento se
esgotou: a taxa de crescimento médio do PIB entre 1980 e 2002 foi de apenas 2,1% ao ano. O produto
por trabalhador decresceu a uma taxa anual de 2,1%, entre 1980 e 1985, e diminuiu à taxa anual de
0,7%, entre 1985 e 1990. Na década de noventa, houve uma recuperação da taxa de crescimento do
produto por trabalhador, que foi de 2,3% ao ano entre 1990 e 1995, e 1,0% ao ano entre 1995 e 2000.
A queda na taxa de crescimento da renda por trabalhador observada na economia
brasileira nas últimas duas décadas não ocorreu em diversos países em desenvolvimento. Os
chamados tigres asiáticos (Coréia, Cingapura e Taiwan) apresentaram crescimento do produto por
trabalhador superior ao brasileiro, mesmo no período 1960-80, e mantiveram o bom desempenho ao
longo dos anos oitenta e noventa. Considerando o exemplo da Coréia, o produto por trabalhador
cresceu à taxa anual de 5,4% no período 1960-70 e de 5,0% no período 1970-80. Na década de oitenta,
enquanto o produto por trabalhador no Brasil decresceu, a Coréia experimentou taxas anuais de
crescimento do produto por trabalhador de 5,4% no período 1980-85 e 8,2% no período 1985-90.
Gráfico 1.1 - Taxa média de crescimento do produto por trabalhador
-4%
-2%
0%
2%
4%
6%
8%
10%
1960-1965 1965-1970 1970-1975 1975-1980 1980-1985 1985-1990 1990-1995 1995-2000
Brasil Coréia
Fonte: Gomes, Pessoa e Velloso (2003).
O fraco desempenho da economia brasileira nas décadas de oitenta e noventa também é
verificado ao se comparar a evolução da renda per capita do Brasil com a de outros países
6
emergentes.1 Desde meados do século XX, a renda per capita no Brasil oscila entre 15% e 30% da
renda per capita nos Estados Unidos em paridade de poder de compra. O melhor desempenho da
economia brasileira ocorreu entre 1960 e 1980, quando a renda per capita passou de 20% para 30% da
renda nos Estados Unidos. Nas décadas de oitenta e noventa, a economia brasileira apresentou um
comportamento bem inferior ao observado nas décadas anteriores, com a renda per capita caindo de
30% a 20% em relação à renda dos Estados Unidos, enquanto outros países emergentes continuaram
sua trajetória de crescimento.
Gráfico 1.2 – Renda per capita (EUA = 100)
0
10
20
30
40
50
60
1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000
Taiwan
Brasil
Coréia
Fonte: Summers e Heston (1991,1996).
Por que o dinamismo verificado no período 1950-80 se esgotou? E, ainda mais
importante, o que fazer para recuperá-lo?
Essas questões têm gerado um extenso e produtivo debate econômico na última década. A
literatura acadêmica aplicada sobre desenvolvimento econômico apresentou grande impulso a partir da
década de oitenta, sobretudo devido à disponibilidade de bases de dados bastante amplas, contendo
informações sobre crescimento do produto e sobre características sócio-econômicas de mais de uma
centena de países para a segunda metade do século XX. Com base nessas informações, pode-se
identificar os fatores mais correlacionados com a diferença no desempenho econômico dos países.2
Um dos temas dominantes nos trabalhos recentes sobre desenvolvimento econômico é a
ênfase na importância do desenho institucional e legal tanto para o adequado funcionamento dos
mercados quanto das políticas públicas. Instituições – privadas ou públicas – funcionam
1 Os dados de renda per capita estão calculados em Paridade de Poder de Compra, seguindo a base de dados
compilada por Summers e Heston (1991,1996), e apresentados como fração da renda per-capita dos Estados
Unidos.
2 Ver, por exemplo, Sala-i-Martin (2002); Doppelhoffer, Miller e Sala-i-Martin (2003); Gomes, Pessoa e Veloso
(2003); Temple (1999); De Ferranti, Perry, Ferreira e Walton (2003); Rodrik (2003a, 2003b), Summers e Heston
(1991,1996); Easterly e Levine (2002) e o Journal of the Latin American and Caribbean Economic Association
(2002), volume 3, nº 1.
7
adequadamente caso o benefício privado de quem toma as decisões – e delas se beneficia – sejam
consoantes aos benefícios sociais.3
Em muitos casos, regras simples que garantam o cumprimento de contratos, reduzindo a
possibilidade de manipulação e a assimetria de informações, permitem o funcionamento adequado dos
mercados. Em outros casos, entretanto, há a necessidade de desenhos institucionais e legais
sofisticados, como no caso das atividades bancárias e de seguros e dos setores que apresentam
significativas economias de escala – como transmissão de energia elétrica –, o que leva ao desenho de
agências regulatórias. O desenho dessas instituições envolve diversas dificuldades técnicas, tanto para
garantir o adequado funcionamento desses mercados, quanto para garantir os corretos incentivos à
execução das políticas públicas.
Como, então, se inicia um ciclo de crescimento econômico e, mais importante, quais as
políticas públicas mais adequadas para viabilizar não só o processo de retomada do crescimento
mas, sobretudo, sua sustentação no longo prazo? A evidência empírica hoje disponível indica que
os ciclos mais longos de crescimento econômico em geral são decorrentes de aumentos iniciais da
eficiência econômica, muitas vezes conseqüência de reformas institucionais, que resultam em
aumentos da produtividade total dos fatores, da renda e da taxa de retorno das decisões de
investimento, induzindo, posteriormente, aumentos na taxa de investimento na economia. Essa
caracterização é consistente com a evidência empírica recente, que indica a causalidade da taxa de
crescimento econômico e da produtividade total dos fatores para a taxa de investimento,
desencadeando o círculo virtuoso de crescimento econômico.4
Entretanto, como aponta Rodrik (2003a), o início de um ciclo de crescimento econômico não
garante o aumento permanente da renda per capita. Caso as reformas iniciais, e seu impacto na
eficiência econômica, não sejam acompanhadas de reformas adicionais, que garantam novos aumentos
da produtividade, e de políticas sociais, que resultem em aumentos nos indicadores de saúde e
educação, o ciclo de crescimento pode se esgotar, com a economia retornando à sua distância original
em relação às economias desenvolvidas.
Na atual conjuntura, a economia brasileira possui condições para iniciar uma nova fase
de crescimento sustentado. A escolha adequada de políticas públicas e a implementação de
reformas institucionais são fundamentais para essa oportunidade de novo ciclo de crescimento
possa ser aproveitada. O caminho já está pavimentado: em decorrência da política econômica
adotada ao longo de 2003 e 2004, espera-se um crescimento do PIB de cerca de 5% em 2004, com a
3 Ver Acemoglu, Johnson e Robinson (2004), além das referências na nota 1.
4 Blomstrom, Lipsey e Zejan (1996), Klenow e Rodrigez-Clare (1997) e Hall e Jones (1999). Uma análise da
causalidade de Granger dos dados anuais das contas nacionais brasileiras entre 1970 e 2000 gera resultados
equivalentes.
8
inflação dentro das metas fixadas pelo Conselho Monetário Nacional. Esse quadro é muito diferente
daquele previsto por muitos em 2002 e 2003, e se completa com uma substancial redução da
vulnerabilidade externa, a melhoria dos indicadores fiscais e a retomada dos investimentos privados.
Ao contrário das previsões pessimistas em 2003, o regime de câmbio flutuante e a estabilização da
taxa de câmbio foram consistentes com os resultados recordes na balança comercial e com o equilíbrio
na conta de transações correntes. Diferentemente do observado nos últimos anos, em 2003 o Governo
Federal cobrou menos impostos do que em 2002.
É importante aproveitar o impulso atual da economia para que se estabeleçam as bases
do crescimento nos próximos anos. O crescimento estimula as decisões de investimento, enquanto a
estabilidade macroeconômica permite que pessoas e empresas se concentrem em planos de médio e
longo prazos. Deve-se, portanto, aproveitar a oportunidade para se discutir, com base nas experiências
internacionais e na evidência empírica, as estratégias para tentar assegurar a manutenção dessa
trajetória de crescimento nos próximos anos. A sustentabilidade das contas públicas é o centro da
política macroeconômica, tanto para a recuperação da atividade econômica observada a partir
do segundo semestre do ano passado, quanto para viabilizar o crescimento sustentável de longo
prazo. Além disso, deve-se aproveitar a estabilização macroeconômica e a retomada do nível de
produção para adotar políticas ativas de estímulo ao aumento da produtividade, à difusão de novas
tecnologias, ao desenvolvimento institucional do mercado de crédito, ao investimento em infraestrutura
e de incentivo ao empreendedorismo, de modo a garantir sólidos fundamentos para que nossa
economia possa iniciar um ciclo longo de crescimento econômico.
Este documento, sem ser exaustivo, procura explicar o contexto das medidas
institucionais e microeconômicas que já foram implementadas, as que estão sendo discutidas no
Congresso Nacional e as que estão sendo estudadas pelo Governo. Por exemplo, procura-se
mostrar a coerência de várias medidas legislativas e administrativas que vêm sendo tomadas para
melhoria da qualidade tributária, desenvolvimento do mercado de crédito, redução do custo de
resolução de conflitos, melhoria do ambiente de negócios e comércio exterior. Contudo, não são
discutidas as perspectivas das Reformas Sindical e Trabalhista, apesar do evidente impacto que ela
pode ter para estimular o crescimento e a distribuição de renda. Essas reformas têm sido debatidas no
Fórum Nacional do Trabalho, coordenado pelo Ministério do Trabalho e do Emprego, com ampla
divulgação pública. O Fórum já concluiu a primeira fase das reformas, em que se analisaram as novas
bases das relações coletivas de trabalho. Como resultado, foram propostos emenda constitucional e
anteprojeto de lei que tratam da redefinição das normas de organização sindical, representação dos
trabalhadores no local de trabalho, negociação coletiva, resolução de conflitos do trabalho, direito de
greve e substituição processual. Está sendo iniciada a discussão sobre Reforma da Legislação
Trabalhista, estando em curso a montagem de uma agenda comum entre trabalhadores, empregadores
e Governo.
9
O documento também não discute os avanços ocorridos nas Telecomunicações (definição do
marco regulatório que vigorará a partir de 2006, publicado no Decreto nº 4.733, de 10 de junho de
2003) ou do Setor Elétrico (“Novo Modelo” – Lei nº 10.848/2004) na medida em ambos os temas já
foram amplamente debatidos, com a coordenação dos ministérios setoriais. Também, não serão
analisadas as medidas que vêm sendo tomadas para favorecer a integração interministerial dos
programas de transferência de renda, nem aquelas destinadas ao pequeno agricultor, que têm sido
tratadas e debatidas pelos ministérios da área social. O documento se restringe a análise das medidas
na área econômica relacionadas à estrutura tributária, ao sistema de crédito e de estímulo ao
empreendedorismo para ampliar a formalização e a inclusão social.
A discussão a seguir se divide em duas etapas, começando com o aspecto macroeconômico
que apresenta maior impacto sobre as decisões de investimento: a solvência das contas públicas. Em
seguida, discutem-se as políticas para fortalecer o setor produtivo, desenvolver o sistema de crédito E
reduzir o custo de resolução de conflitos. Também são discutidas diversas medidas da área econômica
para ampliar a inclusão social.
A tabela I sistematiza a agenda de medidas microeconômicas, que se dividem em cinco
principais áreas: aperfeiçoamento do mercado de crédito e do sistema financeiro, melhoria da
qualidade da tributação, medidas econômicas para inclusão social, redução do custo de
resolução de conflitos e melhoria do ambiente de negócios.
As medidas na área de crédito têm por objetivo desenvolver novos instrumentos para o
financiamento privado e securitização, aperfeiçoar os instrumentos já existentes e criar
condições para a que da das taxas de juros de mercado. Alguns instrumentos já têm sido eficazes
em ampliar a oferta de crédito privada e reduzir as taxas de juros, como a consignação em folha de
pagamento. Foram criados instrumentos de financiamento específicos para a construção civil e o
agronegócio, além de aperfeiçoados diversos instrumentos de crédito já existentes para as famílias e as
empresas. Está sendo também proposta a regulamentação de bancos de dados de cadastro positivo de
crédito, que vai permitir uma queda no custo do financiamento privado.
Além disso, serão propostas medidas institucionais na área de seguros e de gestão da
política monetária: abertura do mercado de resseguros e autonomia operacional do Banco
Central. A abertura do mercado de resseguros vai estimular a concorrência no setor e a ampliação dos
produtos e serviços oferecidos. O fortalecimento do órgão regulador e fiscalizador no setor será
importante para viabilizar o crescimento sustentável do setor de seguros e a melhoria das normas
prudenciais. A evidência empírica, apresentada na subseção 3.1.4, indica que a autonomia operacional
do Banco Central permite uma gestão mais eficaz da política monetária, com menor volatilidade do
nível de produção. Como no caso das agências regulatórias, as metas de política monetária continuarão
sendo fixadas pelo Governo, cabendo ao Banco Central sua implementação. O projeto deve,
adicionalmente, prever os procedimentos a serem adotados em caso de descumprimento das metas.
10
As medidas tributárias foram orientadas para a melhoria da qualidade dos tributos –
transformando tributos cumulativos em tributos sobre o valor adicionado – e para a redução de
tributos sobre bens de capital e sobre a poupança de longo prazo. O fim da cumulatividade
elimina distorções nos preços relativos e reduz os incentivos à alocação ineficiente dos fatores de
produção, permitindo um aumento da produtividade. Foi eliminada a distorção de menores tributos
sobre os bens importados do que sobre os bens produzidos domesticamente. A desoneração dos bens
de capital e da poupança de longo prazo também têm importante contribuição para o crescimento ao
reduzir os custos do investimento e ao incentivar a formação de fontes de financiamento para prazos
mais longos. Além disso, foram reduzidos os impostos e contribuições sobre o mercado de capitais e
instrumentos de securitização, com destaque para a construção civil. Dessa forma, as medidas do
Governo têm por objetivo reduzir não apenas o custo do novo investimento, mas também o custo
do seu financiamento, as sim como estimular a formação de poupança de prazo longo e, portanto,
aumentar a taxa de crescimento do produto potencial da nossa economia.
O terceiro grupo de medidas econômicas tem por objetivo contribuir para ampliar a
inclusão social. A estrutura tributária brasileira, com uma significativa participação dos tributos
indiretos, resulta em alíquotas relativamente uniformes para os diversos grupos de renda. Por essa
razão, o Governo reduziu para zero a alíquota de PIS/COFINS sobre produtos da cesta básic a assim
como sobre diversos insumos para produção de alimentos. Essa medida beneficia, sobretudo, os
grupos mais vulneráveis que gastam uma parcela maior da sua renda com alimentos. Foram também
adotadas diversas medidas para ampliar o acesso ao crédito e ao sistema bancário dos grupos de menor
renda, assim como medidas específicas para o microcrédito produtivo. Essas medidas foram
complementadas com o Projeto de Lei Complementar 210/2004 destinado a reduzir as restrições à
formalização do empreendedor de baixa renda, destacando-se a redução para zero dos tributos
federais, alterações na contribuição para a Previdência Social e a simplificação dos procedimentos
burocráticos. Por fim, foram ampliados os recursos disponíveis para o financiamento imobiliário no
Sistema Financeiro Habitacional, medida importante tanto para reduzir o déficit habitacional brasileiro
quanto seu importante impacto no estímulo à construção civil, setor com grande impacto na geração de
empregos.
A Reforma do Judiciário, além do seu importante impacto sobre o funcionamento da
Justiça e o exercício da cidadania, apresenta uma importante contribuição para o
desenvolvimento do mercado de crédito, e para a expansão da produção e do investimento. Os
contratos, por mais completos que sejam, não conseguem prever todas as possíveis contingências
futuras. Mecanismos eficientes de resolução de conflitos garantem que esse processo de
complementação contratual ocorra de forma célere e sem elevados custos adicionais para ambas as
partes. Se os marcos legal e institucional que estruturam esses mecanismos sinalizarem um processo
moroso, custoso e com incentivos para ação protelatória por qualquer uma das partes, o custo esperado
11
das transações econômicas aumenta, sobretudo nos mercados de crédito, induzindo um menor nível de
investimento, produção e geração de empregos.
Maiores custos na resolução de conflitos levam a aumento nos preços pagos pelos
consumidores e nas taxas de juros dos empréstimos, além de, em muitos casos, excluir as
famílias que não têm acesso a garantias do mercado de crédito. Dessa forma, são penalizados os
grupos de menor renda, precisamente os que mais poderiam se beneficiar de um sistema de crédito
eficiente. Da mesma forma, são penalizadas as pequenas e médias empresas, reduzindo-se o potencial
de produção e geração de empregos da nossa economia.
A Reforma Constitucional do Judiciário está sendo complementada por um conjunto de
medidas infraconstitucionais que têm como objetivo promover a negociação para resolução de
conflitos, desestimular as ações puramente protelatórias e estimular a preservação dos ativos
produtivos e empregos durante o processo de resolução de litígios. Destacam-se a reforma da Lei
de Falências, complementada com importantes alterações no Código Tributário Nacional, mudanças
nos códigos de processo, sobretudo nas execuções de títulos judiciais e extrajudiciais, a melhoria do
sistema de recursos e o estímulo a utilização de mecanismos opcionais de resolução de conflitos, como
a mediação.
O último grande grupo de medidas tem por objetivo melhorar o “ambiente de negócios”
no Brasil por meio da simplificação burocrática, promoção mais eficiente da competição,
ampliação dos mecanismos existentes para financiamento do investimento em infra-estrutura e
estímulo à inovação e difusão de novas tecnologias. Está sendo elaborada uma reforma para
fortalecer o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, além de estender a aplicação da legislação
antitruste ao sistema financeiro. Estão também sendo estudadas medidas para simplificar os
procedimentos burocráticos exigidos das nossas empresas, que elevam os custos de produção e
desestimulam o empreendedorismo e a formalização dos negócios. O projeto de Lei sobre Parcerias
Público-Privadas, aprovado pelo Congresso Nacional, poderá ser um importante mecanismo para
financiar investimentos específicos em infra-estrutura.
O estímulo à inovação e difusão de novas tecnologias é o eixo central da Nova Política
Industrial, Tecnológica e do Comércio Exterior, coordenada pelo Ministério do Desenvolvimento,
Indústria e Comércio Exterior (MDIC). A recente criação da Agência Brasileira de Desenvolvimento
Industrial (ABDI) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) são importantes
para aprimorar os instrumentos de política existentes e garantir maior eficácia, avaliação e agilidade ao
estímulo ao desenvolvimento industrial e tecnológico. Por fim, a nova Lei de Inovação, também
recentemente aprovada pelo Congresso, vai permitir parcerias mais eficazes entre as empresas
privadas e os institutos públicos de pesquisa para a difusão, pesquisa e desenvolvimento de novas
tecnologias.
12
Tabela I – Medidas Para Viabilizar o Crescimento de Longo Prazo
Área Medidas já Implementadas Medidas em Análise no Congresso Medidas em Elaboração
Mercado de
Capitais,
Seguros,
Poupança de
Longo Prazo
e Sistema
Financeiro
Nacional
· Lei nº 10.820/2003, que institui e regulamenta a realização de
operações de crédito em consignação em folha de pagamento.
· Lei nº 10.931/2004, que estabelece regime tributário especial para
os patrimônios de afetação, institui a Cédula de Crédito Imobiliário
(CCI), a Letra de Crédito Imobiliário (LCI), a Cédula de Crédito
Bancário (CCB) e o seu respectivo certificado, aperfeiçoa a
alienação fiduciária de automóveis e estabelece o pagamento de
valor incontroverso em questionamento de financiamento
habitacional.
· Lei nº 10.823/2003 e Decreto nº 5.121/2004, que disciplinam a
subvenção ao prêmio do seguro rural.
· Lei nº 10.893/2004 e Decreto nº 5.140/2004 que disciplinam o
seguro garantia para a construção de embarcações.
· Decreto nº 5.172/2004, que reduziu a alíquota de IOF sobre
prêmios de seguro de vida, de 7% para 4%, em setembro de 2004 e
prevê nova redução para 2% em setembro de 2005 e a isenção total
em setembro de 2006.
· Resolução CMN nº 3.155/2003 que aprova a carta garantia de
recompra de Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) pelos
integrantes do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo
(SBPE), com o seu cômputo no direcionamento da poupança para
o financiamento habitacional.
· Medida Provisória nº 221/2004 (transformada no Projeto de Lei de
Conversão nº 65/2004) que institui o Certificado de Depósito
Agropecuário (CDA) e o Warrant Agropecuário (WA) como
instrumentos de financiamento da comercialização de produtos
agropecuários, o Certificado de Direitos Creditórios do
Agronegócio (CDCA), Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) e
· Projeto de Lei para
regulamentar o banco de
dados de proteção ao
crédito (Cadastro Positivo).
· Projeto de Lei para a
abertura do mercado de
resseguros.
· Proposta de Autonomia
Operacional do Banco
Central do Brasil
13
Área Medidas já Implementadas Medidas em Análise no Congresso Medidas em Elaboração
Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), como
instrumentos de securitização e financiamento da produção
agropecuária e autoriza o Governo a subvencionar o lançamento de
opções privadas.
· Lei nº 10.823/2003, regulamentada pelo Decreto nº 5.121/2004,
que trata da subvenção econômica ao prêmio do seguro-rural.
· Entrada em operação do novo Sistema de Informações de Crédito
do Banco Central do Brasil (SCR), que facilita a avaliação do risco
de crédito no sistema financeiro.
Melhoria da
Qualidade
da
Tributação
· Leis nº 10.637/2002 e nº 10.833/2003, que introduziram o fim da
cumulatividade do PIS/PASEP e da COFINS, respectivamente.
· Lei nº 10.892/2004, que institui a conta de investimento, utilizada
exclusivamente para a realização de aplicações financeiras de
rendas fixa e variável, sem a incidência da CPMF.
· Medida Provisória n° 206/2004, convertida na Lei nº 11.033/2004,
que institui nova sistemática de tributação de rendimentos de
títulos de renda fixa e variável com alíquotas decrescentes no
decorrer do tempo, cria o REPORTO e isenta do Imposto de Renda
os rendimentos auferidos em instrumentos de financiamento do
setor imobiliário.
· Medida Provisória nº 209/2004, transformada no Projeto de Lei de
Conversão nº 56/2004, que institui o novo regime de tributação da
previdência complementar com alíquotas decrescentes ao longo do
tempo, com o objetivo de incentivar o alongamento da poupança, e
extingue o Regime Especial de Tributação da Previdência
Complementar, instituído pela Medida Provisória nº 2.222/2001.
· MP n° 219/2004, transformada no Projeto de Lei de Conversão nº
62/2004, que trata sobre desconto de crédito na apuração da CSLL
e do PIS-COFINS não cumulativos, por meio de redução de prazo
para aproveitamento de crédito de PIS e COFINS, depreciação
· Unificação das regras do
ICMS.
· Criação do Imposto sobre
Valor Agregado (IVA)
nacional, em 2007.
· Aperfeiçoamento da
legislação tributária para
as micro e pequenas
empresas.
14
Área Medidas já Implementadas Medidas em Análise no Congresso Medidas em Elaboração
acelerada a ser descontada da CSLL, bem como adequação da
incidência do PIS-COFINS nas operações de hedge.
· Decreto n° 5.173/2004, que amplia a desoneração de bens de
capital.
Medidas
Econômicas
para
Inclusão
Social
· Lei nº 10.735/2003, combinada com a Resolução CMN nº
3.109/2003, direcionando recursos para operações de microcrédito.
· Resolução CMN nº 3.104/2003, que instituiu a conta corrente
simplificada.
· Leis nº 10.865/2004 e 10.925/2004, que reduzem a zero a alíquota
de PIS-COFINS sobre diversos produtos da cesta básica.
· Resolução CMN n° 3.177/2004 que realizou ajustes nas regras de
direcionamento de recursos da poupança no SFH.
· Lei n° 10.998/2004, referente ao Programa de Subsídio à
Habitação de Interesse Social (PSH), com o objetivo de destinar
recursos do Orçamento Geral da União para o financiamento de
casas populares.
· Criação do PROAGRO MAIS, que concede ao pequeno produtor
rural inscrito no PRONAF, remuneração de até R$ 1.800,00 em
caso de perda superior a 30% da lavoura.
· Medida Provisória nº 226/2004, que
institui o Programa Nacional de
Microcrédito Produtivo Orientado, com
funding em recursos do Fundo de Amparo
ao Trabalhador (FAT) e em recursos
oriundos do direcionamento de 2% dos
depósitos à vista.
· Projeto de Lei Complementar nº
210/2004, em tramitação na Câmara, que
dá tratamento tributário, previdenciário e
trabalhista simplificado para pequenos
empreendedores com faturamento anual
de até R$ 36.000.
· Desoneração parcial da
folha de pagamentos.
Redução do
Custo de
Resolução
de Conflitos
· Emenda Constitucional nº 45, de 2004, sobre a Reforma do
Judiciário.
· Emenda à Medida Provisória nº 206/2004, convertida na Lei nº
11.033/2004, que racionaliza o processo de execução fiscal tendo a
União como credora.
· Projeto de Lei Complementar nº 72/2003, que altera o Código
Tributário Nacional, mudando a ordem de prioridade de pagamento
em caso de falência, colocando o crédito com garantia real à frente
do Fisco e mantendo a prioridade máxima do crédito trabalhista até
o valor limite fixado em lei.
· Projeto de Lei do Senado nº 245/2004, em
tramitação no Senado, e que trata do
parcelamento de créditos tributários.
· Projeto de Lei Iniciado na Câmara nº
52/2004, que tramita no Senado, e trata da
reforma da execução da sentença judicial
do Código de Processo Civil.
· Projeto de Lei nº 4.497/2004, que tramita
na Câmara dos Deputados, e trata da
execução por título extrajudicial.
· Anteprojeto de Lei que
agiliza os processos
judiciais pelo desestímulo à
interposição de recursos
com objetivos meramente
protelatórios.
15
Área Medidas já Implementadas Medidas em Análise no Congresso Medidas em Elaboração
· Projeto de Lei nº 4.376/2003 (nova Lei de Falências), que estimula
a recuperação de empresa economicamente viável ou agiliza a
alienação de seus ativos produtivos, de modo a preservar a sua
capacidade produtiva.
· Substitutivo ao Projeto de Lei Iniciado na
Câmara nº 94/2002, que tramita no
Senado, e trata do uso da mediação como
mecanismo alternativo de resolução de
controvérsias.
Melhoria do
Ambiente de
Negócios
· Lei nº 10.973/2004, de incentivos à pesquisa e inovação.
· Lançamento do Programa Brasil Empreendedor em novembro de
2003;
· Resolução nº 3.227/2004, que cria o Programa de Modernização do
Parque Industrial Nacional (MODERMAQ).
· Portaria da Secretaria de Comércio Exterior (SECEX) nº 11/2004,
sobre simplificação do regime de drawback.
· Portaria SECEX nº 12/2003, conhecida como Portaria Consolidada
de Exportação, que consolida e revoga diversos normativos sobre
comércio exterior.
· Lei das Parcerias Público-Privadas, com o objetivo de viabilizar
investimentos de infra-estrutura em projetos que se caracterizam
por apresentar benefício social superior ao benefício privado
(Projeto de Lei nº 2.546/2003 ou Projeto de Lei Iniciado na
Câmara nº 10/2004).
· Projeto de Lei nº 3.443/2004, já encaminhado à sanção
presidencial, que cria a Agência Brasileira de Desenvolvimento
Industrial e o Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial,
com o objetivo de dotar o País de órgãos capazes de executar a
nova política industrial.
· Projeto de Lei Complementar nº
344/2002, em tramitação na Câmara, que
disciplina a aplicação da legislação sobre
práticas anticoncorrenciais no setor
financeiro.
· Projeto de Lei nº 3.337/2004, em
tramitação na Câmara, que torna mais
claras as funções das agências
reguladoras e do Poder Concedente e
atribui maior estabilidade à atuação das
agências pela outorga de mandato fixo a
seus dirigentes.
· Constituição de Grupo de
Monitoramento do
Programa para
Simplificação e
Racionalização do Registro
e da Legalização de
Empresas
· Projeto de reestruturação do
Sistema Brasileiro de
Defesa da Concorrência.
16
2. ESTABILIDADE MACROECONÔMICA E SUSTENTABILIDADE FISCAL
Nas últimas duas décadas, os desequilíbrios fiscais do Governo foram financiados via
aceleração inflacionária (1980-1994), dívida pública crescente e aumentos sucessivos da carga
tributária (1995-2002). O financiamento inadequado do setor público resultou em incerteza
macroeconômica e tributária, aumentando o prêmio de risco, as taxas de juros e reduzindo o
investimento privado.5 Como conseqüência, os desequilíbrios macroeconômicos e a trajetória
ascendente da dívida pública fizeram parte do quadro de baixo crescimento da renda per capita
verificado nas últimas décadas.
Os desequilíbrios nas contas públicas resultaram na expansão da dívida pública,
ampliando a relação dívida líquida/PIB (Gráfico 2.1). A expansão da dívida, porém, não foi
suficiente para acomodar esse desequilíbrio das finanças públicas, que foi financiado, em parte, por
uma elevação das receitas públicas e o aumento da carga tributária para a sociedade.
O financiamento inadequado do setor público contribuiu para que a economia
conseguisse, nos melhores momentos, apenas surtos curtos de crescimento da atividade
produtiva. Nos anos oitenta, a inflação, além de corroer a renda real do trabalhador e os lucros,
introduziu um grau de incerteza elevado que inibiu os investimentos. Após o Plano Real, a carga
tributária crescente elevou os custos de produção, estimulou o aumento da informalidade e restringiu a
expansão do crédito, da capacidade produtiva e do consumo.
Gráfico 2.1 – Dívida Líquida do Setor Público (% PIB)
25
30
35
40
45
50
55
60
65
1992 1994 1996 1998 2000 2002 2004
Fonte: Banco Central do Brasil
5 Deve-se enfatizar que a política cambial no período 1995-1998 resultou em pressões sobre a política monetária,
com impactos sobre a trajetória da dívida pública neste período. Os desequilíbrios fiscais do período, além de
contribuírem para a elevação da dívida, também impunham limites aos demais aspectos da política
macroeconômica.
17
Gráfico 2.2 – Carga Tributária (% PIB)
Fonte: Secretaria da Receita Federal.
O objetivo da política econômica do Governo é criar, em um ambiente de estabilidade
econômica, condições favoráveis ao aumento da eficiê ncia econômica do setor produtivo, à
melhoria do acesso ao crédito e ao aumento da taxa de investimento na economia brasileira,
para superar os entraves à retomada do crescimento sustentável da renda per capita.
É nesse contexto que se insere o ajuste estrutural das contas públicas que vem sendo
implementado pelo Governo e sinaliza um compromisso com a sustentabilidade fiscal de longo prazo.
Uma estrutura fiscal de longo prazo, consistente com as obrigações do setor público, reduz o
risco de financiamento inadequado do setor público e a incerteza macroeconômica, permitindo
menores taxas de juros, a expansão do crédito interno e da taxa de investimento6. Além disso, a
redução dos custos de financiamento do setor público permite uma melhoria da composição da dívida
pública, reduzindo as restrições sobre a política econômica e possibilitando uma maior eficácia na
resposta a eventuais choques de oferta.
A austeridade na administração das contas públicas pode ser verificada pelos resultados
primário e operacional do setor público obtidos em 2003 e 2004, que mostram consistência com
as metas estabelecidas e apontam também para uma sensível melhora na evolução recente da
poupança do Governo. Em 2003, o superávit primário do setor público consolidado alcançou 4,25%
do PIB – contra 3,89% do PIB em 2002 – o que é bastante significativo quando se considera que a
arrecadação de receitas extraordinárias em 2003 foi inferior a do ano anterior em montante equivalente
a 1% do PIB. Além disso, a aceleração inflacionária ocorrida em 2002 aumentou as receitas públicas
no mesmo ano, porém seu impacto nas despesas ocorreu apenas em 2003.
Em 2004, houve um excesso de arrecadação decorrente tanto da forte retomada da atividade
econômica, quanto da nova base de arrecadação da COFINS. Mudanças de base de arrecadação de
6 Para uma discussão sobre política fiscal e crescimento econômico, ver Easterly e Rebelo (1993).
28
29
30
31
32
33
34
35
36
1994 1995 1996 1997 1998 1999 200 2001 200 200
18
impostos podem levar a um aumento temporário da arrecadação tendo em vista os tributos sobre os
estoques existentes e o processo de ajuste dos setores produtivos à mudança tributária.
O Governo tem o compromisso com a manutenção da carga tributária em 2005 ao nível
observado em 2002. Esse compromisso levou a adoção de dois grupos de medidas principais frente ao
aumento de arrecadação. Por um lado, foram reduzidos os impostos em diversos setores,
permitindo melhorar a qualidade do nosso desenho tributário e estimular a retomada do
crescimento econômico. Por outro lado, o aumento temporário da arrecadação, aumento esse
que tende a se diluir no próximo ano, foi utilizado para aumentar a meta de superávit para 4,5%
do PIB.
O superávit primário acumulado nos últimos 12 meses atingiu 4,6% do PIB, 0,3 ponto
percentual acima do observado em igual período de 2003. Além disso, o déficit nominal vem caindo
de forma acelerada, de 10,3% do PIB em 2002 para 3,6% do PIB em 2003, e 2,4% do PIB nos últimos
12 meses, como mostram os gráficos 2.3 e 2.4.
Gráfico 2.3 – Poupança Operacional e Déficit Nominal do Setor Público (% PIB)
-10
-5
0
5
10
15
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Poupança Operacional
Déficit Nominal
Fonte: Secretaria de Política Econômica e Banco Central do Brasil.
Gráfico 2.4 – Superávit Primário do Setor Público
-6%
-4%
-2%
0%
2%
4%
6%
8%
1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Fonte: Banco Central do Brasil.
19
Em paralelo à política fiscal, houve uma melhoria no perfil da dívida pública em 2003 e
2004. A dívida pública mobiliária indexada ao câmbio (incluindo swaps) foi reduzida em 27 pontos
percentuais, passando de US$ 65 bilhões (R$ 231 bilhões) no final de 2002, o que representava 37%
da dívida total, para US$ 30 bilhões (R$ 81 bilhões) em novembro de 2004, ou cerca de 10% da dívida
mobiliária. Simultaneamente, verificou-se o aumento da parcela formada por títulos pré-fixados do
Tesouro Nacional, que passou dos inexpressivos 2,2% ao final de 2002 para 18,7% em novembro de
2004. O bom desempenho fiscal do Governo Central pode ser inferido, também, a partir da evolução
de sua poupança em conta corrente, que ao longo de 2003 acumulou 3,0% do PIB, e que no últimos 12
meses, findos em outubro, atingiu 3,3% do PIB. Em outubro de 2004, o valor acumulado da poupança
em conta corrente do Governo Central no ano era de 4,0% do PIB. A relação Dívida Pública
Consolidada/PIB apresentou significativa redução em 2004.
A redução da dívida indexada à taxa de câmbio reduziu uma importante fonte de
vulnerabilidade externa da nossa economia. No passado, choques externos negativos, além dos seus
impactos diretos sobre o nível de preços e a atividade econômica, tinham um efeito adicional de
elevação da dívida pública indexada à taxa de câmbio, aumentando a pressão sobre as contas públicas.
O aumento da parcela da dívida pré -fixada, por outro lado, requer a confiança das famílias,
empresas e investidores institucionais no compromisso do Governo com a estabilidade do nível
de preços. Nesse caso, reduz-se o risco de elevação inesperada das taxas de inflação, reduzindo o
risco associado à compra de títulos pré-fixados, e aumentando a qualidade da dívida pública.
Gráfico 2.5 – Composição da Dívida Mobiliária Federal
0
50
100
150
200
250
1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Dívida Mobiliária Federal Pré-fixada
Dívida Mobiliária Federal Cambial com swap
R$ bilhões
novembro
Fonte: Secretaria do Tesouro Nacional.
A política monetária adotada nos primeiros meses de Governo permitiu a rápida
redução das taxas de inflação observadas, bem como das expectativas de inflação. A rápida
20
redução das taxas de inflação cumpre um duplo papel na política econômica. Por um lado, a evidência
empírica internacional indica que taxas anualizadas de inflação de dois dígitos são potencialmente
instáveis, isto é, na ausência de medidas para reduzi-las, tendem a acelerar-se ainda mais e a aumentar
a volatilidade macroeconômica, com impactos negativos sobre a taxa de crescimento de longo prazo.7
Por outro, taxas de inflação elevadas reduzem a renda real disponível dos grupos mais pobres da
população, aumentando a desigualdade distributiva. A rápida redução das taxas de inflação, no
segundo semestre de 2003, interrompeu o processo de queda da massa real dos rendimentos do
trabalho que se verificou a partir de meados de 2002 com a aceleração inflacionária.
A política monetária foi adotada de forma consistente para assegurar que a inflação
voltasse para patamares condizentes com a retomada sustentável da taxa de crescimento do
produto. A firmeza no ajuste do nível dos juros básicos permitiu uma redução rápida da taxa de
inflação a partir do segundo semestre de 2003. Este desempenho ocorreu em conjunto com a forte
retomada da taxa de crescimento econômico.
Gráfico 2.6 – Inflação Esperada em 12 Meses
0%
2%
4%
6%
8%
10%
12%
14%
nov/01 mar/02 jul/02 nov/02 mar/03 jul/03 nov/03 mar/04 jul/04 nov/04
Fonte: Relatório FOCUS/Banco Central do Brasil.
A condução de uma política econômica voltada para a recomposição da sustentabilidade
dos fluxos de receita e despesa pública e o sucesso do programa de combate à inflação
permitiram uma queda substancial das taxas de juros reais de mercado. A taxa de juros para o
prazo de 1 (um) ano caiu de mais de 27% no começo de 2003 (entre 15% e 16%, em termos reais,
descontada a inflação esperada para o período correspondente) para menos de 18% recentemente (ou
pouco acima de 11% em termos reais).
7 Fischer (1993).
21
Gráfico 2.7 – Taxa Real de Juros Esperada
21,4%
11,1%
8
10
12
14
16
18
20
22
24
abr/02 ago/02 dez/02 abr/03 ago/03 dez/03 abr/04 ago/04
Fonte: BM&F e Relatório FOCUS/Banco Central do Brasil.
A política de câmbio flutuante, aliada a uma agressiva agenda de comércio exterior, vem
permitindo um significativo ajuste das contas externas apoiado no forte crescimento das
exportações. Em conseqüência, houve uma significativa melhora das relações dívida externa
bruta/exportações e serviço da dívida/exportações. Esses efeitos positivos da recuperação da
credibilidade monetária, do equilíbrio fiscal e do ajuste externo sobre as trajetórias das taxas de juros e
das expectativas de inflação, juntamente com os efeitos positivos sobre as trajetórias dos prêmios de
risco e da taxa de câmbio, são essenciais para a construção de um ambiente propício à retomada do
investimento privado e do crescimento econômico.
Além disso, o Governo já está implementando um programa de recomposição das
reservas externas para aumentar a solidez da nossa economia frente a eventuais choques
externos, e construir uma trajetória saudável para os níveis de reservas no médio e longo prazo.
Essa medida, em conjunto com a redução da dívida interna indexada à taxa de câmbio, reflete a
estratégia de aproveitar o momento favorável, tanto das condições internas quanto externas, para
reduzir as fontes de vulnerabilidade externa da nossa economia.
Gráfico 2.8 – Taxa de Câmbio Real Efetiva (06/94=100)
60
80
100
120
140
160
180
out/94 out/95 out/96 out/97 out/98 out/99 out/00 out/01 out/02 out/03 out/04
Fonte: Banco Central do Brasil.
22
Gráfico 2.9 – Razão entre a Dívida Externa e as Exportações
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
3,5
4,0
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Fonte: Banco Central do Brasil.
Gráfico 2.10 – Saldo Comercial e em Transações Correntes
-40.000
-30.000
-20.000
-10.000
0
10.000
20.000
30.000
40.000
1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Saldo comercial Transações correntes
(US$ milhões)
Fonte: Banco Central do Brasil.
Em raros momentos de sua história, a economia brasileira reuniu fundamentos
macroeconômicos tão positivos e promissores. O produto em expansão por cinco trimestres
seguidos, com taxa anualizada de 6% ao ano, tem propiciado um contínuo aumento do emprego e da
renda, permitindo a ampliação do consumo das famílias. A estabilidade alcançada nos preços e a
redução da volatilidade cambial têm levado a sucessivos recordes na balança comercial e, pela
primeira vez em dez anos, a um superávit na conta de transações correntes.
A política de equilíbrio fiscal foi fundamental não apenas para a forte retomada da
atividade econômica como também é uma das condições necessárias para que o Brasil inicie uma
trajetória sustentável de crescimento de longo prazo. A estratégia fiscal do Governo engloba a
manutenção dos superávites primários em um nível necessário para assegurar a queda na razão dívida
líquida/PIB nos próximos anos e o alongamento dos prazos de vencimento da dívida mobiliária.
23
O equacionamento fiscal permitirá ao País, inclusive, adotar políticas fiscais mais
saudáveis, que garantam a preservação, e, futuramente, a ampliação dos gastos sociais do
Governo nas fases de retração da atividade econômica, sendo estes gastos financiados com os
recursos fiscais acumulados nos momentos de maior expansão da atividade. Pela sua própria
natureza, o gasto público tende a aumentar, como fração da renda nacional, nos momentos de menor
atividade econômica. Diversos programas públicos devem ser mantidos independente da atividade
econômica, como os programas sociais, além de diversos programas que são desenhados para
aumentar seus gastos nos momentos de retração, como por exemplo o seguro-desemprego. Com a
melhora da qualidade da política fiscal, o Governo deixará de contribuir para o agravamento dos ciclos
econômicos e terá condições de elevar os gastos sociais nos períodos de retração econômica,
precisamente quando estes gastos têm maior impacto sobre o bem-estar socia l.
A construção de políticas fiscais mais saudáveis encontra restrições na dinâmica de
despesa e receita públicas da nossa economia e na qualidade do gasto público. Em diversos casos,
as regras existentes para rubricas específicas do orçamento implicam aumentos constantes da parcela
das receitas primárias alocadas como fração da renda nacional, reduzindo a disponibilidade de gastos
públicos em outras atividades. Além disso, o Estado brasileiro acumulou, no passado, um conjunto de
obrigações de subsídio e transferência de recursos a diversas atividades e grupos específicos, sem a
contrapartida de avaliação do desempenho e do impacto social destes gastos. Dessa forma, verifica-se
a existência de elevados dispêndios do setor público de incentivo a atividades produtivas, bem como a
existência de renúncias fiscais e previdenciárias para setores específicos e de gastos com políticas
públicas e transferências a determinados grupos sociais, que comprometem de forma crescente os
recursos públicos existentes.
Essa dinâmica crescente de dispêndio público resultou no aumento da carga tributária
de 29% em meados dos anos noventa para cerca de 35% do PIB nos dois últimos anos, além de
ser, em parte, responsável pelo crescimento da relação dívida/PIB do patamar de 30% em 1994
para 56% no fim de 2002. Esse desequilíbrio fiscal verificado nas últimas décadas na economia
brasileira é um dos principais responsáveis pela instabilidade de variáveis macroeconômicas
fundamentais para uma estratégia de crescimento equilibrado de longo prazo, como a taxa de inflação,
a taxa de juros de mercado, a taxa de câmbio e a relação dívida/PIB.
A dinâmica de despesa do setor público brasileiro tem conseqüências negativas sobre a
capacidade de financiamento do investimento público em diversas áre as, inclusive em infraestrutura,
e também restringe a capacidade de gasto nos grupos sociais mais vulneráveis. Devese
enfatizar que o desempenho observado em diversas áreas, sobretudo na redução da desigualdade de
renda, é significativamente inferior ao observado em países semelhantes ao Brasil e com volumes de
24
gastos proporcionalmente inferiores aos aqui praticados.8 Além disso, parcela significativa da
transferência de renda realizada pelo Governo Brasileiro é destinada aos grupos de renda mais elevada,
preservando a desigualdade de renda. Nos países desenvolvidos, as transferências de renda, assim
como a arrecadação tributária, reduzem de forma significativa a desigualdade de renda.
A escolha democrática e socialmente eficaz do destino dos recursos públicos requer a
avaliação do impacto de desempenho relativo dos diversos componentes dos gastos realizados
pelo Governo, em um quadro comparativo que englobe também programas alternativos não
implementados. Além disso, essa escolha requer, igualmente, a análise dos grupos sociais
beneficiados com a transferência de recursos públicos.
Dessa forma, devem ser criados instrumentos de gestão, monitoramento e avaliação das
políticas públicas de modo a garantir que, para os diversos objetivos da ação do Estado, sejam
utilizadas as políticas e programas mais eficazes e socialmente mais justos. Todo programa ou
política deve possuir metas e objetivos transparentes, que permitam a permanente avaliação de seu
desempenho relativo. De forma similar, todo novo programa ou política deve ser acompanhado de
objetivos e metas específicas e deve ser objeto de uma avaliação ex-ante dos impactos esperados, além
da avaliação ex-post de desempenho.
A avaliação de programas não se restringe à mensuração das metas gerais previamente
estabelecidas. Os procedimentos adotados devem permitir a avaliação controlada dos impactos diretos
de cada programa, medindo os efeitos sobre o público-alvo por comparação com grupos de controle
efetivos ou mediante técnicas de simulação de contrafactuais [Heckman (2001a, 2001b)]. O objetivo
desses procedimentos é avaliar os impactos marginais decorrentes da adoção de cada programa
específico, o que requer estimar não apenas os indicadores que seriam obtidos caso o programa não
fosse adotado como também os possíveis impactos relativos de programas opcionais. Além disso,
devem ser mensurados os efeitos colaterais, muitas vezes imprevistos, dos diversos programas. Este
processo vai permitir um aprimoramento contínuo da eficácia da ação do Estado.
Em particular, no caso das políticas de incentivo e subsídio às atividades produtivas, como
enfatizado no documento Diretrizes de Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior,
divulgado pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), devem ser
pré-estabelecidos prazos de duração dos incentivos, metas de desempenho e redução progressiva dos
incentivos, de modo a garantir a utilização mais eficaz, transparente, democrática e socialmente justa
dos recursos públicos.
8 O documento “Gastos Sociais do Governo Central: 2001 e 2002”, publicado pelo Ministério da Fazenda em
2003, apresenta dados comparativos do gasto público e seu impacto na desigualdade de renda para diversos
países.
25
3. REFORMAS MICROECONÔMICAS
O desenvolvimento do mercado de crédito e securitização é importante para permitir a
expansão das decisões de gasto privado e, em particular, do investimento produtivo. No Brasil, ao
longo dos últimos anos, observou-se um expressivo avanço na modernização do mercado de crédito –
em grande parte acompanhando os avanços tecnológicos da última década – bem como da estrutura de
fiscalização e supervisão bancária. Todavia, nossos indicadores de volume de crédito, custo e
instrumentos de financiamento existentes ainda estão bem aquém do que seria adequado para o nível
de desenvolvimento da nossa economia.
O principal problema do mercado de crédito no Brasil está em não cumprir, de forma
adequada, a sua função de canal de transmissão dos fluxos de poupança para o financiamento
dos investimentos produtivos. O mercado de crédito brasileiro se caracteriza por reduzidos volumes
emprestados. O crédito bancário concedido ao setor privado vem se mantendo, nos últimos anos, em
torno de 25% do PIB. Essa é uma proporção muito baixa quando comparada a outros países em
desenvolvimento, como o Chile, onde essa proporção chega a 54% do PIB e, mais ainda, quando
comparada com os países desenvolvidos, onde essa proporção é freqüentemente superior a 70%.
Vários são os fatore s que podem explicar o baixo desenvolvimento do nosso mercado de
crédito: (i) incertezas decorrentes dos desequilíbrios macroeconômicos; (ii) problemas institucionais e
de segurança jurídica das operações; (iii) elevados índices de inadimplência e (iv) preferência para
aplicação de recursos em títulos públicos, que oferecem alta liquidez, baixo risco e elevada
rentabilidade. Nesse aspecto, cabe ressaltar que o ajuste sustentável das contas públicas terá impactos
positivos sobre o mercado de crédito, ao reduzir a incerteza macroeconômica e ao liberar recursos da
poupança privada, que hoje financiam o setor público, para o financiamento de atividades produtivas.
Destacam-se ainda como entraves ao desenvolvimento do mercado de crédito as
dificuldades existentes em executar as garantias concedidas e os custos do processo de execução
destas garantias. Esses fatores elevam os spreads das operações creditícias e, por conseqüência, as
taxas de juros pagas pelos tomadores. Enfim, o baixo volume de crédito e os elevados spreads
bancários constituem sintomas da baixa eficiência desse mercado, o que inibe o aumento da taxa de
investimento produtivo.
No mercado brasileiro, um dos fatores mais evidentes que justificam o baixo volume e o
elevado custo do crédito são os longos e onerosos processos de execução das garantias e
ressarcimento de dívidas, prevalecendo, inclusive, a incerteza se após esses processos as dívidas
serão ou não pagas. O processo de cobrança de dívida no Brasil, muitas vezes, é usado não como um
meio de questionamento de direitos, mas como um instrumento de procrastinação do cumprimento de
obrigações.
26
Naturalmente, os maus pagadores representam uma parcela menor do universo dos mutuários.
Contudo, na ausência de informações que permitam, antes da concessão de crédito, diferenciar os bons
dos maus pagadores, os primeiros acabam sendo penalizados, problema que é conhecido na literatura
econômica como seleção adversa. A existência de seleção adversa leva invariavelmente à perda de
bem-estar por parte dos agentes com menor risco. Dessa forma, os indivíduos que cumprem suas
obrigações acabam arcando com os custos decorrentes daqueles que não a cumprem. Em alguns casos,
inclusive, a existência de seleção adversa leva à saída do mercado por parte dos agentes com menor
risco, ao aumento das taxas de juros de mercado e ao racionamento de crédito [Stliglitz e Weiss
(1981)].
O funcionamento adequado dos processos de execução de garantias e ressarcimento de
dívidas, essenciais para baratear e ampliar a oferta de crédito, dependem do arcabouço
institucional.
A esse respeito, é interessante destacar o estudo realizado por Djankov, La Porta, Lopez-de-
Silanes e Shleifer (2003). Em uma amostra de 109 países, os autores medem os custos de recuperação
de cheques sem fundo e os custos envolvidos em uma ação de despejo contra um inquilino
inadimplente. Essas informações são então utilizadas para se construir um indicador de formalismo
dos procedimentos judiciais na resolução de disputas. As economias mais pobres tendem a
apresentar maior formalismo dos procedimentos (processos judiciais lentos e custosos) e que não
parece haver motivo associado à qualidade dos serviços jurídicos que possa explicar este maior
formalismo. Ao contrário, a evidência é que esse elevado nível de formalismo em países pobres
está relacionado a uma pior qualidade dos serviços prestados.
No Brasil, um problema semelhante ao verificado no mercado de crédito ocorre com a
arrecadação de impostos. Em decorrência das dificuldades em executar débitos fiscais, a carga
tributária acaba concentrada nos poucos setores com melhor governança e maior transparência de
balanços, distorcendo a atividade econômica por meio da cobrança de uma alíquota marginal elevada
daqueles que pagam imposto. Dessa forma, as dificuldades com a execução de débitos privados e
tributários concorrem tanto para a elevação dos spreads bancários quanto das alíquotas marginais de
imposto que incidem sobre os setores da economia com maior grau de transparência. O setor
financeiro, no Brasil, é particularmente transparente e, por esta razão, sujeito à elevada tributação,
encarecendo as operações de crédito.
Por essas razões, um dos principais desafios do Governo está em implementar medidas e
reformas que melhorem a segurança, previsibilidade e eficiê ncia do arcabouço
jurídico-institucional, permitindo que o mercado de crédito no Brasil passe a cumprir de forma
mais eficiente sua função de canal de transmissão da poupança para os investimentos
produtivos, aumentando a taxa de crescimento potencial da nossa economia.
27
As reformas implementadas ou ainda estudo no âmbito do mercado de crédito, como
detalhadas a seguir, buscam aumentar a segurança jurídica das operações de crédito e ampliar
os instrumentos de financiamento e securitização à disposição do setor privado.
Um segundo ponto importante da agenda de reformas microeconômicas é a melhoria da
qualidade da tributação no Brasil, merecendo destaque as mudanças tributárias para incentivar
a formação de poupança de longo prazo. Do lado do indivíduo, o desenvolvimento de instrumentos
previdenciários e outros instrumentos de poupança de longo prazo permite ampará-lo na sua fase de
inatividade econômica. Do lado do investimento produtivo, a existência de uma fonte de recursos
financeiros que possa ser utilizada em aplicações de longa maturação é importante para alavancar o
crescimento econômico do País.
O novo regime não cumulativo da COFINS representa um importante avanço na
qualidade de nosso desenho tributário, reduzindo as distorções de preços relativos e a perda de
eficiência decorrente. Além disso, o Governo corrigiu diversas distorções setoriais, como no caso dos
setores monofásicos que pagavam alíquotas distintas dos demais setores econômicos, e os bens
importados, que eram tributariamente favorecidos em relação à produção doméstica.
A agenda de reformas inclui um conjunto de medidas que têm por objetivo promover
uma maior inclusão social e reduzir a desigualdade de renda. Essas medidas buscam promover a
inclusão social pelo maior acesso ao crédito, a desoneração tributária de bens de primeira necessidade
(principalmente alimentos) que possuem maior peso no orçamento das famílias de baixa-renda, o
acesso em condições mais favoráveis ao financiamento habitacional e o estímulo ao
empreendedorismo e à formalização das relações de trabalho. Considerando ainda que o problema da
informalidade – seja a informalidade do negócio ou a informalidade das relações de trabalho – afeta,
sobretudo, os segmentos de mais baixa renda, induzindo menor produtividade e maior rotatividade da
força de trabalho, atenção maior tem sido dada ao pequeno empreendedor.
Estão também em curso reformas microeconômicas adicionais, algumas essenciais para o bom
funcionamento do crédito, mas que assumem outras dimensões igualmente importantes para o
desenvolvimento econômico e social brasileiro. Nesse contexto, inserem-se várias iniciativas que
buscam tornar mais eficientes os mecanismos de resolução de conflitos. Os contratos não
conseguem prever todas as possíveis contingências, sendo essencial que eventuais controvérsias
possam ser resolvidas de forma mais eficiente e com menores custos para as partes envolvidas.
Processos longos e com muitos procedimentos protelatórios encarecem as decisões de crédito,
investimento, produção e emprego. Alé m disso, em muitos casos os incentivos da nossa atual
legislação induzem a depreciação acentuada de ativos produtivos durante o andamento dos processos,
reduzindo a capacidade de produção da nossa economia.
28
A reforma da lei falimentar brasileira, que passa a centrar seu foco na recuperação das
empresas em dificuldades, busca alinhar os incentivos para a participação das partes
interessadas, como empregados e credores, no processo de recuperação da empresa. Com isso,
espera-se preservar empregos e o investimento realizado, assim como reduzir a mortalidade
empresarial no Brasil. Caso não seja possível a recuperação da empresa, a lei racionaliza o rito da
falência, elevando o grau de governança de credores e a qualidade de gestão da massa falida, tendo por
objetivo a preservação dos ativos produtivos e os empregos gerados.
Em relação à resolução de conflitos no âmbito dos contratos econômicos em geral,
matéria cível na doutrina do direito, tem sido observadas uma série de distorções, em especial,
no que se refere à execução contratual. Nos contratos de crédito esse é um tema recorrente. O credor
compromete seu capital ou o capital de terceiros em operações cujo prazo médio de recuperação do
valor emprestado, em caso de inadimplência, é de 5 anos, em grande parte devido à existência de
diversos instrumentos processuais, em especial recursais, que possibilitam a protelação do processo.
Essa situação confere grande insegurança jurídica para a concessão do crédito e a contratação em
geral, obrigando às empresas a uma série de salvaguardas de elevado custo e um nível sub-ótimo de
contratação. Uma conseqüência importante dessas dificuldades é o grande número de excluídos do
mercado de crédito tradicional, devido à elevada insegurança na recuperação do crédito em caso de
inadimplência. De forma análoga, há uma série de aperfeiçoamentos da gestão administrativa dos
tribunais que permitem a redução de custas judiciais e uma maior celeridade na tramitação processual.
Mecanismos alternativos de resolução de controvérsias, como Juizados Especiais, mediação e
arbitragem também devem ser incentivados e disseminados.
A boa qualidade do ambiente em que os negócios se realizam é importante para o bom
desempenho da economia. O ambiente deve ser marcado pelo estímulo à prática concorrencial.
A concorrência estimula investimentos em inovação de produtos e reduz o custo de aquisição para
firmas e consumidores. Como a legislação brasileira implica processos desnecessariamente morosos
para verificação das condições de concorrência em casos de aquisição ou fusão de empresas, o
Governo irá apresentar projeto de lei para reestruturar o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência,
além do projeto já apresentado que estende a legislação antitruste ao Sistema Financeiro Nacional.
A melhoria do ambiente passa também pela redução dos custos para a abertura e o
fechamento de empresas. O excesso de burocracia nesses procedimentos tem implicado perda
substancial de recursos das empresas e desestímulo ao empreendedorismo. A fim de reduzir esses
problemas, o Governo Federal vem discutindo com Estados, Municípios e representantes da sociedade
civil um conjunto de medidas para simplificar os procedimentos para a abertura e o fechamento de
empresas.
29
Para a melhoria do ambiente de negócios, são essenciais investimentos em
infra-estrutura. A política fiscal tem permitido recompor a poupança pública e, portanto, contribui
para recuperar a capacidade do Estado de realizar investimentos públicos em infra-estrutura. A Lei das
Parcerias Público Privadas é um instrumento adicional, pelo qual se busca criar condições para
ampliar a participação dos investimentos privados em projetos de infra-estrutura com alto retorno
social.
O estímulo à inovação e à difusão de novas tecnologias é outra ação importante para
melhorar o ambiente de negócios e para aumentar a produtividade e o crescimento potencial de
nossa economia. A Lei nº 10.973/2004, conhecida como Lei de Inovação, cria condições para
parcerias entre empresas privadas e os institutos públicos de pesquisa, sobretudo universidades
públicas, com a finalidade de realizar atividades de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos e
processos. A promoção da inovação é o eixo central da nova Política Industrial, Tecnológica e de
Comércio Exterior, que agora ganha impulso com a criação da Agência Brasileira de Desenvolvimento
Industrial (ABDI) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI).
Em suma, em sincronia com a perseguição das metas macroeconômicas e do crescimento
sustentado, o Governo concentra esforços na implementação de sua agenda de reformas
microeconômicas, com o objetivo de aperfeiçoar os marcos legal e institucional, eliminando
entraves e distorções, reduzindo custos de transação e elevando a segurança jurídica das
transações econômicas em geral, sem perder também o foco da inclusão social. As ações que
compõem esse esforço, bem como as razões para o desenho escolhido, são detalhadas a seguir.
3.1 Mercado de Crédito e Sistema Financeiro Nacional
Para reduzir o custo do financiamento e aumentar o acesso ao crédito, o Governo está
aprimorando o marco regulatório existente no mercado de crédito, aperfeiçoando instrumentos
existentes e introduzindo outros mais modernos, eficientes e juridicamente mais seguros.
Destacam-se os instrumentos de securitização de créditos, os quais ajudarão a desenvolver uma fonte
importante de captação de recursos ainda pouco utilizada na nossa economia, que é o mercado de
capitais. Nesse contexto, dois setores da economia foram objeto de medidas específicas: a construção
civil e o agronegócio.
Há um extenso debate sobre as razões para os elevados spreads bancários no Brasil. Por um
lado, os trabalhos realizados pelo Banco Central apontam a inadimplência, a cunha fiscal, os depósitos
compulsórios, os custos administrativos e as margens brutas do sistema financeiro como os principais
fatores responsáveis pelos spreads observados. Por outro, há um debate sobre o papel desempenhado
30
pela qualidade das garantias e pela redução do custo de sua execução para a redução dos spreads
bancários, bem como sobre o papel desempenhado pela concentração do setor bancário.9
Nesse sentido, a medida da consignação da folha de pagamentos, Lei 10.820/2003, foi
bastante ilustrativa dos impactos das garantias e dos custos operacionais sobre os spreads
bancários. Essa medida criou um novo instrumento de crédito para os trabalhadores formalizados. Por
meio de um acordo envolvendo sindicato, empresa e uma instituição financeira, cria -se a possibilidade
de empréstimos para os trabalhadores com desconto direto na folha de pagamentos. Deve-se observar
que essa nova modalidade de crédito não envolve novas fontes de recursos, mas simplesmente novas
regras para a concessão de crédito pessoal, regras essas com menor possibilidade de inadimplência.
Segundo dados ainda parciais, em apenas 1 (um) ano a consignação em folha permitiu a
concessão de créditos cerca de R$ 12 bilhões, sendo cobradas taxas de juros de menos da metade
a que essas mesmas famílias tinham acesso com os tradicionais instrumentos de crédito. Dessa
forma, a consignação em folha ilustra o potencial de novos instrumentos de crédito com melhores
garantias para a expansão do crédito privado e para a redução das taxas de juros de mercado.
De forma semelhante, foram criados este ano novos instrumentos de crédito e
securitização para os setores da construção civil e do agronegócio. Cumpre destacar que o sistema
legal brasileiro requer a existência de moldura legal precisa para todos instrumentos de crédito
privado, de modo a limitar a ocorrência de eventuais argüições jurídicas que acabam por aumentar a
insegurança sobre o cumprimento dos contratos, causando aumento das taxas de juros e reduzindo a
oferta de crédito.
As novas medidas para a construção civil e o agronegócio têm por objetivo a criação de
novos instrumentos de crédito e regimes tributários adequados as suas características setoriais,
reduzindo o custo do financiamento das decisões de produção e investimento. No caso específico
da construção civil, foram igualmente adotadas medidas tendo por objetivo reduzir a insegurança dos
mutuários e a incidência tributária sobre a compra ou financiamento de novas residências. Dessa
forma, procura-se garantir novos mecanismos privados de financiamento setoriais, permitindo que os
recursos públicos disponíveis sejam destinados aos grupos de menor renda.
Um segundo conjunto de medidas para aumentar a eficiência do mercado de crédito tem
por objetivo reduzir as fontes de “assimetria de informação” nesse mercado de modo a permitir
a redução do custo de financiamento, sobretudo para as famílias de baixa renda. São medidas
importantes nessa linha a implementação do novo Sistema de Informações de Crédito do Banco
Central (SCR) – sucessor da Central de Risco de Crédito – e a regulamentação dos bancos de dados de
9 Banco Central do Brasil (1999, 2000, 2001, 2002 e 2003), Belaisch (2003), Koyama e Nakane (2002),
Afanasieff, Lhacer e Nakane (2002) e Costa (2004).
31
proteção ao crédito, que passarão a estar autorizados, sob regras prudenciais, a recolher informações
positivas e analisá-las, permitindo a ampliação e redução do custo do crédito para a maior parte das
famílias.
Além das medidas que contribuem para um melhor funcionamento do mercado de
crédito, a agenda de reformas institucionais para o Sistema Financeiro Nacional compreende
também o aperfeiçoamento do marco regulatório do setor de seguros – estando aí incluída a
abertura do mercado de resseguros – e a proposta de autonomia operacional do Banco Central.
O aperfeiçoamento do marco regulatório do setor de seguros favorecerá a formação de
poupança de longo prazo, reduzirá o custo da proteção ao setor produtivo e alinhará a realidade
nacional aos padrões internacionais. A proposta deverá incluir novos mecanismos de proteção das
reservas contra a insolvência de seguradoras e o aperfeiçoamento dos canais de distribuição, por meio
da introdução de novos instrumentos de transparência e controle. Mais eficiência na intermediação e
subscrição de seguros, melhor governança e estímulo à concorrência, devem resultar na introdução,
difusão e pulverização de novos produtos, assim como na redução dos custos e aumento da segurança
para os consumidores.
A abertura do mercado de resseguros, proposta cuja discussão já está em estágio
avançado no âmbito do Governo, além de atrair novos investimentos para o setor, contribuirá
também de forma significativa para o desenvolvimento do setor securitário local. Os
consumidores serão os principais beneficiados pelas perspectivas de maior oferta de produtos
inovadores, com custos menores.
Já a autonomia operacional do Banco Central do Brasil é um tema que necessita de amplo
debate por parte da sociedade. Existem evidências empíricas de que os objetivos de crescimento de
longo prazo do produto e estabilidade do nível de preços são complementares e não antagônicos,
e que a preservação da estabilidade do nível de preços apresenta forte correlação tanto com
maiores taxas de crescimento de longo prazo, quanto com um nível mais elevado da taxa de
emprego. Deve-se enfatizar que, no caso da autonomia operacional do Banco Central, o Governo fixa
as metas para a política monetária, sendo responsabilidade da autoridade monetária o seu cumprimento
por meio dos instrumentos usuais de política monetária. Dessa forma, o projeto de autonomia garante
maior transparência tanto à fixação da metas de política monetária quanto à sua execução, sendo parte
integrante desse novo desenho institucional os procedimentos e medidas cabíveis em caso de
descumprimento das metas por parte da autoridade monetária.
Nesse sentido, inúmeros trabalhos acadêmicos têm identificado a necessidade de que
sejam criados incentivos de modo a garantir que a gestão da política monetária tenha como
objetivo a estabilidade do nível de preços no longo prazo. Essa proteção é necessária porque, não
obstante sejam conhecidos os efeitos perversos que a inflação elevada impõe à economia e à
32
sociedade, são também conhecidos os incentivos ao uso desse instrumento no intuito de alcançar
resultados econômicos de curto prazo que, porém, se revelam incompatíveis com o crescimento
sustentado de longo prazo. Uma maior expansão do produto no curto prazo acompanhada de
maiores taxas de inflação reduz a eficiência do sistema econômico, dificulta o cálculo do
investimento e prejudica o horizonte de crescimento econômico sustentado. Além disso, a maior
incerteza macroeconômica associada a maiores taxas de inflação reduz a taxa de investimento, tem
impactos negativos sobre a composição da dívida pública e implica maiores taxas de juros e menor
crescimento econômico.
3.1.1 Aperfeiçoamento e Melhoria dos Instrumentos de Crédito
3.1.1.1 Consignação em Folha de Pagamento
Entre os novos instrumentos de crédito, destaca-se a regulamentação da consignação em
folha de pagamento, implementada, inicialmente, por Medida Provisória, e posteriormente
convertida na Lei nº 10.820/2003. Com essa lei, foi criado o arcabouço legal facultando aos
empregados da iniciativa privada e aos aposentados e pensionistas do INSS a contratação de
empréstimos, financiamentos e operações de arrendamento mercantil junto às instituições financeiras.
O pagamento é realizado diretamente na folha de pagamento, mediante desconto do empregador, o
qual fica incumbido de transferir os recursos à instituição credora.10
O instrumento da consignação reduz significativamente alguns dos principais fatores que
encarecem e cerceiam a oferta de crédito. O principal deles, sem dúvida, é o risco de inadimplência,
que pode estar relacionado à ausência de capacidade efetiva do mutuário de pagar suas obrigações ou
mesmo à baixa prioridade que esse confere na quitação de compromissos já assumidos. Deve se
ressaltar que a consignação minimiza, também, problemas relacionados com a assimetria de
informações e custos de administração. No primeiro caso, por ter o credor acesso a informações
importantes e fidedignas a respeito do potencial mutuário, como aquelas relacionadas à renda; no
segundo caso, por conseguir reduzir custos com a obtenção de informações, com a emissão de carnês e
com a cobrança, já que essas funções passam a ser desempenhadas diretamente pelo empregador.
Com isso, as operações de consignação em folha apresentam um custo menor quando
comparadas a similares no mercado e, por serem mais seguras e, conseqüentemente, mais atrativas
para as instituições credoras, o volume de recursos ofertados nessa modalidade tende a ser maior e as
10 A regulamentação da consignação em folha para aposentados e pensionistas do INSS foi efetuada por meio da
Lei nº 10.953/2004.
33
taxas de juros menores do que em outras opções de crédito disponíveis. E isso tem sido observado na
prática.
O crescimento das operações em consignação em folha de pagamento e a redução das
taxas de juros têm sido significativos desde a sua implantação. Levantamento realizado pelo Banco
Central junto a instituições financeiras especializadas em crédito pessoal indica que o montante de
recursos alocados nas operações de empréstimos com consignação em folha de pagamento alcançou,
em novembro de 2004, nas instituições pesquisadas, R$ 11,7 bilhões, representando 37% das
operações de crédito pessoal. Estima-se que o montante emprestado em todo o Sistema Financeiro
Nacional ultrapasse R$ 15 bilhões. O gráfico abaixo (Gráfico 3.1) ilustra a evolução dessa modalidade
de crédito em 2004, mostrando a forte trajetória de crescimento.
Gráfico 3.1 – Crédito Consignado em Folha – Montante Emprestado
5
6
7
8
9
10
11
12
jan/04 fev/04 mar/04 abr/04 mai/04 jun/04 jul/04 ago/04 set/04 out/04 nov/04
(R$ bilhões)
Observação: Refere-se somente às instituições financeiras pesquisadas pelo BACEN.
Fonte: Banco Central do Brasil.
A taxa média das operações de crédito consignado vem se situando bem abaixo das
praticadas nas demais modalidades de crédito pessoal e nas operações de cheque especial, e
bastante próxima das cobradas nas operações de financiamento de veículos que, por contarem
com garantais (o próprio veículo) são, historicamente, as mais baratas praticadas no mercado. A
tabela a seguir apresenta as taxas médias praticadas pelo mercado financeiro, em novembro de 2004,
nas diversas modalidades de crédito à pessoa física.
34
Tabela II – Crédito à Pessoa Física - Taxa de Juros Média
Modalidade Taxa Média
(ao mês)
Cheque Especial 7,6%
Crédito Pessoal 4,7%
Crédito Consignado 2,8%
Financiamento de Veículos 2,6%
Obs.: taxas praticadas em novembro/2004
Fonte: Banco Central do Brasil.
Por serem mais baratas e estarem sendo concedidas em prazos maiores, vários mutuários têm
recorrido a empréstimos em consignação para quitarem outras dívidas, como cheque especial e cartão
de crédito, que são mais onerosas e oferecem menor prazo. O resultado da troca de modalidade de
operação, além de reduzir o comprometimento da renda dos devedores com o pagamento de juros, está
contribuindo para a diminuição da inadimplência e melhoria do perfil de endividamento das famílias.
3.1.1.2 Instrumentos de Crédito e Securitização para o Setor Imobiliário
A Lei nº 10.931/2004 desenvolveu e aperfeiçoou os instrumentos de financiamento e
securitização no segmento imobiliário. O setor da construção civil apresenta grande importância
para a economia nacional, por várias razões, dentre as quais destacam-se aqui apenas duas: (i) pelo
lado da demanda, devido ao seu efeito na redução do déficit habitacional brasileiro, e (ii) pelo lado da
oferta, devido ao peso expressivo do setor, que responde por 21% da indústria brasileira e apresenta
significativa capacidade de geração de empregos.
Nesse contexto, justifica-se a preocupação com o desempenho do setor nos últimos anos.
Entre 1998 e 2002, o produto real da construção civil observou retração anual média de 1,4%,
sendo um dos responsáveis pelo fraco desempenho do PIB no período. Em 2003, ainda sob o
impacto das incertezas que condicionaram o cenário macroeconômico de 2002, o setor registrou queda
de 5,2%.
A baixa participação do crédito imobiliário no total de crédito concedido na economia, de
6,1% em 2003, mostra o quanto ainda falta para explorarmos todo nosso potencial nesse setor. É
importante observar que o número de unidades financiadas pelo Sistema Financeiro da Habitação, que
chegou a 400 mil em 1990, ao final de 2002 totalizava pouco menos de 162 mil, sendo 133 mil com
recursos do FGTS e 29 mil da caderneta de poupança (Gráfico 3.2).
35
Gráfico 3.2 – Unidades Habitacionais Financiadas pelo SFH
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
700.000
1964 1968 1972 1976 1980 1984 1988 1992 1996 2000
(Unidades Financiadas)
Média = 183 mil
Fonte: Banco Central do Brasil.
A forte retração do crédito do setor observada desde o começo dos anos noventa
decorreu de mecanismos de financiamento inapropriados e da adoção de planos econômicos e
mudanças legais que resultaram em desequilíbrios nos contratos de financiamentos
habitacionais. Esse quadro agravou-se pela elevação do nível de inadimplência das carteiras,
interrupção dos fluxos de pagamento em função de inúmeras ações na Justiça e ainda pela dificuldade
na retomada das garantias vinculadas aos financiamentos.
O Governo está comprometido com o fomento ao mercado imobiliário no País. O objetivo
das medidas adotadas é estimular o desenvolvimento do financiamento privado na construção civil,
por meio da introdução e aperfeiçoamento dos instrumentos de crédito e securitização, a melhoria da
segurança jurídica para mutuários e financiadores, e um regime tributário mais eficiente. A agenda do
Governo tem sido pautada também pela melhoria da focalização do direcionamento de recursos no
âmbito do financiamento imobiliário – a ser discutido na seção 3.3.3 – tendo por objetivo facilitar o
acesso ao financiamento por parte de famílias de baixa-renda.
Em 2004, a recuperação da construção civil se mostra robusta e consistente. O PIB do
setor apresentou significativo crescimento nos nove primeiros meses de 2004, acumulando uma
expansão de 5,9%. Esse desempenho contribuiu decisivamente para o crescimento do PIB total. Além
disso, a expansão de 11,6% da indústria da construção no terceiro trimestre, em relação ao mesmo
período de 2003, indica a continuidade dessa trajetória.
O crescimento da construção civil teve impacto importante sobre o mercado de trabalho
e a geração de novas contratações. Ao longo dos últimos meses o setor reverteu a contração que
vinha sendo observada no mercado de trabalho e vem gerando novas contratações. A criação de postos
36
de trabalho formais, particularmente, vem apresentando forte expansão neste ano, atingindo no
acumulado desde janeiro 86 mil novas vagas, o que representa um acréscimo de 8%.
A seguir, encontra-se um detalhamento de várias medidas de aperfeiçoamento legal e
institucional que colaboram para o desenvolvimento do mercado de crédito imobiliário de forma
sustentável e que permitirão a canalização de novos recursos privados para o financiamento
habitacional. Para tanto, a Lei nº 10.931/2004 atribui maior segurança jurídica e eficiência econômica
ao financiamento imobiliário, mediante instrumentos como o Patrimônio de Afetação de incorporações
imobiliárias, a Letra de Crédito Imobiliário e a Cédula de Crédito Imobiliário.
Em relação ao financiamento, as medidas adotadas ao longo de 2004 já começam a fazer
efeito. Entre janeiro e outubro, registraram-se cerca de 42,5 mil novas unidades financiadas com
recursos da caderneta de poupança, por meio do SBPE, o que representa um crescimento de 46,5% em
relação ao total de 2002. Em 2004, estima-se que cerca de R$ 2,8 bilhões serão destinados pelo SBPE
a novas concessões de crédito habitacional.
Patrimônio de Afetação de Incorporações Imobiliárias
O Patrimônio de Afetação é uma figura jurídica aplicável em incorporações imobiliárias
com a finalidade de segregar o patrimônio de uma determinada incorporação dos demais bens
da incorporadora. Dessa forma, são protegidos tanto os compradores quanto os agentes
financiadores das unidades imobiliárias em construção, conferindo-lhes maior segurança.
A Lei n.º 10.931/2004 introduziu aperfeiçoamentos no Patrimônio de Afetação para que este
funcione como instrumento de melhoria do grau de governança do empreendimento, propiciando
meios eficazes de fiscalização do patrimônio afetado e viabilizando a continuidade da obra em caso de
falência da incorporadora.
A instituição do Regime Especial de Tributação (RET) teve por objetivo retirar entraves
para a adoção do Patrimônio de Afetação, oferecendo uma simplificação da tributação pelo
agrupamento de vários impostos federais em uma única alíquota a incidir sobre as receitas
oriundas desse tipo de atividade.11 Com o RET, os adquirentes de imóveis poderão verificar
regularmente o pagamento dos tributos e demais obrigações referentes à incorporação, que terá
contabilidade apartada, propiciando-lhes os meios para preservar a regularidade financeira e tributária
ao longo da execução da obra. Com isso, a decisão pela continuidade da obra em caso de falência da
incorporadora fica revestida das necessárias salvaguardas jurídicas, uma vez que eventual débito fiscal
11 O patrimônio afetado recolherá um valor equivalente a 7% da sua receita mensal a título de Imposto de Renda,
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), PIS e COFINS.
37
de responsabilidade dos adquirentes fica restrito às obrigações do próprio patrimônio afetado. Essa
nova sistemática tem o mérito, principalmente, de atrair novos recursos para financiar o setor,
principalmente por parte das instituições financeiras, que também passarão a ter informações mais
fidedignas dos projetos financiados e, na hipótese de falência da incorporadora, terão melhores
condições para recuperar os recursos emprestados.
Títulos de Securitização de Créditos do Setor Imobiliário
Complementarmente à instituição do patrimônio de afetação, a Lei nº 10.931/2004
concluiu também a regulamentação do processo de securitização de créditos imobiliários, que
havia sido iniciada com a Lei nº 9.514/1997, que criou o Sistema Financeiro Imobiliário. Foram
criados dois novos instrumentos complementares: a Cédula de Crédito Imobiliário (CCI) e a Letra de
Crédito Imobiliário (LCI).
A CCI é um instrumento emitido no ato da concessão de um financiamento imobiliário
para representar a propriedade do crédito decorrente dessa operação específica. No caso de
representar o crédito de uma operação com garantia real, a Cédula fica registrada juntamente com o
imóvel financiado no Cartório de Imóveis e seus direitos podem ser objeto de negociação e
securitização, sem que seja necessária a anuência dos devedores ou o registro em Cartório de Imóveis.
Além disso, por ser um título executivo extrajudicial, o processo de cobrança e execução de garantia
do crédito representado por uma CCI é menos custoso.
A LCI, por sua vez, é um título de emissão privativa das instituições financeiras e são
lastreados em créditos imobiliários garantidos por hipoteca ou alienação fiduciária que o
emissor da Letra detém em sua carteira.
Esses dois instrumentos fortalecem os canais de financiamento ao setor imobiliário, pois
propiciam a fácil emissão e negociação dos direitos creditórios decorrentes de operações de
financiamento.
Carta Garantia
A criação do Certificado de Recebíveis Imobiliários (CRI) pela Lei nº 9.514/1997 foi um
importante instrumento para desenvolver o mercado de securitização de créditos imobiliários. O CRI
permite que o concedente desse tipo de crédito possa repassá-lo a outros investidores com perfil mais
compatível com o risco e o prazo do contrato de financiamento imobiliário, cujo prazo médio supera
10 anos. Além disso, o CRI permite que diversos contratos de baixo valor possam ser negociados em
conjunto, em um único título de securitização, dando maior escala à operação e possibilitando maior
volume e liquidez ao mercado primário de crédito imobiliário.
38
Entretanto, a ainda pequena dimensão relativa do mercado de CRI restringe o mercado
secundário desses títulos. Para aumentar a liquidez do CRI, foi instituída, mediante a Resolução CMN
nº 3.155/2003, a Carta Garantia para a recompra de CRIs. Trata-se de uma regulamentação no
âmbito do direcionamento do crédito do Sistema Financeiro da Habitação (SFH), que tem por objetivo
dar maior segurança aos detentores de CRIs e fomentar esse mercado. Com isso, as instituições
integrantes do SFH que negociarem carta garantia, se comprometendo a recomprar os CRIs de sua
emissão, segundo as regras definidas na própria regulamentação, poderão computar, para fins de
direcionamento de depósitos de poupança em financiamento habitacional, 1/3 do valor dos respectivos
títulos.
Valor Incontroverso
Por fim, foram aperfeiçoadas medidas relacionadas à resolução de controvérsias no âmbito dos
financiamentos imobiliários, como é o caso do pagamento de parcelas incontroversas. Uma questão
essencial para o bom funcionamento do mercado de crédito é a garantia do fluxo de pagamentos. No
caso do setor imobiliário, no qual o crédito é de mais longo prazo, a garantia desse fluxo é ainda mais
importante.
No entanto, muitas ações judiciais impetradas por mutuários têm levado à suspensão do
pagamento de todas as obrigações relativas ao imóvel financiado, mesmo que apenas uma parte
dessas obrigações seja objeto de controvérsia judicial. Na maioria dos casos, o principal sequer é
questionado, sendo a ação restrita à forma de incidência dos juros ou mesmo às taxas aplicadas. Com
isso, o valor do principal e mesmo algumas parcelas acessórias como taxas condominiais e tributos
acabam não sendo pagos, acarretando insegurança ao credor, tendo como efeito o encarecimento e a
redução dos recursos disponíveis para o crédito imobiliário.
Dessa forma, segundo dispositivo da Lei nº 10.931/2004, fica permitida a concessão de
liminar autorizando o depósito judicial dos valores considerados controversos, mantendo-se o
pagamento das demais obrigações. O Juiz, entretanto, pode dispensar o depósito judicial do valor
controverso em caso de relevante risco de dano irreparável ao executado. Com isso, procura-se reduzir
os incentivos a ações judiciais que visem apenas a procrastinação do pagamento do crédito e de outros
encargos relativos ao imóvel, e que geram significativos prejuízos ao mercado de financiamento
imobiliário, resultando em crédito mais caro e escasso ao conjunto dos tomadores.
3.1.1.3 Instrumentos de Crédito e Securitização para o Agronegócio
A agricultura tem sido um dos setores mais dinâmicos da economia brasileira. No período
entre 1995 e 2003, enquanto o PIB agrícola expandiu-se cerca de 4% ao ano, o PIB total cresceu em
39
torno de 2% ao ano. Não obstante a redução de 3,5% da produção de grãos na safra 2003/04, por
razões climáticas, o desempenho favorável das lavouras permanentes (café, cana-de-açúcar e laranja),
ao lado da expansão da produção animal, tem assegurado a manutenção do padrão de crescimento da
agricultura em 2004, de modo que nos três primeiros trimestres do corrente ano, o PIB agropecuário
registra expansão de 5,6%.
Esse comportamento tem sido fortemente ancorado em ganhos de produtividade, tendo, nos
últimos 12 anos, a produção de grãos se expandido em cerca de 110% frente a um crescimento da área
plantada de somente 16%, como resultado de significativo investimento em capacitação e tecnologia
no meio rural. A propósito, na safra 2004/2005, o último levantamento divulgado pelo IBGE estima
que a produção de grãos deverá registrar novo recorde, com expansão de 12%. Também, o saldo da
balança comercial do agronegócio tem sido crescente nos últimos anos, atingindo cerca de US$ 25,8
bilhões em 2003, com estimativa de US$ 30 bilhões em 2004.
O potencial do setor agropecuário é muito grande, em vista das perspectivas de expansão dos
mercados interno e externo e, para o atendimento dessa demanda, o País dispõe de amplas áreas ainda
não exploradas, de cerca de 106 milhões de hectares – o que corresponde ao dobro da área atualmente
cultivada – sem necessidade de avançar na Floresta Amazônica e outras áreas de importância
ambiental. Dessa forma, o Brasil constitui-se em uma das últimas grandes fronteiras agrícolas do
mundo, uma vez que nos Estados Unidos e na Europa não há mais áreas novas agricultáveis.
A crescente integração da agricultura brasileira ao mercado internacional fez com que os
agentes nela envolvidos passassem a buscar modernos instrumentos de gerenciamento de risco.
Embora estejam ainda abaixo da escala desejada - representando em torno de 8% do valor bruto da
produção agropecuária - as negociações agropecuárias, no mercado de futuros da Bolsa de
Mercadorias & Futuros, têm revelado contínua expansão, tendo alcançado, em 2003, cerca de 778 mil
contratos, correspondentes a cerca de US$ 4,7 bilhões.
Nesse sentido, já está disponível no mercado um conjunto de títulos emitidos por agricultores
com características distintas de vencimento, garantias e formas de negociação, que, embora não se
prestem para ampla captação de poupança do público em geral, revelam o movimento de integração da
agricultura ao mercado financeiro. É ilustrativa a expansão da Cédula de Produto Agropecuário
(CPR), que é um título representativo de uma venda antecipada, sendo que o valor avalizado pelo
Banco do Brasil alcançou R$ 1,6 bilhões em 2003, com perspectivas de elevar-se para R$ 3,0 bilhões
em 2004.
A necessidade de crédito para capital de giro de uma safra brasileira representa, no entanto,
valor em torno de R$ 118 bilhões, do qual as fontes oficiais têm suprido somente cerca de 1/3, à taxa
de juros de 8,75% ao ano. A grande maioria dos recursos, portanto, tem sido financiada diretamente
40
por agroindústrias, tradings e recursos próprios dos agricultores, a um custo relativamente mais
elevado.
A continuidade da trajetória de crescimento da agricultura brasileira dependerá de uma
oferta estável e relativamente barata de crédito, de modo que o Governo Federal tem se
engajado na tarefa de criar condições para que o setor do agronegócio, modernizado e
profissionalizado, consiga captar recursos junto ao investidor privado para se financiar. Nesse
sentido, o Governo vem implementando um conjunto de instrumentos que visam ligar o mercado de
capitais, com seus recursos a custos relativamente baixos, e o agronegócio, tanto na fase de produção,
quanto na fase de comercialização.
Instrumentos de Crédito do Agronegócio
A expansão do financiamento privado da fase de produção do agronegócio será
beneficiada pela emissão de três títulos, segmentados conforme a categoria do emissor e as
características do processo, quais sejam:
(i) Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA), a ser emitido por
cooperativas de produtores rurais e outras pessoas jurídicas que exerçam a atividade de
comercialização, beneficiamento ou industrialização de produtos e insumos
agropecuários ou de máquinas e implementos utilizados na produção agropecuária;
(ii) Letra de Crédito do Agronegócio (LCA), a ser emitido por instituições financeiras; e
(iii) Certificado de Recebíveis do Agronegócio (CRA), a ser emitido por companhias
securitizadoras de direitos creditórios do agronegócio.
O CDCA, a LCA e o CRA são títulos vinculados a direitos de crédito originários de negócios
realizados entre produtores rurais, ou suas cooperativas, e terceiros. Com os novos títulos, o mercado
de capitais será uma alternativa para financiar o agronegócio, ampliando a liquidez ao longo das
cadeias produtivas. Esses novos instrumentos possibilitarão o refinanciamento às empresas do
agronegócio, constituindo-se em instrumentos de mitigação de risco e de captação de recursos para
ampliação da oferta e redução do custo de crédito para o agronegócio brasileiro.
A fase de comercialização também está sendo contemplada com instrumentos de
financiamento mais modernos e eficientes: o Certificado de Depósito (CDA) e o Warrant
Agropecuário (WA).
O CDA é um título de crédito que constitui promessa de entrega de produtos agropecuários
depositados em armazéns certificados em conformidade com a nova Lei de Armazenagem, e circulará
sem documentos fiscais, sofrendo incidência de impostos somente na última etapa da comercialização
e não em todas elas como ocorre com o tradicional Conhecimento de Depósito. O Warrant
41
Agropecuário (WA), por sua vez, é um título de crédito que confere direito de penhor sobre o produto
descrito no CDA correspondente.
O lançamento destes títulos abrirá espaço para que os armazéns possam operar de forma
semelhante aos elevators americanos, ou seja, participando como agentes ativos da comercialização de
produtos agrícolas. A entrada de novos agentes e investidores ampliará a liquidez da comercialização
agrícola, atuando de forma complementar ao tradicional Empréstimo do Governo Federal (EGF).
Contrato de Opção Privado
O Contrato de opção privado permite reduzir o risco associado a oscilações de preços dos
bens agrícolas. O Governo adotou medida para estimular o lançamento de contratos de opção
privados. Atualmente, o principal instrumento de apoio à comercialização agrícola são os contratos de
opção de venda lançados pelo Governo Federal. Esses contratos constituem um seguro de preços, para
o qual os agricultores pagam um prêmio para terem o direito de entregar sua produção a um preço préestabelecido
em uma determinada data.
Nesse sentido, o Governo Federal passará a subvencionar também o lançamento pelo
setor privado de contratos de opção de venda de produtos agrícolas. Para viabilizar a operação, o
Governo leiloará para os lançadores da opção um prêmio de risco que poderá ser usado para cobrir
eventual diferença entre o preço de mercado e o preço de exercício da opção privada, nos casos em
que o produtor e cooperativa exercerem a opção.
A opção privada aumentará a eficiência no uso dos recursos de suporte à comercialização
agrícola que o Governo disponibiliza por meio do orçamento das Operações Oficiais de Crédito -
OOC. Nos contratos de opção lançados atualmente pelo Governo, é obrigatório que seja alocado 100%
do valor correspondente às opções no OOC, ainda que não sejam integralmente exercidas ou que o
Governo opte pelo repasse ou recompra dos títulos no vencimento. A título de ilustração, de um total
de 5,6 milhões de toneladas de grãos correspondentes a opções lançadas pelo Governo no ano de 2003,
somente 44% foram vendidas e 26,5% exercidas pelos produtores rurais.
Com a faculdade de apenas subvencionar o lançamento de opções por agentes privados, o
Governo deixará de comprometer no orçamento 100% do valor correspondente ao lançamento das
opções, o que possibilitará alavancar um número maior de contratos de opção privados.
Adicionalmente, estará sendo fomentado o desenvolvimento da indústria de opções agrícolas no
País, o que virá dotar o agronegócio de instrumento de gerenciamento de risco contra oscilações
de preços, essenciais para a atividade rural. Por representar um seguro contra variação de preços, a
disseminação dos contratos de opção irá contribuir para estabilizar a renda dos produtores rurais,
dotando-os das condições necessárias para buscar opções privadas de financiamento.
42
Seguro Rural Privado
Para permitir o adequado gerenciamento de risco da atividade agropecuária e dessa forma
viabilizar o efetivo funcionamento dos novos instrumentos de financiamento ao agronegócio, faz-se
necessária a crescente disseminação do uso do seguro rural.
A atividade agrícola envolve elevado grau de risco, decorrente da ocorrência de sinistros
climáticos, como secas e geadas, que implicam graves prejuízos ao produtor rural, envolvendo-o em
um ciclo vicioso de renegociações de dívidas, comprometimento do patrimônio e incapacidade para
assumir novos investimentos. O seguro permite ao agricultor reduzir sua exposição ao risco de grandes
perdas, gerando maior tranqüilidade à condução da sua atividade e à realização de novos
investimentos. Adicionalmente, a análise de risco no curso da subscrição do seguro possibilita uma
melhor orientação dos agricultores quanto às técnicas utilizadas e às áreas de plantio adequadas às
culturas, levando-os ao aperfeiçoamento no uso de tecnologias, cujo efeito será a redução de custos
combinada à maior produtividade.
A Lei nº 10.823/2003, regulamentada pelo Decreto nº 5.121/2004, autorizou o Poder
Executivo a conceder subvenção econômica ao prêmio do seguro rural e criou o Comitê Gestor
Interministerial do Seguro Rural, de modo a disseminar o uso pelos agricultores deste instrumento de
gerenciamento de risco contra quebras de safras. Espera-se que o maior uso do seguro rural conferirá
maior estabilidade à renda dos agricultores, permitindo-lhes maior acesso aos recursos do mercado de
capitais e maior sustentabilidade à produção agropecuária.
3.1.1.4 A Cédula de Crédito Bancário (CCB)
A Cédula de Crédito Bancário (CCB) é um importante instrumento para ampliação do crédito
e da securitização. A CCB foi introduzida inicialmente pela Medida Provisória nº 2.160, sendo
posteriormente aperfeiçoada e definitivamente regulamentada na Lei nº 10.931/2004.
A CCB é um título representativo do crédito bancário, de emissão do próprio tomador do
crédito em favor da instituição financeira que o concede. Esse instrumento facilita a negociação da
carteira de crédito dos bancos, tornando mais ágil a sua execução em caso de inadimplência do
tomador. Com isso, eleva-se a segurança jurídica das operações de crédito, com implicações diretas
sobre a redução de seu custo e elevação de seu volume no mercado primário de crédito bancário. A
redução do risco da carteira de crédito do banco, o menor custo de execução judicial e um custo de
oportunidade mais baixo na concessão do crédito – uma vez que a CCB facilita o banco negociar o
crédito no mercado secundário – são os principais benefícios trazidos por esse novo instrumento.
Outro importante papel da CCB é no processo de securitização de créditos bancários. A
própria Lei nº 10.931/2004, que criou a CCB, instituiu também o Certificado de Cédulas de Créditos
43
Bancários (CCCB), que poderá agregar várias CCBs, facilitando o processo de securitização. Devido a
sua curta existência, atualmente o volume de CCCBs registrados na Central de Custódia e Liquidação
Financeira de Títulos (CETIP) alcança a cifra de R$ 7 milhões, concentrados em apenas 6 títulos,
estando ainda muito aquém do seu potencial no mercado nacional de títulos de securitização.
3.1.1.5 A Alienação Fiduciária de Bens Móveis Infungíveis e Fungíveis12
Foram adotados aperfeiçoamentos importantes aos instrumentos de crédito já existentes,
como é o caso da alienação fiduciária em operações de financiamento de bens móveis. A figura
jurídica da alienação fiduciária foi introduzida com o objetivo de aumentar a qualidade da garantia
oferecida nas operações de crédito, agilizando a sua retomada pelo credor em caso de inadimplência.
Com efeito, os longos ritos de execução observados em outras modalidades de garantia elevavam o
risco de concessão de crédito e, portanto, o custo do financiamento, prejudicando o próprio tomador.
A alienação fiduciária mostrou-se eficaz para o financiamento de automóveis, tornandose
uma das modalidades de crédito mais baratas do mercado brasileiro. Contudo, ainda eram
observadas dificuldades no exercício da propriedade do bem pelo credor em caso de
inadimplência do devedor. O credor conseguia retomar a posse do automóvel, mas encontrava
dificuldades em vendê-lo a um terceiro porque os órgãos de trânsito competentes, na ausência de um
respaldo legal adequado, mostravam-se resistentes em fazer a transferência do registro definitivo em
caso de existência de algum questionamento judicial por parte do devedor.
O longo prazo para venda dos veículos implica perdas para ambas as partes, em função
da depreciação do bem e os custos de armazenamento. Visando corrigir esse problema, foi
introduzido um dispositivo na Lei nº 10.931/2004 permitindo que os órgãos de trânsito registrem o
veículo em nome do novo proprietário, mesmo no caso da sentença não ter transitado em julgado.
Com isso, completa-se o processo, que tem início com a execução da medida liminar de busca e
apreensão concedida em razão da inadimplência do devedor, a alienação do veículo e, finalmente, a
transferência efetiva do seu registro.
A fim de se garantir o equilíbrio do processo, e como forma de proteger o devedor contra
abuso do credor, foi criada multa de 50% do valor do bem, independentemente de ações por perdas e
danos, em caso de decisão final favorável ao devedor. Dessa forma, estimula -se o credor fiduciário a
agir somente caso tenha convicção de que juridicamente está correto, pois a penalidade será muito
maior em caso de retomada e alienação indevida do bem.
12 Bens fungíveis são aqueles que se gastam, que são consumidos após o uso e que sejam passíveis de serem
substituídos por outros bens de mesma espécie, qualidade, quantidade e valor.
44
Um importante passo também foi dado para consolidar na lei brasileira as figuras da
alienação fiduciária de bens móveis fungíveis e da cessão fiduciária de direitos creditórios. No
primeiro caso, beneficia -se o indivíduo ou a empresa, em particular do agronegócio, que carece de
garantias suficientes para a obtenção do crédito em condições mais favoráveis. Cumpre ressaltar que a
possibilidade de se alienar fiduciariamente bens fungíveis não é matéria pacífica na doutrina jurídica.
A própria natureza fungível do bem, que pode ser consumido no processo, gera dificuldades para que
possa servir como colateral de uma operação de crédito. Todavia, uma adequada engenharia financeira
pode garantir a sincronia entre a redução do valor da garantia e o fluxo de pagamentos do
financiamento obtido. Dessa forma, bastaria que o valor residual, não consumido, fosse suficiente para
garantir o valor vincendo da dívida. E, além disso, há sempre a possibilidade de se pedir a
recomposição da garantia. Com isso, possibilita-se o acesso desses agentes a um crédito mais barato
com o uso de sua matéria -prima como colateral.
No caso da cessão fiduciária de direitos creditórios, está sendo introduzida uma alternativa à
simples cessão de direitos, só que com maiores vantagens quanto à alocação de riscos, que permitirá
ao possuidor de recebíveis ou de títulos de securitização financiar-se cedendo a propriedade fiduciária
como garantia. Dessa forma, o custo de oportunidade de se manter esses papéis em carteira será
reduzido para as instituições financeiras, certamente fomentando seu mercado.
3.1.2 Instrumentos para Reduzir a Assimetria de Informação
Uma das principais dificuldades da atividade bancária, e que se estende a todas
transações comerciais, é a identificação do risco de inadimplência ou não cumprimento dos
contratos (assimetria de informação). Esse problema decorre da incapacidade dos agentes de estimar
adequadamente a probabilidade dos demais agentes envolvidos em cumprir com os compromissos
assumidos. Quanto maiores e melhores forem as informações sobre os agentes envolvidos, melhores
serão as condições para a correta avaliação do risco de cada operação. Com isso, as instituições
financeiras terão maior propensão a emprestar, e a emprestar a custos menores, enquanto todos os
agentes econômicos terão condições de realizar melhores negócios. Assim, para estimular a
concessão de crédito e a realização de boas transações comerciais, estão em curso duas
importantes medidas que visam reduzir os problemas relacionados com a assimetria de
informações: a implementação do Sistema de Informações de Crédito do Banco Central e a
regulamentação da atividade de bancos de dados de proteção ao crédito.
A teoria econômica analisa a assimetria de informações no mercado de crédito sob duas óticas:
seleção adversa e risco moral [Jappelli e Pagano (1999)]. De um lado, quando o emprestador não é
capaz de identificar com clareza as características dos potenciais tomadores (seu potencial de
pagamento, seu fluxo de caixa ou orçamento, seu passado de adimplência ou inadimplência, entre
45
outros) sua análise de risco fica prejudicada, pois aumenta a probabilidade de se conceder
empréstimos a quem não conseguirá honrar seus compromissos. Esse é o problema da seleção adversa,
e sua conseqüência é a cobrança de taxas de juros mais altas de todos os tomadores,
independentemente de sua probabilidade de inadimplência, como forma de cobrir os possíveis
prejuízos gerados pelos agentes que poderão atrasar ou mesmo aplicar o calote. Outra conseqüência é
o simples racionamento do crédito, cancelando-se a operação à menor suspeita quanto ao perfil do
potencial devedor.
Da mesma forma, a ausência de informações sobre os tomadores impede o acompanhamento
dos devedores após a concessão do crédito. Caso o tomador relaxe seus esforços para quitar as
prestações devidas, pode tornar-se inadimplente, incorrendo-se no chamado risco moral. Se fosse
possível acompanhar o comportamento do devedor, o credor poderia agir para evitar o default. Como
não há informações capazes de auxiliá -lo nessa tarefa, a conseqüência é o racionamento do crédito ou
o aumento das taxas de juros.
A solução para esses dois problemas é a busca de melhores informações sobre os potenciais
tomadores de empréstimos, sobretudo por meio da elaboração de cadastros e registro das operações de
crédito de seus clientes. O histórico de crédito pode reduzir a necessidade de garantias e o custo do
financiamento. Quanto melhor a qualidade do histórico do agente, medido pelo valor dos empréstimos
tomados e o seu percentual de adimplência, maior a probabilidade de que ele honre seus
compromissos e maior o seu colateral de reputação.
Os bancos de dados de proteção ao crédito surgiram com o desenvolvimento urbano, quando
os custos para a obtenção de um grande número de informações sobre todos os clientes forma
significativamente elevados. O compartilhamento de dados sobre credores inadimplentes permite
reduzir o risco de concessão de crédito, aumenta a concorrência pelas famílias com bom histórico de
crédito e permite menores taxas de juros. Esse compartilhamento constitui a origem, no Brasil, dos
sistemas de informação das mais de 950 Câmaras de Dirigentes Lojistas (CDLs), das associações
comerciais, da Centralização de Serviços de Bancos S.A. (SERASA) – banco de dados das instituições
financeiras instaladas no País – além de instituições privadas, como a Equifax do Brasil S/A.
Os bancos de dados de proteção ao crédito no Brasil possuem em comum a disseminação
quase exclusiva de informações negativas sobre os consumidores, como inadimplência e defaults.
Há nisso um duplo objetivo: (i) evitar que outras instituições fiquem expostas a consumidores
identificados com um passado creditício ruim e, portanto, que apresentam maior risco e (ii) utilizar a
inscrição nesses bancos de dados como instrumento de estímulo para o pagamento em dia das
obrigações.
Entretanto, a predominância de informações negativas não é suficiente para garantir o
bom funcionamento do mercado de crédito no Brasil. De um lado, os credores não têm condição,
46
com base apenas em informações sobre a existência de dívida em atraso, de precificar de maneira
adequada os seus empréstimos. Pelo lado dos consumidores, a ausência de informações quanto ao
histórico creditício impede que os bons clientes, que pagam suas contas em dia, sejam recompensados
pela sua pontualidade. As principais prejudicadas nesse processo são as famílias de baixa renda e as
pequenas empresas. De acordo com pesquisa realizada por Pinheiro e Moura (2001) junto a
instituições financeiras, as informações negativas fornecidas por entidades como CDLs, SERASA e o
Serviço de Proteção ao Crédito (SPC) são decisivas, se não as únicas, na decisão de fornecimento ou
não de crédito para o mercado bancário de varejo.
Esse resultado é, em grande medida, reflexo da ausência de uma regulação da atividade no
Brasil. Falta ao País um marco legal eficiente para disciplinar a atuação dos bancos de dados,
principalmente com o objetivo de estimular a coleta e a transmissão de informações positivas
sobre os consumidores. Numa análise de risco de crédito efetiva, as informações quanto ao passado
creditício e de consumo de uma pessoa são fundamentais para estabelecer as condições de
empréstimo. E como a legislação brasileira é omissa a esse respeito, a incerteza jurídica gerada impede
que informações positivas sejam levadas em conta nas análises de bancos e financeiras.
3.1.2.1 Sistema de Informações de Crédito do Banco Central – SCR
O Sistema de Informações de Crédito do Banco Central (SCR) constitui uma importante
ferramenta para facilitar a avaliação do risco de crédito no sistema financeiro. O SCR, que
iniciou seu funcionamento em 2004, cumpre o duplo papel de auxiliar o Banco Central na sua tarefa
de supervisão bancária e ainda de dotar as instituições financeiras de informações para avaliar a
capacidade de pagamento de seus clientes.
O SCR é um banco de dados que armazena informações sobre as operações de crédito
realizadas pelas instituições financeiras. Mensalmente, as instituições informam ao Banco Central as
operações efetuadas envolvendo valores superiores a R$ 5 mil, além dos valores referentes a fianças e
avais. Essas informações são então utilizadas pelo Banco Central para avaliar a exposição ao risco de
cada instituição financeira.
Os clientes do sistema financeiro podem autorizar o acesso de suas informações de
crédito a outras instituições bancárias, reduzindo a assimetria de informações nesse mercado. O
acesso ao histórico de crédito permite à instituição financeira avaliar melhor o seu cliente, podendo
fornecer melhores condições de empréstimos. Além disso, ao fornecer um panorama geral sobre a
situação do cliente em relação ao sistema financeiro, e não apenas a uma instituição em particular, o
SCR também estimula a concorrência bancária, pois incentiva as instituições financeiras a
conquistarem os melhores clientes.
47
3.1.2.2 Bancos Privados de Dados de Proteção ao Crédito
A atuação dos bancos de dados de proteção ao crédito no Brasil é apenas parcialmente
regulamentada pelo artigo nº 43 da Lei nº 8.078/1990 (Código de Defesa do Consumidor). A ausência
de uma regulamentação específica dificulta tanto a coleta e disseminação de informações, quanto gera
incerteza sobre os casos em que o sigilo de informações deve ser observado. Além disso, há aspectos
importantes nas atividades dos bancos de dados de proteção ao crédito que, na sua ausência, criam
dúvidas jurídicas quanto à sua legalidade. Esse é o caso específico da possibilidade de coletas de
informações positivas e a de que todas as informações possam ser objeto de análises pelos próprios
bancos de dados.
O novo marco legal tem por objetivo equilibrar regras que, por um lado, permitam o
desenvolvimento da atividade de banco de dados de proteção ao crédito, mas que também
preservem os direitos dos cidadãos, não só em relação a suas informações, mas à forma como
poderão ser utilizadas.
Nesse sentido, uma importante lacuna a ser preenchida pela nova regulação é a
atribuição de responsabilidades aos agentes da cadeia de coleta e disseminação de informações,
composta pelos bancos de dados, suas fontes de informação e seus clientes. De acordo com a
experiência internacional, a fonte de informação, que alimenta o sistema com informações, deve ser
responsável pela veracidade dos dados veiculados, mantendo documentos comprobatórios para
posterior verificação. A responsabilidade do banco de dados se inicia a partir do momento em que a
fonte lhe informou o fato novo observado sobre o consumidor. Devem, portanto, responder pelo
manejo e controle de seus sistemas, tomando o cuidado necessário para evitar vazamentos. Já do
cliente que adquire relatórios exige-se a confidencialidade sobre as informações recebidas, de modo
que não sejam difundidas indevidamente para terceiros, limitando seu uso apenas para os fins para os
quais elas foram obtidas: consumo ou concretização de uma transação comercial. A definição
normativa dessas atribuições constitui um passo fundamental para a fiscalização e coerção de abusos
em relação ao consumidor, além de dirimir diversos questionamentos judiciais sobre o assunto e
facilitar a responsabilização por erros e danos.
Finalmente, uma norma sobre bancos de dados de proteção ao crédito deve salvaguardar
os consumidores contra danos à privacidade de suas informações, mas sem inviabilizar a difusão
de informações sobre o histórico de operações de crédito, pois as mesmas são fundamentais para
a redução do custo do financiamento. O Código de Defesa do Consumidor brasileiro já estabelece,
no caput do artigo nº. 43, que o consumidor tem direito a conhecer as informações arquivadas sobre a
sua pessoa num banco de dados de proteção ao crédito. Apesar da previsão legal, a experiência destaca
a importância do estabelecimento de critérios para a efetivação desse acesso. Sendo assim, é
necessária a definição de condições de acesso (prazos, documentos necessários, etc.), custo (se o
48
banco de dados pode cobrar por esse serviço ou não) e o conteúdo a que se tem direito saber. Nesse
aspecto, é importante que o consumidor tenha conhecimento não apenas dos registros inseridos em seu
cadastro, mas também quem forneceu essas informações, quem acessou sua ficha e a quais
informações teve acesso. De posse dos dados sobre a sua pessoa, o consumidor pode verificar se há
erros em seu cadastro e se eles foram disseminados pela sociedade, acionando o respectivo agente para
reparar os danos causados à sua imagem. Como medida adicional de salvaguarda à privacidade dos
consumidores, os bancos de dados de proteção ao crédito estarão proibidos de alienar ou implementar
qualquer tipo de negociação que envolva a concessão de acesso aos dados cadastrais dos consumidores
às empresas de telemarketing.
Assim, pretende-se apresentar um novo conjunto de regras sobre os bancos de dados de
proteção ao crédito. Essa regulação terá um valioso papel na redução das assimetrias de informação
presentes no mercado de crédito e de transações comerciais no Brasil, facilitando, em especial, a
redução do custo do capital.
3.1.3 Aperfeiçoamento do Marco Regulatório do Setor de Seguros
A estabilidade monetária e a Reforma da Previdência têm favorecido o incremento do
mercado de seguros, que auxilia na garantia institucional dos diversos setores da economia e na
proteção dos consumidores, pessoas físicas e jurídicas, contra eventos futuros, incertos e aleatórios,
decorrentes dos diversos riscos a que se encontram expostos. Além disso, o setor de seguros contribui
de forma decisiva para a formação de poupança nacional e aplicação dos recursos em investimentos
produtivos.
No âmbito da formação da poupança nacional, foram adotadas medidas pelo Governo
para a redução da tributação sobre produtos de seguro e previdência, com especial destaque
para a redução do IOF sobre seguro de vida e para os novos produtos de previdência com
alíquotas de imposto de renda decrescentes para maiores prazos de aplicação. Essas medidas
fazem parte do esforço para expansão do setor, estimulam a acumulação e manutenção de recursos por
mais longo prazo e geram provisionamentos por parte das seguradoras de ativos de mais longa
maturação. Como conseqüência, estimula -se a demanda por títulos de similar natureza, favorecendo o
alongamento da dívida do Governo, e permitindo a que a poupança acumulada seja fonte de
financiamento para outros setores da atividade econômica.
No que se refere ao papel do seguro em atividades de risco, destaca-se a introdução dos
subsídios ao seguro rural (Lei nº 10.823/2003 e Decreto nº 5.121/2004) e ao seguro garantia para
construção de embarcações (Lei nº 10.893/2004 e Decreto nº 5.140/2004), favorecendo políticas
setoriais e permitindo a redução do risco de crédito nessas atividades.
49
Apesar da sua grande importância para a formação de poupança de longo prazo e para a
redução dos custos associados à incerteza, o setor de seguros foi historicamente afetado pelo contexto
inflacionário – que inibiu o seu desenvolvimento –, pelo nível excessivo de padronização de produtos
e pelas restrições à competitividade decorrentes da existência do monopólio de resseguros.
Por essas razões, o Governo inseriu em sua agenda 2004-2005 a revisão do marco regulatório
do setor de seguros e resseguros, favorecido pela alteração do artigo nº 192 da Constituição Federal,
através da Emenda Constitucional nº 40, de 29/05/2003, que permitiu que o Sistema Financeiro
Nacional fosse regulado por mais de uma lei complementar.
Colocando a proteção ao consumidor como objetivo central da ação do Estado, a política para
o setor de seguros será baseada em três pontos principais: i) o aperfeiçoamento institucional; ii) o
aperfeiçoamento fiscalizatório; e iii) o aperfeiçoamento das garantias ao consumidor. O objetivo dessa
política é retirar os entraves hoje existentes ao surgimento de novos produtos e serviços, promovendo
aumento da competitividade no setor, melhoria das normas prudenciais e aperfeiçoamento da atuação
do órgão regulador e fiscalizador.
No que se refere ao aperfeiçoamento institucional, a principal medida será a abertura do
mercado de resseguros. Hoje, o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB-Brasil Resseguros S.A.)
possui tanto a atribuição de regular o mercado quanto o monopólio das operações de resseguro.
Porém, sua composição acionária possui não apenas o Governo, mas também as próprias empresas
fiscalizadas. Historicamente, sua importância residiu na própria criação e desenvolvimento do
mercado nacional de seguros. Contudo, o monopólio do resseguro, do qual o Brasil é hoje uma das
raras exceções, ao lado de Cuba e Costa Rica, traz consigo atualmente alguns entraves econômicos à
continuidade do desenvolvimento setorial: a) cria ineficiências no mercado de seguros, por inibir que o
ressegurador único recuse atuar com seguradoras com deficiências de subscrição ou operacionais,
gerando maiores custos em última medida ao próprio segurado; b) não estimula a competitividade
entre seguradoras; c) inibe a entrada de novas seguradoras no mercado (nacionais e estrangeiras); e d)
inibe o desenvolvimento de novos produtos, principalmente aqueles não padronizados.
Em virtude do ressegurador único atender a todo o mercado segurador, o Governo tem
atuado de modo a estabelecer mecanismos que permitam ao IRB-Brasil Resseguros S. A.
permanecer no mercado competitivo com eficiência. Além de uma abertura paulatina, pretende-se
incentivar a criação de um mercado de resseguros local, evitando-se com isso a total dependência do
mercado internacional, bem como a sujeição irrestrita aos riscos internacionais.
As atribuições regulatórias e fiscalizatórias do sistema de resseguros serão transferidas
ao Conselho Nacional de Seguros Privados (CNSP) e à Superintendência de Seguros Privados
(SUSEP). Além do aperfeiçoamento institucional do mercado, é fundamental que o órgão supervisor e
fiscalizador tenha a atuação fortalecida, uma vez que a estrutura regulatória eficiente facilita a adoção
50
de medidas necessárias para proteger a poupança popular e, conseqüentemente, o próprio consumidor,
promovendo os ajustes para que o mercado cresça de forma prudente e sustentável. Neste sentido, o
Governo pretende introduzir medidas que visem à melhoria do órgão fiscalizador, bem como ampliar
os instrumentos legais que favoreçam a ação conjunta dos órgãos que atuam no Sistema Financeiro,
resguardadas as peculiaridades técnicas de cada um.
A agenda busca avançar ainda no campo das garantias aos consumidores, frente às medidas já
adotadas pelos órgãos regulador e fiscalizador do setor, em especial através da ampliação dos
mecanismos intra-setoriais de defesa do consumidor.
Por um lado, pode -se aumentar a segurança dos consumidores por meio da proteção das
provisões técnicas, que visam resguardar os ativos das seguradoras e mesmo das entidades de
previdência aberta que respondem pela “poupança” dos segurados, principalmente nos casos de
produtos de cunho previdenciário. Devem ser reformadas as regras de insolvência das seguradoras,
sociedades de capitalização e entidades abertas de previdência, tendo por objetivo a conclusão mais
ágil de regimes especiais e de processos liquidatórios, reduzindo os custos do sistema e dos
beneficiários de seus produtos, pessoas físicas e jurídicas. No campo da proteção, pretende-se ainda a
revisão do Fundo de Estabilidade do Seguro Rural, de modo a torná-lo mais eficiente como
instrumento de garantia de estabilidade da política agrícola.
Por outro lado, os consumidores são afetados pela eficiência dos canais de distribuição,
que são o principal elo de ligação com as seguradoras. O objetivo do Governo é aperfeiçoá-los,
reduzindo os custos monetários e de informação para o consumidor, que trazem efeitos negativos ao
sistema e, conseqüentemente, à geração e manutenção de poupança popular. Além do incentivo à
maior profissionalização, buscar-se-á o aumento de competitividade, a inovação com segurança e a
redução dos custos de intermediação, tornando os produtos mais acessíveis para o consumidor.
Enfim, pretende-se construir um arcabouço regulatório eficiente, que crie segurança jurídica
para todos os agentes do mercado, permitindo que o setor possa se desenvolver de forma sustentável.
O conjunto de medidas poderá ainda favorecer o aumento da eficiência difusa sobre todas as
atividades produtivas, tendo em vista o papel central exercido pelo setor securitário sobre os demais
segmentos econômicos.
3.1.4 Autonomia Operacional do Banco Central
O Brasil está iniciando uma trajetória de crescimento que se quer seja sustentável no
longo prazo. Para tanto, faz-se necessária a preservação e o aperfeiçoamento de algumas difíceis
conquistas da sociedade: a manutenção da responsabilidade fiscal e a preservação da
estabilidade do poder de compra da moeda nacional.
51
Evidências empíricas, bem como o desenvolvimento de modelos teóricos a partir da
década de oitenta, indicam a existência de forte correlação entre a adoção de políticas que visam
o controle dos níveis de inflação e a obtenção de maiores taxas de crescimento de longo prazo,
com menor volatilidade.13
No Brasil, desde a retomada do controle inflacionário, que já dura uma década, e, em
particular, com a adoção do sistema de metas de inflação, tem-se feito a opção pela adoção de regras
claras, de modo a garantir a eficiência da política monetária. Contudo, a inexistência de uma
autonomia legal à autoridade monetária reduz a segurança institucional quanto às formas de
conduta a serem adotadas com vistas à preservação da estabilidade do poder de compra da
moeda nacional.
Os custos associados a esta situação podem ser medidos pela intensidade e pela permanência
das políticas adotadas pela autoridade monetária para controlar eventual movimento inflacionário. As
políticas adotadas em caso de pressão inflacionária têm que ser mais intensas e mais duradouras
do que as que se fariam necessárias em um ambiente em que houvesse segurança institucional
(legal) quanto ao papel a ser desempenhado pela autoridade monetária no combate à inflação.
Por essas razões, um número crescente de países tem adotado recentemente regimes de
autonomia ou independência para seus Bancos Centrais (Tabela III).
A proposta que vem sendo debatida não prevê a independência da autoridade monetária,
mas sim sua autonomia operacional: definidas as metas de inflação pelo Governo Federal,
caberia a autoridade monetária utilizar os instrumentos de política monetária para garantir seu
cumprimento.
Dessa forma, consolida-se na política monetária o desenho adotado nas agências regulatórias,
em que a definição da polític a pública é atribuição do Governo, sendo sua execução atribuição de
agência autônoma em relação à administração direta. O Congresso Nacional desempenha um papel
importante nesse desenho, não apenas na análise das indicações do presidente e diretores das agências,
mas também por meio de reuniões periódicas com seus dirigentes de modo a avaliar a execução das
políticas públicas. No caso da autonomia operacional do Banco Central, o desenho institucional
deve prever os mecanismos a serem adotados em caso de descumprimento das metas
estabelecidas, que podem incluir até a suspensão dos mandatos concedidos.
13 Jones e Manuelli (1993) e Cecchetti e Ehrmann (2002).
52
Tabela III – Autonomia/Independência do Banco Central e Adoção do Regime de Metas de
Inflação em Outros Países
País Autonomia e/ou
independência 1/
Metas de
inflação 2/
País Autonomia e/ou
independência 1/
Metas de
inflação 2/
África do Sul não 2000 Irlanda 1998 1998
Alemanha sim 1998 Islândia 2001 2001
Austrália 1998 1994 Israel não 1992
Austria 1999 1998 Itália 1998 1998
Bélgica 1993 1998 Japão 1998 não
Brasil não 1999 Luxemburgo 1999 1998
Canadá 1985 1991 México 1993 1999
Chile 3/ 2001 1991 Noruega 2001 2001
Colombia nc 1999 Nova Zelândia 1990 1990
Coréia nc 1998 Peru 1994 1994
Dinamarca 1936 não Polônia 1997 1998
Espanha 1994 1994 Portugal 1998 1998
Estados Unidos sim não Reino Unido 1998 1992
Finlândia 1998 1993 República Checa 1993 1998
França 1994 1998 Suécia 1999 1993
Grécia 1997 1998 Suíça 2000 2000
Holanda 1998 1998 Tailândia nc 2000
Fontes secundárias: (a) DAUNFELDT, Sven-Olov & LUNA, Xavier de (2002). (b) MISHKIN, Frederic S. & Klaus Schmidt-Hebbel
(2001).
1/ Os países cujos bancos centrais são independente ou autônomos, mas não são conhecidas as datas em que tais status foram conferidos
são indicados por "sim". Para aqueles países cujos bancos centrais são independente ou autônomos e as datas são conhecidas, é informado
o respectivo ano.
2/ Os países que adotam o regime de meta de inflação, mas as datas de implementação do regime não são conhecidas, são indicados por
"sim". Para aqueles que as datas são conhecidas, é informado o respectivo ano.
3/ Lei Orgánica Constitucional del Banco Central de Chile - Janeiro 2001
nc - dado não conhecido.
3.2 Melhoria da Qualidade da Tributação
A estrutura tributária da economia tem papel destacado dentre os principais
instrumentos de política de médio e longo prazos. Os tributos atuam diretamente sobre a estrutura
de incentivos dos agentes, influenciando suas decisões de consumo, poupança, investimento e
produção, condicionando, portanto, a dinâmica de crescimento do País e o bem-estar de sua
população. Além disso, os tributos representam importante mecanismo de redistribuição de renda, ao
servir de fonte financeira para os gastos públicos na área social.
53
A reforma tributária alterou o regime cumulativo do Programa de Integração Social
(PIS) e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), que gerava
inúmeras distorções de preços relativos. Esse regime discriminava a produção nacional, reduzindo a
competitividade dos produtos nacionais no mercado externo e incentivando a criação de estruturas
industriais verticalizadas. Algumas empresas produziam seus próprios insumos meramente para
reduzir a carga tributária, o que representava alocação ineficiente dos recursos e reduzia a
produtividade da economia brasileira.
As reformas implementadas na legislação do PIS/COFINS reduziram essas distorções.
Inicialmente, foi convertida a maioria dos setores para o regime não cumulativo, incentivando a
organização eficiente das empresas, que passam a ter incentivos para se concentrarem nas etapas do
processo de produção em que são melhores e têm vocação, adquirindo insumos e componentes de
outras empresas especializadas, sem que isso onere, pela ótica tributária, o processo produtivo.
Contudo, existem ainda avanços importantes a serem feitos na Reforma Tributária e
para racionalizar o sistema tributário no Brasil. Para isso, o Governo vem se empenhando para
concluir, no próximo período, a segunda etapa da Reforma Tributária, com a unific ação da legislação
do ICMS, permitindo maior eficiência, redução da sonegação e facilitando o processo para o
estabelecimento de um imposto sobre valor agregado. As características principais dessa proposta são
a unificação das diversas legislações estaduais e o estabelecimento de alíquotas uniformes por
mercadoria ou serviço em todo o território nacional, as quais seriam restritas a um máximo de cinco.
A unificação do ICMS é um passo essencial em direção ao estabelecimento de um genuíno
Imposto sobre Valor Agregado (IVA), que deverá incorporar tributos como o próprio ICMS, o
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e mesmo o Imposto sobre Serviços de Qualquer
Natureza (ISS). Será garantida a destinação desses impostos para cada ente federativo, porém, os
procedimentos serão unificados e simplificados para os contribuintes. Os princípios que fundamentam
do IVA, como o da não-cumulatividade e da simplificação tributária, tornarão a estrutura tributária
brasileira mais eficiente e menos onerosa para os setores produtivos. O pacto federativo que está sendo
fortalecido em torno da proposta da unificação do ICMS, além das discussões ocorridas no âmbito do
Congresso Nacional, serão, sem dúvida, fundamentais para a criação do IVA, permitindo inclusive
maior rapidez em sua implementação, esperada para até 2007.
Existem importantes avanços que podem ser obtidos para a melhoria do sistema
tributário para as microempresas e empresas de pequeno porte. Nesse contexto, uma importante
medida que se encontra em estudo pelo Governo é o aperfeiçoamento do Sistema Integrado de
Pagamento de Impostos e Contribuições das Microempresas e das Empresas de Pequeno Porte
(SIMPLES), com melhor adequação dos parâmetros e critérios hoje existentes.
54
Está também sendo analisada a proposta da "Lei Geral das Micro e Pequenas Empresas",
originariamente proposta pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE)
que oferece tratamento jurídico diferenciado, simplificado e favorecido, aplicável ao segmento. A
proposta, que busca a regulamentação dos Art. 146, III, d, 170, IX e 179 da Constituição Federal, tem
por objetivo aumentar a competitividade das microempresas e empresas de pequeno porte como
estratégia de geração de emprego, distribuição de renda, inclusão social, redução da informalidade,
incentivo à inovação, fortalecimento da economia, trazendo benefícios diretos a toda a sociedade.
Recentemente, o Governo adotou diversas medidas tendo por objetivo reduzir o custo do
investimento produtivo. Algumas medidas reduziram diretamente os impostos sobre bens de
capital e investimento em setores específicos. Além disso, foram reduzidos os impostos sobre a
poupança de longo prazo e diversos instrumentos de securitização, de modo a estimular o
alongamento das decisões de poupança e reduzir o custo do financiamento para os setores
produtivos, contribuindo para o crescimento sustentado da economia nacional.
Está, também, sendo estudada a desoneração parcial da folha de pagamentos, que será
abordada na seção que trata das medidas para inclusão social, de forma a estimular um maior
grau de formalização do mercado de trabalho.
A melhoria da qualidade da tributação no Brasil é um processo longo, e que encontra
restrições na necessidade de se preservar a solvência fiscal. A carga tributária é determinada pelo
volume de gastos do setor público. Dessa forma, reduções setoriais dos tributos que diminuam as
distorções hoje existentes devem ser necessariamente compensadas, de modo a preservar o equilíbrio
fiscal de longo prazo e permitir uma contínua redução do custo do financiamento do setor público e,
conseqüentemente, do setor produtivo. Além disso, diversas melhorias na qualidade da tributação,
como a unificação das regras para os impostos sobre valor agregado – sobretudo PIS/COFINS e o
Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – devem ser necessariamente
negociadas com os entes federados.
As dificuldades dessa agenda, porém, devem ser contrapostas aos potenciais benefícios
da melhoria da qualidade da tributação, como a redução da informalidade, o aumento da
eficiência e da produtividade, a redução dos custos burocráticos que as empresas incorrem para
o cumprimento das obrigações tributárias, a redução dos custos administrativos do setor público
e a melhoria do sistema de monitoramento e fiscalização do setor público. Dessa forma, mesmo
que ainda exista muito a ser feito nessa agenda, e que não sejam poucas as dificuldades, existem
possíveis ganhos comuns dessas reformas que podem viabilizar sua implementação.
55
3.2.1 Desoneração da Poupança de Longo Prazo
A adoção de medidas que melhorem a estrutura do mercado financeiro e criem
incentivos à poupança de longo prazo permitirá a concessão de crédito a prazos mais longos,
contribuindo para o crescimento sustentado da economia, com repercussões positivas sobre os
níveis de emprego e renda. Atualmente, o Brasil apresenta uma baixa participação do crédito privado
como proporção da renda nacional quando comparado aos demais países emergentes. Paralelamente, a
tributação incidente sobre as transações financeiras cria o que é chamado em teoria econômica como
perdas de peso morto, já que desincentiva a busca por uma alocação eficiente de recursos e reduz a
competitividade dentro do mercado de aplicações financeiras. Este reduzido volume de crédito tem
impactos negativos sobre o bem-estar das famílias, tanto diretamente, ao elevar o custo do acesso ao
crédito para consumo, quanto indiretamente, ao elevar o custo do investimento. Já o desestímulo a
mudanças na alocação de recursos reduz a eficiência na escolha de portifólio e, conseqüentemente, a
sua canalização para os investimentos.
No que se refere à administração da dívida pública, o alongamento dos prazos de
poupança tende a torná-la menos vulnerável, favorecendo a redução do seu custo (juros). Além
disso, a alocação eficiente dos recursos de poupança aumenta a competitividade entre os gestores de
recursos e tende a elevar sua movimentação, contribuindo para o desenvolvimento dos mercados
secundários de ativos.
3.2.1.1 Conta Investimento
A incidência de tributação sobre movimentações financeiras reduz as mudanças de
posições financeiras por parte dos investidores, reduzindo a taxa de retorno privada e a
eficiência do sistema financeiro como um todo, já que reduz a competitividade entre os gestores
de recursos e entre os diferentes produtos financeiros. A criação da Conta Investimento, por
intermédio da Lei nº 10.892/2004, teve por objetivo permitir que os recursos financeiros sejam
tributados apenas no momento da movimentação da conta corrente para a Conta Investimento. Dessa
maneira, reduz-se o custo da mudança entre aplicações financeiras, já que movimentações posteriores,
no âmbito da Conta Investimento, podem ser feitas livres da cobrança da Contribuição Provisória
sobre Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira
(CPMF).
Além disso, a Conta Investimento levou ao pequeno investidor o mesmo tratamento que,
na prática, já era dado ao grande investidor. Isso porque os grandes investidores que tinham a
possibilidade de se beneficiar de fundos de investimento exclusivos já estavam livres desta
tributação.
56
Além disso, com o objetivo de reduzir as diferenças de tratamento tributário entre os
diferentes instrumentos financeiros existentes, foi alterada a periodicidade da cobrança de imposto de
renda sobre os ganhos em aplicações em fundos de investimento, de mensal para semestral, o que com
a capitalização dos juros se reflete em maiores ganhos para o poupador no longo prazo.
3.2.1.2 Novo Regime de Tributação de Renda Fixa e Variável
A Medida Provisória n° 206/2004 introduziu tributação decrescente nos Fundos de
Investimento e nos ativos de renda fixa de acordo com o prazo de aplicação dos recursos. A
alíquota de Imposto de Renda (IR) de 20% foi substituída por uma regra de tributação decrescente,
com uma alíquota de 22,5% para aplicações de até 6 meses, 20% para aplicações de 6 meses a 12
meses, 17,5% para aplicações de 12 meses a 24 meses e 15% para aplicações acima de 24 meses. As
aplicações atualmente existentes continuam sendo tributadas pela alíquota de 20% e, se mantidas por
prazos superiores a 12 meses, passam a se beneficiar das alíquotas reduzidas correspondentes (17,5%
ou 15%).14 Um segundo ganho para os Fundos de Investimento é a definição de que a cobrança do
chamado “come-cotas” passa a ser feita pela menor alíquota fixada (15%), beneficiando o poupador
que mantiver seus recursos por prazos mais longos na medida em que a diferença de tributação, se
houver, somente será cobrada no momento do resgate.
No caso dos investimentos em ações, diretamente ou por intermédio de fundos de
investimento em ações, a alíquota de IR está sendo reduzida para 15% a partir de 01/01/2005. De
maneira complementar, e com o intuito de incentivar a participação de pequenos investidores, o limite
de isenção mensal para operações realizadas em bolsas de valores foi elevado de R$ 4.143,00 para R$
20.000,00.
Foi ampliada também a isenção tributária existente sobre as Letras Hipotecárias (LHs), bem
como sua extensão para as Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Certificados de Recebíveis
Imobiliários (CRIs), quando mantidos por pessoas físicas. Atualmente, apenas os juros das LH são
isentos do Imposto de Renda. Dessa forma, foi reduzida a tributação sobre títulos representativos
de crédito imobiliário, contribuindo para a expansão dos recursos destinados à construção civil e
para a redução dos custos de securitização.
14 É importante ressaltar que a redução para até 15% na tributação dos rendimentos em fundos de investimento
somente se aplica àqueles fundos que mantiverem carteiras com prazo médio de vencimento dos títulos superior
a um ano. Nos demais fundos, denominados Curto Prazo, a tributação sobre os rendimentos será de 22,5% ou
20%, de acordo com o prazo de aplicação dos recursos.
57
3.2.1.3 Novo Regime de Tributação Previdência Complementar
A Medida Provisória n° 209/2004 introduziu duas medidas de incentivo à poupança de
longo prazo: (i) o fim da cobrança de IR sobre as carteiras dos fundos de pensão e demais planos
de previdência a partir de 01/01/2005, e (ii) a criação de uma nova sistemática de tributação
sobre planos de previdência complementar, baseada em alíquotas decrescentes de acordo com o
prazo, também a partir de 01/01/2005.
A primeira medida alcança todos os planos que recebem contribuições de pessoas jurídicas. As
regras atualmente em vigor, como forma de compensar a diferença de tributação de Imposto de Renda
entre pessoas físicas e jurídicas, tributam em 20% os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de
recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de entidades de previdência complementar e de
sociedades seguradoras que operam planos de benefícios de caráter previdenciário.
As entidades e seguradoras podiam optar por um Regime Especial de Tributação (RET), em
que este imposto ficava limitado a 12% das contribuições de Pessoas Jurídicas aos planos. A medida
anunciada acaba com essa tributação a partir de 2005 e tem um custo estimado para os cofres públicos
de R$ 450 milhões/ano. Como resultado, a rentabilidade líquida das carteiras aumenta, o que se traduz
em ganhos para os participantes, já que sobram mais recursos para o pagamento de benefícios.
A segunda medida atingirá os participantes de planos de previdência complementar criados a
partir de 01/01/2005 que optarem pela tributação decrescente. A nova tributação consiste na aplicação
de uma tabela específica de IR na fonte, com alíquotas decrescentes de acordo com o prazo de
acumulação no plano. Esta tabela começa em 35% e apresenta reduções de 5% a cada 2 anos até
atingir a alíquota de 10%. Desta maneira, indivíduos que atualmente estão sujeitos a uma alíquota de
27,5%, caso mantenham seus recursos acumulando por períodos superiores a 10 anos, passarão a
pagar somente 10% a título de imposto de renda sobre os benefícios de previdência complementar.
3.2.1.4 Redução das Alíquotas de IOF sobre Seguros do Ramo Vida
Buscando reduzir o custo dos seguros de vida, permitindo o seu acesso a segmentos de renda
mais baixa e a conseqüente expansão do setor, o Governo Federal editou o Decreto n° 5.172/2004
reduzindo imediatamente a alíquota do Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguro, ou
relativas a Títulos ou Valores Mobiliários (IOF) incidente sobre seguros de vida e acidentes pessoais
para 4% a partir de setembro de 2004, que se reduzirá a 2% em setembro de 2005 e a zero a partir de
setembro de 2006.
As reservas constituídas através do seguro de vida constituem importante mecanismo de
poupança de longo prazo e, portanto, uma importante fonte para o desenvolvimento de mecanismos de
58
financiamento de longo prazo. Em geral, são coberturas de mais baixo custo e cunho social forte,
amplamente difundidas em países desenvolvidos.
3.2.2 Mudanças na COFINS
3.2.2.1 Fim da Cumulatividade da COFINS
Aspecto fundamental da reforma tributária foi o fim da cumulatividade da COFINS, nos
termos da Lei nº 10.833/2003 (proveniente da Medida Provisória nº 135/2003). A COFINS, na
sistemática anterior, era um típico tributo cumulativo, haja vista que sua base de cálculo era o
faturamento das empresas. A base da COFINS incluía a despesa com a aquisição de bens e serviços
intermediários (insumos produtivos), que, por sua vez, já incorporava a mesma contribuição paga em
estágios anteriores da cadeia de produção.
São diversas as distorções causadas por um regime de tributação cumulativo. Em primeiro
lugar, os tributos cumulativos reforçam a vantagem oferecida pela sonegação. Uma empresa que
sonega um tributo cumulativo se apropria de todo o valor sonegado, enquanto que o ganho da
sonegação de um imposto sobre o valor adicionado depende da sonegação de impostos pelas
firmas que compram o seu produto. Em segundo lugar, devido ao efeito cumulativo das
contribuições, a carga tributária efetiva que incide sobre os diversos setores de atividade
depende crucialmente da estrutura de produção e, em particular, do número de etapas
envolvidas no processo produtivo. A competitividade de uma empresa, por exemplo, pode depender
mais de sua capacidade de “verticalizar” o processo de produção e comercialização – produzindo seus
próprios insumos e evitando comprá-los de outras firmas – do que da combinação eficiente de insumos
e do aumento de produtividade. Dessa forma, a incidência cumulativa da COFINS provocava uma
série de distorções econômicas, gerando ineficiência sobre o setor produtivo, o que não ocorre em um
típico imposto sobre valor agregado. Os efeitos distorcivos dos impostos cumulativos, e seus impactos
negativos na atividade produtiva, explicam a razão da sua limitada utilização em outros países.
Na presença de tributação cumulativa, torna-se mais difícil assegurar eficiência e eqüidade
também no consumo final, uma vez que o processo de repasse dos tributos para os preços dos bens
finais é extremamente complexo para ser previsto. Mesmo partindo-se de alíquotas nominais
uniformes e relativamente modestas (como a da COFINS, de 3%), o impacto de um tributo cumulativo
sobre os preços dos bens finais (consumidos pelas famílias, pelo Governo ou exportados) pode ser
bastante elevado e diferenciado nos diversos setores, dependendo do número de etapas produtivas
existentes. Dessa forma, fica difícil estimar uma compensação adequada para os exportadores ou uma
tributação apropriada de importações, de forma a eliminar o impacto negativo de um imposto
cumulativo sobre a competitividade dos produtos nacionais. Assim, um tributo sobre o faturamento
59
tende a provocar fortes distorções na estrutura produtiva e a penalizar setores que a sociedade desejaria
desonerar, como é o caso das exportações.
A nova COFINS é, portanto, um importante estímulo ao setor industrial, abrindo
caminho para importantes ganhos de eficiência econômica. Com a reforma, os gastos com
insumos, materiais, energia elétrica, despesas financeiras e depreciação passaram a ser dedutíveis da
base de cálculo do tributo. Isto significa que, mesmo com uma alíquota de 7,6%, as indústrias devem
acabar pagando menos COFINS do que quando a alíquota (cumulativa) era de 3%. Também é
favorecido o setor de serviços para empresas, inclusive os de ponta, como softwares gerenciais e
financeiros, na medida em que a COFINS paga nesse caso é dedutível.
3.2.2.1 Adequação do PIS/COFINS nas Operações de Hedge
Foram promovidas, por meio da Medida Provisória nº 219/2004, aperfeiçoamentos nas regras
em vigor do PIS/COFINS que tornarão a incidência tributária mais eficiente sobre operações
realizadas em mercados de liquidação futura (termo, swap, futuro, etc.), permitindo, inclusive, uma
adequação da incidência desses tributos sobre operações de hedge das pessoas jurídicas sujeitas à
incidência não-cumulativa.
A estrutura vigente onerava excessivamente as operações de hedge no mercado nacional,
tendo em vista que os tributos eram cobrados mensalmente pela variação dos ajustes de margem,
sendo que as perdas incorridas em um mês não eram compensadas em períodos futuros. A proposta
aprovada retira a periodicidade mensal, transferindo a cobrança dos tributos para o fim do período da
operação, o que permite a compensação de perdas durante toda a sua vigência. Tal medida reduz a
diferença de tratamento tributário das operações de hedge entre o mercado nacional e internacional,
contribuindo para que não ocorra a migração de operações de hedge para bolsas estrangeiras de
mercadorias e futuros.
3.2.3 Redução dos Impostos para Novos Investimentos
A literatura econômica recente mostra que um dos fatores da eficiência tributária que
garante o crescimento econômico sustentável é a baixa tributação sobre bens de capital.15 Nesse
sentido, diversas medidas têm sido adotadas para reduzir a tributação sobre a intermediação entre
15 Vários estudos mostram que, onde o preço relativo dos bens investimento em relação aos bens de consumo é
mais elevado, o crescimento econômico tende a ser menor [Jones (1991) e Bradford De Long e Summers
(1991)].
60
poupança e investimento e sobre os bens de capital para estimular o investimento e prevenir riscos de
surgimento de gargalos prejudiciais ao comércio exterior.
A instituição do Regime Tributário para Incentivo à Modernização e Ampliação da
Estrutura Portuária (REPORTO), por meio da Medida Provisória n° 206/2004, busca estimular
a realização de investimentos na recuperação, modernização e ampliação da estrutura
portuária. Essa medida, com vigência até o final de 2005 e podendo ser prorrogada por mais um ano,
tem como característica principal a desoneração tributária da aquisição de máquinas e equipamentos
destinados a investimentos nos portos, reduzindo o risco do surgimento de restrições que possam
dificultar a ampliação sustentada do comércio exterior do País. Os equipamentos adquiridos através do
REPORTO serão desonerados da incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), do PIS,
da COFINS e do imposto de importação (no caso de equipamentos sem similar nacional).
Outra medida importante foi a ampliação, a partir de outubro de 2004, do prazo de
apuração e recolhimento do IPI, que passou de quinzenal para mensal. Essa ampliação de prazo já
estava prevista na legislação, mas deveria entrar em vigor apenas em janeiro de 2005. A ampliação do
prazo de recolhimento do IPI tem como efeito a redução do custo operacional das empresas e a
melhora de seu fluxo financeiro, reduzindo o custo de seu capital de giro.
Por meio do Decreto nº 5.173/2004, o Governo ampliou a desoneração de bens de capital,
reduzindo de 3,5% para 2,0% a alíquota de IPI incidente sobre estes bens e ampliando a lista de
máquinas e equipamentos desonerados. Com isso, deu-se seqüência à política de redução de
impostos sobre bens de capital, iniciada em 2004 com a redução de 5,0% para 3,5% da alíquota
de IPI, e que tem como objetivo a desoneração total até o final de 2006. Trata-se do atendimento
de uma das principais reivindicações da indústria nacional, que é a redução do custo do investimento,
e cuja conseqüência é o estímulo ao aumento do volume de investimentos e, portanto, um aumento do
potencial de crescimento do País.
Em complementação a essas medidas, e ainda buscando incentivar os investimentos em
máquinas e equipamentos, o Governo Federal adotou também medidas que aceleram a
depreciação contábil de máquinas e equipamentos utilizados em processos industriais, para
efeito de contabilização como crédito tributário.
Permitiu-se também que o crédito do PIS/COFINS para os setores com direito à nãocumulatividade
possa ser aproveitado mais rapidamente, em apenas 2 anos (Medida Provisória nº
219/2004). Por fim, decidiu-se pela concessão de crédito presumido de PIS/COFINS (Lei nº
10.865/2004) para a agroindústria, inclusive cooperativas de produção e vinicultores, em relação às
aquisições dos insumos adquiridos de pessoas físicas.
61
3.3 Medidas Econômicas para a Inclusão Social
As medidas econômicas para a inclusão social têm por objetivo aumentar o acesso ao
crédito para consumo das famílias de baixa renda, reduzir os tributos sobre a produção de
alimentos da cesta básica, apoiar a expansão do crédito habitacional, fortalecer e ampliar o
Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), estimular o
desenvolvimento do microcrédito produtivo e a formalização das relações de trabalho.
O acesso ao crédito merece especial atenção do Governo devido ao potencial que possui
para melhorar a condição de vida da população de baixa-renda. Essa melhora pode ocorrer por
meio do acesso a compra financiada de bens de consumo, do investimento para ampliar um pequeno
negócio de onde vem o sustento familiar ou mesmo por permitir a aquisição da casa própria.
O Governo tem dedicado também especial atenção ao pequeno empreendedor, que geralmente
produz e presta serviços de maneira informal. A informalidade constitui um grande entrave ao
crescimento de um negócio, pois o empreendedor informal tem receio de que o seu negócio cresça e
fique visível para o Fisco. Outro entrave ao crescimento do negócio informal é que o difícil acesso ao
crédito para o empreendedor informal, diante das dificuldades de oferecer garantias que sejam aceitas
pelas instituições financeiras. Por essas razões, os negócios informais acabam muitas vezes restritos a
uma escala de produção inferior à escala ótima, o que explica, ao menos em parte, o porquê da
produtividade das firmas informais em determinado setor da economia ser inferior à produtividade das
firmas formais. Cabe notar também que a informalidade do negócio é, em geral, acompanhada da
informalidade das relações de trabalho e da informalidade perante o Sistema de Seguridade Social.
Por essas razões, o Governo buscou dar um primeiro passo para estimular a formalização de
pequenos negócios na economia brasileira, por meio do Projeto de Lei Complementar nº 210/2004,
que se encontra sob análise do Congresso Nacional, e que cria um regime tributário, previdenciário e
trabalhista especial para pequenos empreendedores e reduz a burocracia que os pequenos
empreendedores enfrentam em seu dia -a-dia no cumprimento de obrigações junto aos órgãos públicos.
No caso específico dos pequenos agricultores, o Governo fortaleceu o PRONAF e criou o
PROAGRO MAIS. O PRONAF tem por objetivo financiar pequenos agricultores, enquanto o
PROAGRO MAIS oferece seguro rural para pequenos agricultores em caso de quebra de safra.
3.3.1 Medidas de Estímulo às Microfinanças
3.3.1.1 Microcrédito
Além do atendimento das necessidades de crédito dos segmentos mais organizados da
sociedade, é necessário propiciar também o acesso aos produtos e serviços financeiros à
62
população excluída do sistema financeiro tradicional. Os grupos de menor renda encontram
dificuldades para acessar crédito no sistema bancário tradicional em função da assimetria de
informações entre os concedentes de crédito e os potenciais tomadores, da escassez de recursos
emprestáveis e do alto custo desses créditos em suas diversas modalidades.
Para modificar esse quadro, o Governo Federal vem adotando diversas medidas de
estímulo às microfinanças, envolvendo ações nas áreas da bancarização, microcrédito e
cooperativismo de crédito, em função do seu impacto positivo na geração de postos de trabalho e
de renda para a camada mais pobre da população. Nesse contexto, com destaque ao conjunto de
medidas lançado em junho de 2003, tem-se ampliado os mecanismos e os instrumentos tendentes a
facilitar à população mais carente o acesso aos produtos financeiros adaptados à sua realidade sócioeconômica,
tais como:
· conta corrente simplificada, movimentável somente por cartão, sem cobrança de tarifa até 12
transações por mês, com saldo de até R$ 1.000,00, excluído o valor do microcrédido concedido;
· concessão de crédito aos microempreendedores e à população de baixa renda no valor de até R$
1.000,00 para microempreendedores (investimento) e R$ 600,00 para pessoas físicas (consumo), à
taxa máxima de 2% ao mês, tendo por fonte os 2% dos depósitos à vista, conforme autorização da
Lei nº 10.735/2003; e
· outros produtos e serviços, como conta de poupança, seguros e planos de previdência
complementar.
Dados disponíveis mostram que, até 30/09/2004, foram abertas mais de 3,4 milhões de contas
simplificadas, sendo 2,2 milhões na Caixa Econômica Federal (CEF) e 871 mil no Banco do Brasil
(BB). Concomitantemente, tem aumentado nos últimos meses o saldo das operações de microcrédito à
taxa de juros máxima de 2% ao mês com base na exigibilidade bancária. Assim, a carteira ativa dessas
operações, em 30/09/2004, considerando apenas cinco grandes instituições financeiras, situava-se em
R$ 339 milhões e 691.536 operações. O acumulado em um ano nestes mesmos cinco bancos chega a 2
milhões de contratos e R$ 843 milhões emprestados.
Dessa forma, há evidências de que as medidas na área de microfinanças no País têm obtido
resultados expressivos, especialmente quanto à bancarização. Em relação ao microcrédito com funding
na exigibilidade bancária, o referido mecanismo, além de apresentar um volume abaixo do potencial
existente, tem sido direcionado essencialmente às demandas de consumo (em mais de 95% das
operações), mas não às do crédito produtivo. O microcrédito não tem atendido em sua plenitude a sua
finalidade de prover recursos aos microempreendedores que não têm acesso às linhas de crédito do
sistema financeiro convencional, de modo a propiciar-lhes as mínimas condições para o incremento de
seus empreendimentos, normalmente situados na informalidade.
63
3.3.1.2 Focalização do Microcrédito Produtivo
A fim de induzir a expansão do microcrédito produtivo, o CMN, nos termos da
Resolução nº 3.229/2004, autorizou as instituições de microcrédito a cobrarem taxas superiores a
2% ao mês, mas limitada a 4% ao mês, desde que os recursos sejam direcionados ao crédito
produtivo orientado.
Entretanto, verificou-se a necessidade da adoção de medidas adicionais para o
desenvolvimento mais robusto do microcrédito produtivo. Essa última modalidade de crédito
apresenta maior custo, sendo em geral intermediada por um agente de crédito e necessitando de
tecnologia específica. Desse modo, o Governo Federal lançou em novembro de 2004 o Programa
Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), com o objetivo de ampliar o acesso ao
crédito produtivo pelos microempreendedores formais e informais. Para focar especificamente as
necessidades do microempreendedor na sua atividade econômica, o microcrédito produtivo orientado é
definido como aquele concedido sob a metodologia baseada no relacionamento direto do agente de
crédito com o microempreendedor no local da atividade, mediante: (i) o atendimento por pessoas
especialmente treinadas para prestar orientação educativa sobre a gestão do negócio e as necessidades
de crédito, visando o seu desenvolvimento sustentável; (ii) o contato presencial durante todo o período
do crédito e (iii) definição do valor e das condições do crédito após a avaliação da atividade e da
capacidade de endividamento do tomador. As instituições de microcrédito produtivo orientado que
estarão em contato direto e presencial com os microempreendedores serão as cooperativas singulares
de crédito, as agências de fomento, as sociedades de crédito ao microempreendedor (SCM) e as
organizações da sociedade civil de interesse público (OSCIP).
Os recursos do Programa serão provenientes da exigibilidade bancária já autorizada pela Lei
nº 10.735/2003, referente aos 2% dos depósitos à vista das instituições bancárias, limitadas a 30% das
disponibilidades por instituição financeira, e do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Os
beneficiários serão os microempreendedores com renda bruta anual de até R$ 60 mil/ano ou R$ 5
mil/mês, podendo o crédito produtivo ao microempreendedor chegar a até R$ 5 mil, acima do limite
de R$ 1 mil estabelecido para as operações com funding na exigibilidade bancária e hoje aplicadas
preponderantemente em crédito ao consumo. Para facilitar a concessão do crédito pela instituição de
microcrédito ao microempreendedor popular, sem esquecer o aspecto da segurança ao credor,
permite-se a dispensa da exigência de garantias reais, desde que sejam substituídas pelo aval solidário
ou por outras formas alternativas consistentes e aceitas pelas instituições financeiras operadoras. Por
sua vez, para permitir o acesso aos recursos das instituições financeiras operadoras em condições mais
seguras e mais baratas, as OSCIP e as SCM poderão ser amparadas pelo Fundo de Aval para
Microempresas e Empresas de Pequeno Porte (FAMPE) – Fundo de Aval do SEBRAE – e,
64
adicionalmente, também pelo Fundo de Aval para a Geração de Emprego e Renda (FUNPROGER),
incluindo na abrangência deste último Fundo as cooperativas de crédito.
Deve-se dar atenção especial à sustentabilidade e à transparência do Programa, que serão
resultantes essencialmente do monitoramento e fiscalização eficazes das operações, mediante o
estabelecimento de regras claras sobre a responsabilidade de todos os agentes do Programa,
principalmente quanto à relação entre as instituições financeiras operadoras e as instituições de
microcrédito produtivo orientado. Nesse sentido, foram estabelecidas regras sobre os requisitos a
serem observados no repasse de recursos públicos, em especial do FAT, o que propiciará maior
segurança na atuação dos bancos oficiais no repasse desses recursos às instituições de microcrédito.
Para agilizar e reduzir o custo da cobrança de créditos inadimplidos, destaca-se o
Projeto de Lei nº 1.355/2003, que permite as OSCIP e as SCM recorrerem aos Juizados especiais
para a cobrança dos créditos em atraso. Finalmente, atribui-se ao Comitê Interministerial do
Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado a competência para detalhar as condições
técnicas e operacionais do financiamento e com isso permitir a efetiva implementação e
aperfeiçoamento contínuo do Programa.
3.3.2 Medidas para o Fortalecimento da Agricultura Familiar
Com o objetivo de viabilizar aos pequenos agricultores e as suas famílias as condições
necessárias para viabilizar sua permanência nas atividades ligadas ao agronegócio, o Governo tem
fortalecido o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Para 2004,
estima-se que os programas para agricultura familiar terão um investimento de R$ 5,8 bilhões. Nos
dois anos do atual Governo, o volume investido na agricultura familiar já alcança R$ 12,4 bilhões.
Outra medida aprovada pelo Governo em 2004 foi a criação do PROAGRO MAIS, no âmbito
do Programa de Garantia da Atividade Agropecuária (PROAGRO). Esse programa atuará como um
seguro ao pequeno produtor rural uma vez que assegurará até R$ 1.800,00 ao produtor em caso de
perda superior a 30% de sua lavoura. As resoluções do CMN de nº 3.234, de 31/08/2004, 3.237, de
30/09/2004, e 3.246, de 25/11/2004, normatizaram o programa.
3.3.3 Medidas que Reduzem a Regressividade da Estrutura Tributária
Como documentado no documento “Gastos Sociais do Governo Central 2001-2002”, o sistema
tributário brasileiro penaliza igualmente todos os decis de renda. A arrecadação de tributos no Brasil é
bastante concentrada nos impostos indiretos, em comparação com os demais países em
desenvolvimento e desenvolvidos. Como a população de menor renda gasta uma fração maior em
65
consumo e, em particular, na compra de alimentos, os elevados impostos indiretos sobre a cesta básica
acabam tendo uma incidência maior sobre esse grupo. Por essa razão, o Governo reduziu a carga de
PIS/COFINS sobre alimentos e insumos necessários a sua produção (Lei nº 10.865/2004). Essa
medida, por meio da redução a zero da alíquota de PIS/COFINS, buscou reduzir os preços e incentivar
a produção e o consumo de alimentos. Os produtos beneficiados são: os hortifrutícolas, os ovos, o
arroz, o feijão, a farinha de mandioca, os adubos, os fertilizantes, os defensivos, as sementes e as
vacinas de uso veterinário.
3.3.4 Medidas para Facilitar o Acesso da População de Baixa-Renda ao
Financiamento Habitacional
3.3.4.1 Direcionamento de Recursos da Poupança no Âmbito do SFH
Preocupado com a situação de baixo financiamento para a aquisição do primeiro imóvel
de menor valor, o Governo decidiu ajustar as regras do direcionamento dos recursos da
poupança no âmbito do SFH, a fim de incentivar uma melhor focalização do financiamento
imobiliário nesse segmento. Essa medida foi uma das responsáveis pelo incremento de mais de R$
2,5 bilhões de novos recursos no SFH, em 2004.
O Conselho Monetário Nacional editou em março de 2004 a Resolução nº 3.177, realizando
alguns ajustes na Resolução 3.005/2002, que traz as regras do direcionamento de recursos da poupança
no âmbito do SFH. Uma primeira mudança foi a duplicação da taxa de decaimento do Fundo de
Compensação de Variações Salariais – FCVS virtual – utilizado para fins de direcionamento de
crédito. O uso dos créditos de FCVS para fins de direcionamento foi negociado no passado com o
objetivo de fomentar a negociação desses créditos para capitalização de instituições financeiras na
época do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional
(PROER). Com isso, reduziu-se significativamente o prazo limite para uso do FCVS, obrigando as
instituições do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimos (SBPE) a substituir, em ritmo mais
acelerado, esses créditos por operações de financiamento.
Além disso, a fim de desestimular o não direcionamento, caso em que os valores deverão
ser recolhidos compulsoriamente ao Banco Central, foi reduzida a rentabilidade desses
compulsórios para 80% da Taxa Referencial (TR) ao mês. Vale lembrar que a taxa anterior era de
TR + 0,5% ao mês, equivalente à remuneração da poupança, que vem a constituir o funding dessa
operação. Essa medida, ao determinar uma remuneração inferior a da caderneta de poupança, acaba
por tornar antieconômico o não direcionamento do recurso.
66
Por fim, foram congeladas, aos valores reais de 9 de março de 2004, as posições de Letras de
Crédito Imobiliário (LCI) e de Letras Hipotecárias (LH) mantidas pelas instituições do SBPE, para
fins do direcionamento.
3.3.4.2 Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH)
O PSH é um programa inserido no conjunto de medidas que visam reduzir o déficit
habitacional e proporcionar moradia às famílias mais carentes. Foi instituído pela Medida Provisória
n.º 2.212/2001, transformada na Lei n.º 10.998/2004, com o objetivo de destinar recursos do
Orçamento Geral da União (OGU) para subsidiar o financiamento de casas populares,
complementando a capacidade de pagamento dos adquirentes e oferecendo cobertura para os custos
dos agentes financeiros.
Ao ser operado em parceria com o setor público municipal ou estadual, sob a forma de
recursos financeiros, bens ou serviços, o PSH viabiliza a aquisição e/ou produção de casas
populares para a população de baixa renda e ainda contribui para a geração de emprego e renda
no município. Além disso, estimula novas parcerias e propicia a divisão de custos, num processo em
que todos saem ganhando.
No ano de 2004, o programa recebeu uma série de modificações visando seu aperfeiçoamento
e a melhor focalização da aplicação de seus recursos. Como resultado dessas alterações, verificou-se a
diminuição do valor unitário do subsídio, cujo valor era de R$ 1.453,25 em 2002 e passou a R$
624,40, em 2004, e ainda a ampliação do quantitativo de agentes participantes dos leilões de subsídios,
instrumento adotado para alocação do orçamento destinado ao programa. É importante destacar que as
ofertas públicas e leilões de recursos obedecem a regras claras que procuram maximizar a
concorrência e a quantidade de financiamentos concedidos, tornando-se acessível a qualquer
instituição financeira que possua eficiência de custos e tenha capacidade de precificá-los
adequadamente.
Do ponto de vista da eficiência, os indicadores do PSH também são bastante positivos, posto
que pode ser considerado um programa de baixo impacto no orçamento público, mas que apresenta
retorno significativo do ponto de vista social, pela sua característica de elevação do bem-estar da
população de baixo poder aquisitivo.
67
3.3.5 Medidas para Estimular a Formalização de Pequenos Negócios e das
Relações de Trabalho
3.3.5.1 Estímulo ao Empreendedor de Baixa-Renda
Além de atuar no sentido de simplificar o processo de legalização de empresas, o
Governo tem encaminhado outras medidas de estímulo à formalização, em particular, do
pequeno empreendedor. Dados oficiais apontam que quase a metade da força de trabalho ocupada no
Brasil encontra-se na informalidade. Os dados da pesquisa mensal de emprego do IBGE revelam que,
ao final do primeiro semestre de 2004, 22,5% da população ocupada era composta de empregados sem
carteira assinada. Além disso, outros 20,1% da população ocupada consistiam de trabalhadores por
conta própria. Isso significa que quase 43% da população ocupada nas 6 maiores regiões
metropolitanas brasileiras (Recife, Salvador, Belo Horizonte, São Paulo, Rio de Janeiro e Porto
Alegre) encontravam-se na informalidade, refletindo um quadro preocupante de exclusão econômica e
social.
Do lado do indivíduo empreendedor, sua atividade não conta com os atributos peculiares à
empresa formal, como a segurança jurídica, o acesso a determinados mercados e a ampla possibilidade
de crescimento. A falta de segurança jurídica constitui um dos principais custos da
informalidade, normalmente concretizada no risco da incidência de multas. Muitas vezes, a
inadimplência, ou o não cumprimento contratual, não pode ser solucionado na Justiça pela ausência da
personalidade jurídica. A dificuldade de acesso a mercados está intimamente relacionada às restrições
de acesso ao crédito, decorrente da própria informalidade e à incapacidade de oferecer garantias. O
empresário também se vê limitado na expansão de sua atividade, seja porque certos tipos de contrato
(em particular com entidades públicas) exigem a formalização, seja porque o ganho de escala dá maior
aumenta a visibilidade perante o Fisco.
Dessa forma, a sociedade convive com dois setores – um formal e outro informal – o que
estimula o exercício de atividades rent-seeking que exploram a ilegalidade da atividade informal.
Assim, gera-se uma elevação no custo médio de transação da atividade econômica e produz-se
expressivo ônus social, pois os recursos aplicados em atividades rent-seeking poderiam estar sendo
empregados na geração de emprego e renda.
A informalidade é um problema mais grave nos empreendimentos de baixa renda, uma vez
que atividades de maior faturamento tendem a fazer com que o custo de oportunidade da
informalidade seja extremamente alto, incentivando a formalização, a despeito da elevada burocracia
na gestão do negócio formal. Em alguns ramos de atividade, observa-se de fato o movimento de
formalização pelo empresário quando se ganha uma escala mínima na sua atividade informal
[Zylberstajn (2003)].
68
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2002, do IBGE, são 16,9
milhões os trabalhadores sem carteira assinada ou por conta própria, com 21 anos ou mais, em
atividade não agrícola e que não contribuem para a previdência, com renda até R$ 36.000,00 ao ano do
trabalho principal.
Entretanto, a melhoria da condição social da população pobre, por meio da formalização do
seu empreendimento, tem tido alcance limitado em função dos próprios custos para o seu
funcionamento. A empresa formal, além das dificuldades enfrentadas no processo de registro e
legalização, deve assumir também uma série de encargos e obrigações de natureza tributária,
trabalhista e previdenciária, cujo cumprimento exige uma escrituração complexa de custo não
desprezível.
O diagnóstico aqui sintetizado aponta para o grande desafio de criar as condições para a
inserção desse grande contingente de pequenos empreendedores informais no setor formal da
economia. Para isso, torna-se imprescindível a criação de uma alternativa juridicamente segura e
economicamente viável para esses empreendedores. O objetivo é promover a formalização de seu
negócio, sua inclusão previdenciária e a de seus empregados, assim como o estímulo ao emprego
formal pela adoção de regimes simplificados em suas obrigações tributárias, previdenciárias e
trabalhistas enquanto empresário. Para simplificar a gestão de negócios do pequeno empreendedor,
uma alternativa é criar um sistema informatizado de apoio ao empresário, que calcule
automaticamente os boletos para pagamentos de impostos e contribuições e gere as declarações e
documentos que o empresário é obrigado a fornecer periodicamente a diversos órgãos públicos.
Nesse sentido, o Governo encaminhou ao Congresso o Projeto de Lei Complementar nº
210/2004, que procura incentivar a formalização do típico microempreendedor em que a pessoa
física e o ente jurídico se confundem no exercício da atividade econômica, com faturamento
limitado a R$ 36.000,00 ao ano.
O regime tributário simplificado confere à microempresa a vantagem de arrecadar de forma
unificada tributos federais, estaduais e municipais. A microempresa ficará desonerada de um conjunto
de impostos e contribuições federais, entre eles o Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ), a
Contribuição para os Programas de Integração Social (PIS/PASEP), a Contribuição Social sobre o
Lucro Líquido (CSLL), a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS) e o
Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) para bens produzidos no País. Na esfera federal, a
microempresa recolherá apenas a Contribuição para a Seguridade Social, a cargo da empresa. Além
disso, impostos estaduais e municipais, como o Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de
Mercadorias e sobre Serviços de Transporte Interestadual e Intermunic ipal (ICMS) e o Imposto sobre
Serviços de Qualquer Natureza (ISS), também fazem parte dessa sistemática unificada de pagamento
de tributos.
69
É importante ressaltar que a inclusão do ICMS e do ISS objetiva permitir que a microempresa
possa cumprir de uma única vez todas as suas obrigações, que deverão ser calculadas mensalmente. O
projeto de lei complementar tem a flexibilidade necessária, em especial no que tange à determinação
de alíquotas, para permitir a adaptação dos diferentes programas voltados ao pequeno empreendedor
existentes em Estados e Municípios. A lei inclusive prevê a criação de Comitê Gestor com a
participação de representantes do Governo Federal, dos Estados e dos Municípios, a fim de realizar os
devidos ajustes na política de maneira coordenada entre os entes federativos.
Nesse regime tributário simplificado, a microempresa estará obrigada ao pagamento mensal da
contribuição previdenciária patronal à alíquota única de 1,5% sobre o faturamento. Caso a
microempresa seja contribuinte de ICMS, poderá haver um acréscimo de até 1,5% sobre o faturamento
ou de alíquota ad rem de até R$ 45,00. Caso seja contribuinte do ISS, poderá haver acréscimo de até
2% sobre o faturamento ou alíquota ad rem de até R$ 60,00.
No que concerne às obrigações trabalhistas, busca-se incentivar o emprego formal, regido pela
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), no âmbito do pequeno empreendimento, desonerando os
encargos percebidos pela microempresa de algumas contribuições. A contribuição ao Fundo de
Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) é reduzida de 8% para 0,5% sobre o salário, com a expressa
concordância do empregado. Tal redução é justificada, pois, em pequenos negócios como aqueles
abrangidos no projeto de lei complementar em questão, a relação de trabalho difere daquela relação
tradicional que se estabelece entre patrão e empregado, uma vez que o pequeno empreendedor muitas
vezes trabalha com o auxílio de amigos ou familiares. Essa, portanto, é uma relação de trabalho que
não se formalizaria mantidas as condições atuais. A microempresa de que trata o projeto de lei
complementar fica desobrigada também das contribuições sindicais e ao Sistema S (SESC, SESI,
SENAI, dentre outros) e de outras obrigações acessórias.
Com isso, espera-se que muitos trabalhadores que hoje se encontram na economia informal
passarão a contar com a proteção da CLT, reduzindo-se o grau de precarização da relação de trabalho
e conferindo maior segurança jurídica ao empregado e ao empregador.
O Projeto é complementado por ajustes na Legislação da Previdência Social, para incluir o
microempreendedor no sistema especial de inclusão social previsto na Emenda Constitucional nº 41,
de 19/12/2003, aplicável aos contribuintes individuais que trabalham por conta própria e sem qualquer
vínculo de serviço com empresa e aos contribuintes facultativos. Por esse sistema, ao pequeno
empreendedor, aos trabalhadores por conta-própria e aos contribuintes facultativos, é dada a opção de
se filiar à Previdência Social e ter direito a todos os benefícios assegurados pelo regime – à exceção da
aposentadoria por tempo de contribuição –, mediante contribuição de 11% sobre o salário mínimo.
O Governo trabalha também no sentido de desenvolver sistema informatizado que simplifique
e facilite a gestão de negócios desse pequeno empreendedor. A partir do uso desse sistema, o
70
empreendedor formalizado poderá cumprir todas as obrigações tributárias, previdenciárias e
trabalhistas, de forma fácil e ágil, sem precisar incorrer em custos de escrituração ou no
preenchimento e envio de formulários. Várias informações e declarações que o microempresário deve
fornecer aos órgãos públicos serão geradas automaticamente pelo sistema, como as informações para o
Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), do Ministério do Trabalho, a Relação
Anual de Informações Sociais (RAIS), e a declaração anual a ser entregue à Secretaria da Receita
Federal. O sucesso dessas medidas poderá autorizar a extensão de seu uso a empresas de maior porte,
reduzindo significativamente o custo da burocracia.
3.3.5.2 Desoneração Parcial da Folha de Pagamentos
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), ao final do primeiro
semestre de 2004, cerca de 43% da força de trabalho nas seis maiores regiões metropolitanas do País
encontrava-se na informalidade. Esse problema atinge, sobretudo, os trabalhadores com baixa
escolaridade, que recebem rendimentos próximos ao salário mínimo.
Existem diversos fatores que incentivam essa fração elevada de trabalhadores na
informalidade. Em primeiro lugar, os trabalhadores formais recebem liquidamente, em média, pouco
mais de 2/3 dos gastos do empregador com folha de salários, sendo o restante apropriado sobretudo no
financiamento da seguridade social. No caso dos trabalhadores de baixa renda, essa cunha não é
compensada por benefícios significativos de previdência ou por acesso mais fácil a serviços públicos
em virtude da condição de trabalhador formal. Além disso, a Lei Orgânica da Assistência Social
garante uma pensão no valor de um salário mínimo a todo cidadão de baixa renda que atingir 65 anos
de idade, independentemente de ter ou não contribuído para a Previdência Social.
Outra razão que explica a informalidade das relações de trabalho é a própria informalidade do
empreendimento. A existência de muitos tributos indiretos leva as pequenas firmas a operarem na
informalidade e a terem relações informais com seus fornecedores e trabalhadores. Deve-se destacar
que os empregos informais, além de mais freqüentes nos trabalhadores de baixa renda, se caracterizam
por uma maior rotatividade e menores ganhos de produtividade [Camargo (1996)].
Diante dessa constatação de que a informalidade penaliza os trabalhadores com menor
escolaridade e gera conseqüências negativas sobre a produtividade, o Governo está estudando
alternativas para a desoneração parcial da folha de pagamentos. Nesse sentido, segue-se uma tendência
que vem sendo observada em vários países do Mundo, que é a de tratar a reforma da tributação do
emprego não apenas como um instrumento para aumentar a eficiência econômica, mas também como
instrumento para reduzir a pobreza e a desigualdade de renda [Fitoussi (2000)].
O objetivo da desoneração parcial da folha seria estimular a formalização dos trabalhadores
menos qualificados - justamente os que mais sofrem sem o amparo da legislação trabalhista e sem o
71
acesso ao seguro-desemprego -, ao mesmo tempo em que o maior grau de formalização traria impactos
positivos sobre a produtividade do trabalho e, em conseqüência, sobre a renda dos trabalhadores. A
desoneração parcial da folha traria grandes benefícios, sobretudo, para os setores intensivos em mãode-
obra, como a construção civil e serviços em geral. A fim de subsidiar a elaboração de uma proposta
de desoneração parcial da folha, o Governo está estudando o impacto que diversos desenhos
alternativos teriam sobre o mercado de trabalho, sobre a desigualdade de renda e sobre as decisões de
investimento, sendo particularmente importante a estimativa da elasticidade da oferta de trabalho no
mercado formal para os diversos grupos de renda e escolaridade.
3.4 Redução do Custo de Resolução de Conflitos
Os contratos, por mais completos que sejam, não conseguem abarcar todas as possíveis
contingências futuras. Por essa razão, um bom sistema de registro de propriedade e mecanismos
eficientes de resolução de conflitos são fundamentais para o bom funcionamento de uma economia de
mercado. O registro de propriedade é fundamental para se assegurar que as partes envolvidas no
contrato possam dispor de maneira plena e irrestrita dos bens e direitos transacionados. Já o
mecanismo de resolução de conflitos é central para esclarecer omissões contratuais ou cláusulas
contingentes cuja aplicação não é consenso entre as partes, gerando conflito e exigindo a
intermediação de algum ente superveniente ao contrato.
Mecanismos eficientes de resolução de conflitos garantem que esse processo de
complementação contratual ocorra de forma célere e sem elevados custos adicionais para ambas
as partes. Se os marco legal e institucional que estruturam esses mecanismos sinalizarem um processo
moroso, custoso e com incentivos para ação protelatória de qualquer uma das partes, aumenta o custo
esperado das transações econômicas. Esse maior custo é pago pelas empresas e pelos consumidores e
se reflete em menor produção e geração de empregos, além de induzir distorções alocativas como, por
exemplo, a de gastar elevadas somas na manutenção de um departamento jurídico ao invés de se
realizar inversões na atividade produtiva da empresa. São os avanços realizados no aperfeiçoamento
desses mecanismos de resolução de conflitos e na redução de seu custo que apresentamos a seguir.
Foram adotadas medidas para elevar a eficiência no acesso à Justiça, assim como para
incentivar o uso de mecanismos alternativos de resolução de conflitos como a mediação. Essas
medidas atingem tanto a esfera constitucional do Judiciário – aumentando o grau de governança da
sociedade sobre a qualidade de seu serviço e reforçando o papel jurisprudencial das decisões dos
tribunais superiores – quanto o Código de Processo Civil, combatendo o incentivo a manobras
protelatórias no processo de execução, aperfeiçoando os meios executórios e racionalizando o sistema
recursal. Com isso, espera-se reduzir o custo do processo judicial como mecanismo de resolução de
conflitos, torná-lo mais ágil e célere, e elevar o acesso do cidadão comum ao serviço jurisdicional.
72
Foi também realizada uma importante reforma na legislação falimentar brasileira,
criando os instrumentos e incentivos à recuperação das empresas em dificuldades, ao contrário
do que ocorre na legislação até então em vigor. Espera-se com isso, evitar que empresas com real
probabilidade de recuperação encerrem suas atividades, preservando empregos, investimentos e a
estrutura produtiva como um todo. Além disso, com uma participação ativa e igualitária dos credores
nas decisões da empresa em dificuldades, torna-se mais eficiente a gestão, viabilizando a recuperação
da empresa, aumentando a segurança dos investimentos privados e reduzindo o custo de
financiamento.
3.4.1 Reforma do Judiciário
Apesar de importantes avanços realizados, especialmente no que concerne à difusão de
Juizados especiais e do uso da arbitragem, os diagnósticos publicados sobre o Judiciário
brasileiro nos últimos anos descrevem um quadro de elevado custo e de prazos longos na
prestação do serviço jurisdicional ao cidadão.16 Como resultado, tem-se um alto índice de exclusão
judicial com efeitos negativos sobre as relações e contratos econômicos em áreas como a creditícia e a
trabalhista, contribuindo também para o alto índice de informalidade no País. Quantificar esses efeitos
é uma tarefa difícil, mas alguns números têm sido consolidados para o mercado de crédito e podem
ilustrar a adversidade de uma estrutura judiciária ineficiente.
A tabela abaixo, elaborada com base no trabalho de Fachada, Figueiredo e Lundberg (2003),
apresenta estimativas de custo para a recuperação de quatro contratos hipotéticos de crédito (com
valores entre R$ 500 e R$ 50 mil), bem como do prazo de tramitação de duas modalidades típicas de
processo: a extrajudicial simples e a judicial (de conhecimento e de execução)17. As informações
básicas para o cálculo foram obtidas junto a instituições financeiras com contencioso nessa área.
Ainda que se trate da recuperação de contratos de crédito, problemas semelhantes ocorrem com outros
tipos de litígios da área cível com valores monetários similares, como, por exemplo, a retomada de um
imóvel, ou o pagamento de verbas indenizatórias, ou ainda uma rescisão contratual (prestação de
serviços, fornecimento de insumos, entre outros).
16 Ver Fachada, Figueiredo e Lundberg (2003); Pinheiro (2000) e Secretaria da Reforma do Judiciário (2004).
17 Esses valores foram calculados com base em estimativas de despesas processuais diretas (custas, advogados,
oficial de Justiça, peritos, dentre outros) e considerando-se um custo de oportunidade do capital de 20% ao ano
(ou seja, o quanto a parte credora deixou de ganhar por não poder aplicar livremente o valor em litígio).
73
Tabela IV – Custo e Prazo Estimados de Recuperação de Contrato de Crédito
Processo
Prazo de
Tramitação R$ 500 R$ 1.000 R$ 5.000 R$ 50.000
Extrajudicial Simples até 1 ano R$ 216 R$ 320 R$ 997 R$ 8.502
43,2% 32,0% 19,9% 17,0%
Judicial até 8 anos
Fase do Conhecimento até 3 anos R$ 486 R$ 779 R$ 3.018 R$ 28.122
97,2% 77,9% 60,4% 56,2%
Fase da Execução até 5 anos R$ 500 R$ 967 R$ 3.989 R$ 37.946
100,0% 96,7% 79,8% 75,9%
Valor do Contrato
Dessa forma, se o cidadão lesado desejar recorrer à Justiça brasileira para ver garantidos seus
direitos, perderia no processo entre 43,2% e 17% do valor da causa – no menor e no maior valor do
contrato, respectivamente – pela modalidade extrajudicial, que é a mais simples e mais rápida (de até 1
ano em se considerando que não sejam interpostos embargos à execução)18.
O rito processual mais complexo pode durar até 8 anos entre as fases de conhecimento, de
liquidação (determinação do valor) e execução da sentença. Se o processo tiver curso até o fim, para
valores até R$ 500, verifica-se que o custo é superior ao valor da causa, o que inviabiliza o uso do
serviço judicial. Mesmo para o maior valor de contrato considerado no estudo, de R$ 50 mil, quase
76% desse valor se perderia ao longo do processo judicial, o que explica o porquê do desestímulo do
cidadão de recorrer ao serviço jurisdicional.
De fato, da perspectiva do proponente do pleito, que tem um direito a ser ressarcido, só é
economicamente viável levá-lo até seu termo caso seja uma causa de alto valor ou se disponha de
estrutura jurídica permanente, como no caso das empresas de grande porte. Já do lado da parte
ré, é economicamente vantajoso estender o pleito até seu último recurso, pois o valor da sentença não
sofre atualização na mesma proporção que o rendimento oferecido por ativos financeiros. Essa
estrutura de incentivos é prejudicial ao adequado funcionamento do sistema econômico.
As pesquisas qualitativas indicam ainda que há uma relativa adaptação das empresas à
estrutura judicial ineficiente, sendo o seu custo incorporado aos preços praticados na economia.
Como aponta Pinheiro (2000), no que concerne ao empresariado, a ineficiência do Judiciário é
percebida mais como um problema para o conjunto da economia do que para sua firma em particular,
não sendo a principal condicionante para suas decisões empresariais. Conversas com os grupos
focais mostraram que as empresas vêem seu setor jurídico ou a assistência que recebem das
18 Nessa modalidade se insere a maior parte dos instrumentos e títulos de crédito.
74
associações de classe como componentes de sua estrutura operacional, considerando-os, até
mesmo, como fatores de competitividade, ou seja, quem explorar melhor as ineficiências do
Judiciário, em particular a morosidade do processo, leva vantagem sobre o seu concorrente.
Dentre as principais matérias em que se reconhece o uso de expedientes judiciais para explorar a
morosidade da Justiça estão a tributária (entre 82% e 91%, a depender da esfera pública), a creditícia
(77,4%) e a comercial (75,3%). Como causas da morosidade, foram citadas a passividade do
Judiciário, a falta de equipamento processual para ritos mais rápidos e a sobrecarga de processos. Já os
efeitos negativos sobre emprego (50,4% deixaram de empregar devido à Justiça do Trabalho),
especialização (32,4% reconhecem que deixaram de terceirizar) e negócios com a administração
pública (48,2%) aparecem com maior destaque.
O diagnóstico apresentado não só dá a dimensão do desafio para se reformar o sistema judicial
brasileiro como também a urgência para a sua implementação. Nesse sentido, o Governo firmou, no
mês de dezembro de 2004, em conjunto com o Supremo Tribunal Federal, a Câmara dos Deputados e
o Senado Federal, o Pacto por um Poder Judiciário mais rápido e republicano, que consiste em um
conjunto de onze compromissos assumidos pelos Poderes constituídos em prol de uma prestação
jurisdicional mais eficiente e acessível.
Cumprindo as tarefas assumidas, o Governo tem obtido importantes avanços em três frentes:
reforma de dispositivos constitucionais, aperfeiçoamento de mecanismos processuais e de resolução de
controvérsias e modernização e racionalização da gestão dos órgãos judiciais. Para coordenar e
implementar essas ações foi criada a Secretaria da Reforma do Judiciário, no âmbito do Ministério da
Justiça (MJ/SRJ).
3.4.1.1 Reforma Constitucional
A reforma constitucional visa aperfeiçoar a estrutura do Judiciário de forma a
conferir-lhe maior transparência e eficiência. Entre os principais pontos estão: i) o controle externo
do Poder Judiciário e do Ministério Público (por meio do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho
Nacional do Ministério Público); ii) a modernização do Estatuto da Magistratura, unificando critérios
de acesso, promoção, treinamento e punição na carreira, bem como a adoção de quarentena para seus
membros; iii) a federalização de crimes contra direitos humanos; iv) a autonomia administrativa,
financeira e de iniciativa das defensorias públicas, importante instrumento de inclusão judiciária, a fim
de fortalecê-la; v) e o aprimoramento do sistema recursal com a introdução da súmula vinculante.
Essas mudanças estão contempladas na Emenda Constitucional nº 45, de 2004, aprovada no Senado
em 17/11/2004.
Merece atenção especial o conjunto de medidas a respeito do efeito condicionante das
súmulas do Supremo Tribunal Federal, que visam equacionar o excesso de recursos que
75
desnecessariamente congestionam esses tribunais argüindo matérias já tratadas em decisões
sumuladas. Objetiva-se com isso dar maior poder efetivo à jurisprudência ao condicionar, ou mesmo
impedir, recursos aos Tribunais Superiores em temas já sumulados, evitando-se com isso o desperdício
de tempo e recursos de todas as partes envolvidas. Destaca-se, ainda, a criação de exigências para
os recursos dirigidos ao Supremo Tribunal Federal, como a de que o recorrente demonstre a
repercussão geral das questões discutidas no caso concreto. O escopo do dispositivo é impedir a
utilização de recursos junto ao Supremo Tribunal Federal com finalidade meramente
protelatória, e, com isso, garantir maior celeridade aos processos.
Um avanço emblemático promovido pela Proposta de Emenda Constitucional nº 29/2000 é a
inclusão do inciso LXXVII, no artigo 5º da Constituição, que trata dos direitos e garantias do cidadão
brasileiro. Esse inciso consubstancia um importante direito do cidadão, até então não previsto
formalmente pela Carta Magna brasileira: “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são
assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”.
Com isso, reforça-se o preceito constitucional de que o acesso à Justiça e o aperfeiçoamento da
prestação do serviço jurisdicional deve ser importante foco de ação do Estado.
3.4.1.2 Aperfeiçoamentos Administrativos do Poder Judiciário
A segunda frente de ação do Governo é a modernização e racionalização da gestão dos
órgãos judiciais. Nesse sentido, tem-se incentivado um conjunto de ações com vistas a elevar o grau
de eficiência gerencial (em particular, na gestão de informações processuais) das varas e tribunais e de
reforçar a ação de órgãos importantes na prestação do serviço judicial ao cidadão, como a Defensoria
Pública, os Juizados Especiais, os Juizados Itinerantes e os Centros de Integração de Cidadania, que
agilizam e democratizam o acesso ao serviço judicial. Vale ressaltar que os resultados das ações na
esfera administrativa não devem ser subestimados, devendo inclusive propiciar os resultados mais
imediatos ao cidadão. Essas ações partem da constatação da significativa diferença de desempenho nas
esferas gerencial e operacional entre os diferentes fóruns do País. Dessa forma, a unificação de
procedimentos administrativos, usando-se os casos de excelência como referencial, permite vislumbrar
ganhos substantivos de eficiência e melhoria na prestação judicial.
Algumas medidas nessa área já estão em andamento. Entre essas merecem destaque, na
área de informatização do processo, a criação do processo eletrônico (Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e Tribunal Regional Federal da 4ª Região), do interrogatório on-line (Tribunal de Justiça do
Distrito Federal), sistema de intimação pessoal eletrônico (Juizado Especial Cível em Florianópolis),
Livro de Sentenças eletrônico (2ª Vara Federal de Foz do Iguaçu-PR), Protocolo on-line (Supremo
Tribunal Federal) e o Sistema de Transmissão de Imagens e Documentos (Tribunal Regional do
Trabalho da 12ª Região). Na área da conciliação e agilidade processual, têm-se as Centrais de
76
Conciliação (Tribunal de Justiça de Minas Gerais), o Sistema de Protocolo do tipo drive-thru (Justiça
Federal do Ceará e de São Paulo), dentre outros.
Há ainda os projetos desenvolvidos com o apoio estrutural e logístico da Secretaria de
Reforma do Judiciário na área de gestão judicial: o Prêmio Innovare (premiação e replicação das
experiências bem sucedidas na área de tecnologia e gestão judicial); Justiça sem papel
(desenvolvimento de sistemas que permitam processos virtuais no âmbito do Judiciário, sem a
necessidade de documentos impressos); implementação de Juizados Especiais Previdenciários nos
Centros de Integração e Cidadania; expansão de sistema de comunicação de dados e informações entre
Judiciário e Poder Executivo, como no caso do cadastro nacional de veículos.
3.4.1.3 Reforma Processual
Uma linha de ação importante conduzida pelo Governo tem sido propor
aperfeiçoamentos aos ritos processuais e a mecanismos alternativos de resolução de
controvérsias. A reforma processual objetiva tornar mais eficiente e mais célere o rito processual,
reequilibrando o direito das partes na execução: o direito do autor de prosseguir com a execução e o
direito do réu de contestar e embargar a execução. Nesse contexto, pretende-se redesenhar a estrutura
de incentivos das partes no processo, de modo a, dentre outras coisas, selecionar o bom recurso,
imbuído do legítimo desejo de recorrer da decisão judicial, do mau recurso, que visa apenas protelar o
processo. Dois projetos de lei, voltados para o aperfeiçoamento da fase de execução da sentença
judicial e de título extrajudicial, já foram encaminhados ao Congresso.
Reforma Processual dos Títulos Judiciais
O Projeto de Lei nº 52/2004, em tramitação no Senado (Projeto de Lei nº 3.253/2004 já
aprovado na Câmara), propõe que a liquidação e a execução da sentença judicial deixem de ser
processo autônomo e passem a fazer parte do processo de conhecimento que analisa o mérito da
ação. Com isso, agiliza-se o rito de cumprimento da sentença, ao simplificar a notificação do réu,
que passa a ser por intimação ao invés de citação, além de arbitrar multa de 10% sobre o valor
devido em caso de não cumprimento tempestivo, em 15 dias, da sentença. Dessa forma, são
reduzidos os incentivos a atitudes protelatórias que passariam a ter um ônus maior para as partes.
Além disso, propõe-se que o autor passe a indicar os bens do réu a serem penhorados e o fim dos
embargos à execução, que tem o efeito automático de suspender o processo, criando a figura da
impugnação, sem efeito suspensivo automático.
Essas alterações, além de minorar o oportunismo na indicação dos bens a serem penhorados –
como a indicação de bens de difícil avaliação, que acaba ensejando recursos para sua substituição e
77
atrasa o processo – possibilitariam substancial economia de tempo na execução, pois a proposição e a
análise dos embargos (agora impugnações) pelo Juiz poderá ter curso simultaneamente ao
procedimento de penhora dos bens do réu, e não somente após esse último.
Reforma Processual dos Títulos Extrajudiciais
O Projeto de Lei nº 4.497/2004 propõe mudanças ao processo de execução por título
extrajudicial. Esse rito é empregado quando direitos e obrigações objetos de controvérsia judicial são
líquidos, certos e exigíveis por terem sido acordados por meio de instrumentos como títulos cambiais,
contratos de crédito, hipoteca, dentre outros. Por envolver a quase totalidade das modalidades
contratuais utilizadas no mercado de crédito, a melhoria e a agilização do rito extrajudicial contribuirá
positivamente para a expansão das operações creditícias.
O objetivo da reforma é simplificar e agilizar o processo de execução, reequilibrando os
direitos e deveres das partes e reduzindo o acesso a mecanismos puramente protelatórios.
Segundo a proposta, é concedido ao credor alguns direitos, como o de indicar os bens do devedor
a serem penhorados e de obter, no início do processo, certidão com a qual poderá gravar os bens
do devedor até o valor da dívida. Ao devedor, propõe-se que possa embargar a execução sem
precisar garantir o juízo e que se racionalize a lista de bens sujeitos à impenhorabilidade no processo
de execução.
Por fim, igualmente importante é o aperfeiçoamento dos meios executórios, ou seja, de
alienação dos bens penhorados. Atualmente, a regra é o leilão em hasta pública que, a despeito de
sua relativa imparcialidade e impessoabilidade, vem demonstrando limitação como mecanismo de
obtenção do "preço justo" do bem. O projeto de lei encaminhado pelo Governo inova ao introduzir
dois novos meios executórios que poderão ser utilizados para alienação do bem penhorado. A
primeira opção é a concessão do bem (adjudicação) ao credor pelo valor da avaliação, feita por oficial
de Justiça ou por perito e passível de contestação pelo devedor. Se o credor preferir, passa-se a
segunda avaliação que é a da alienação por iniciativa particular, que vem a ser a venda do bem através
do próprio credor ou de corretor credenciado na Justiça. A última opção passa a ser a da arrematação,
que é o leilão em hasta pública, para o qual também passam a ser permitidas outras facilidades e
simplificações, como o parcelamento do valor devido pelo arrematante.
Em suma, essas medidas dão uma maior eficiência e racionalidade ao rito da execução
cível, merecendo destaque dois aspectos. Em primeiro lugar, avança-se na definição dos papéis das
partes quanto à garantia do juízo e proposição de embargos: cabe ao credor a preferência na indicação
(limitada pela impenhorabilidade e pela ordem disposta na lei) dos bens cuja penhora garantirá o
pagamento do valor que lhe é devido e cabe ao devedor concentrar-se na sua defesa mediante os
embargos à execução. Com isso, evita-se o que ocorre atualmente, em que o devedor preocupa-se em
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apresentar bens ilíquidos ou sobre-avaliados à penhora, enquanto o credor preocupa-se em impedir a
proposição de embargos, argüindo a inadequabilidade dos bens penhorados e exigindo sua
substituição. Avança-se também em dar maior celeridade ao rito executório, tornando mais eficaz os
meios de alienação de bens, além de eliminar alguns dos instrumentos e benefícios que incentivavam
manobras protelatórias em seu curso.
Outros Projetos de Reforma no Código de Processo Civil
No dia 15 de dezembro de 2004, o Poder Executivo encaminhou ao Congresso Nacional
um conjunto de sete projetos de lei que também alteram o Código de Processo Civil, com escopo
de racionalizar a resolução judicial de controvérsias. Tais projetos foram elaborados
conjuntamente, pelo Ministério da Justiça, através da Secretaria de Reforma do Judiciário, e pelo
Supremo Tribunal Federal, com base em propostas de juristas e entidades ligadas ao tema. O princípio
seguido é o de reformar a estrutura processual a fim de selecionar o bom recurso do mau recurso. Em
outras palavras, pretende-se punir o recurso meramente protelatório. Em especial, deseja -se reforçar o
poder jurisprudencial das decisões dos tribunais superiores. Afinal, não há porque decisões das
instâncias inferiores congestionarem os tribunais superiores em matérias já pacificadas. Como
exemplo, estudo realizado pela Secretaria da Reforma do Judiciário mostrou que, em 2003, dos
processos julgados pelo Supremo Tribunal Federal, 56,8% correspondiam a agravos de instrumento,
40,4% representavam recursos extraordinários e 0,27% representavam Ações Diretas de
Inconstitucionalidade (ADIN), sendo que apenas esses últimos efetivamente apresentavam elementos
de inconstitucionalidade [Secretaria da Reforma do Judiciário (2004)].
O primeiro projeto institui a súmula impeditiva de recursos, que impede a qualquer das
partes de um processo o recurso aos tribunais se a decisão do Juiz estiver de acordo com
orientação sumulada sobre a questão, expedida pelo Supremo Tribunal Federal, pelo Superior
Tribunal de Justiça ou pelo Tribunal Superior do Trabalho.
O segundo projeto prevê a possibilidade do Juiz, ao julgar questão repetitiva, sobre a
qual já fixou entendimento em processo anterior e similar, expedir a sentença sem ouvir as
partes, de imediato. Vale lembrar que este procedimento somente será válido nos casos em que o Juiz
não acolher o pedido inicial, do contrário, deverá ouvir os envolvidos e seguir o procedimento comum.
O terceiro projeto dispõe sobre a utilização de meios eletrônicos para a prática de atos
processuais, disciplinando a matéria. A substituição dos ofícios e trâmites burocráticos pela
informatização dos procedimentos conferirá maior eficiência no trânsito dos processos e documentos.
O quarto projeto restringe a utilização dos agravos de instrumento, ou seja, dos recursos
de decisões interlocutórias do Juiz (decisões que não colocam fim ao processo, que não tem o
caráter de sentença, como, por exemplo, aquelas que permitem ou denegam a oitiva de testemunhas,
79
ou que concedem ou não concedem medidas cautelares). A proposta substitui os agravos de
instrumento pelos chamados agravos retidos, que não interrompem o curso do processo, e são
analisados apenas ao final do mesmo, junto com o recurso da apelação. A medida impede a utilização
dos agravos com a finalidade meramente protelatória, ou com o escopo de causar incidentes que
impeçam o normal trâmite do processo.
O quinto projeto decorre de um pleito antigo da Ordem dos Advogados do Brasil, e
permite que os advogados façam sustentação oral em determinados recursos, de maneira a
garantir a plenitude da defesa e o exercício do contraditório.
O sexto projeto trata da simplificação de procedimentos. A proposta permite o registro
extrajudicial de inventários e divórcios, desde que consensuais e não envolvam incapazes. Desta
forma, passa a ser desnecessária a manifestação do Juiz nestes casos, reduzindo os custos e o tempo
para as partes e para o próprio Judiciário.
Por fim, o sétimo projeto dispõe sobre o incidente de uniformização de jurisprudência
nos Juizados Especiais Estaduais. Atualmente, no âmbito de sua competência, os Juizados Especiais
proferem decisões diferentes sobre questões de mesma natureza, nos diferentes Estados, e essas
divergências de interpretação causam insegurança jurídica, especialmente no campo do direito do
consumidor. A proposta tem a finalidade de conferir, expressamente, ao Superior Tribunal de Justiça,
a competência de fixar entendimento definitivo sobre estas questões, de maneira a permitir uma
interpretação uniforme da legislação.
Reforma Processual Trabalhista
A morosidade do processo trabalhista também é objeto de preocupação do Governo, que
apresentou seis projetos de lei que alteram a Consolidação das Leis do Trabalho, no aspecto
processual. As propostas decorrem de sugestões encaminhadas ao Ministério da Justiça pelo Tribunal
Superior do Trabalho e por entidades e juristas envolvidos com a questão.
O primeiro projeto permite que o próprio advogado declare a autenticidade das cópias
oferecidas como provas no processo trabalhista, dispensando o procedimento de autenticação,
que se mostra dispendioso, moroso e pouco eficaz. Ressalte-se que a proposta regulamenta e
permite a suspeição dos documentos apresentados e impõe a responsabilização do advogado pelas suas
declarações.
O segundo projeto exige o depósito prévio de sessenta salários mínimos do empregado
que, tendo perdido na primeira instância, queira recorrer aos tribunais. A proposta tem a
finalidade de desestimular recursos desnecessários, que ostentem apenas fins de protelação da
satisfação da sentença.
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O terceiro projeto segue as diretrizes do anterior, e exige depósito prévio para a ação
rescisória (ação que pede a reabertura de discussão sobre caso já julgado pelo Poder Judiciário,
permitida em algumas hipóteses, como no surgimento de prova nova). O depósito tem o escopo de
filtrar as ações rescisórias, pois será revertido em multa se a mesma for julgada improcedente pelos
membros do tribunal.
O quarto projeto prevê alterações no processo de execução trabalhista. Propõe que o
executado, ao ser notificado da sentença condenatória, pague ou apresente seus bens aptos a garantir a
dívida. A omissão acarretará na vedação ao recurso da execução. A finalidade da proposta é agilizar a
execução e impedir manobras de ocultamento de bens, usuais na seara trabalhista.
O quinto e o sexto projetos reduzem as possibilidades de recursos perante os tribunais
trabalhistas, limitando suas hipóteses de incidência, de maneira a antecipar a efetividade das
sentenças judiciais.
Reforma Processual das Execuções Fiscais
Estão sendo debatidas no Governo medidas que visam tornar mais eficiente os ritos
processuais que tem a Fazenda Pública como parte. Recentemente foi negociada a introdução na
Medida Provisória nº 206/2004 de dispositivos que visam racionalizar o processo de execução fiscal
(em que a fazenda pública é parte autora). Entre os principais pontos, está a permissão legal de penhor
de até 30% do faturamento das empresas com débito fiscal e de arquivamento de causas de baixo valor
(abaixo de R$ 10 mil), cujo acompanhamento processual pela Fazenda Pública Federal pode ser
extinto por ser contraproducente.
Mecanismos Alternativos de Resolução de Controvérsias - Mediação
Está sendo discutido no Senado projeto de lei que visa aprimorar a mediação como
mecanismo de resolução de controvérsias. O Governo elaborou proposta de regulamentação da
mediação no sentido de reforçar seu uso seja previamente, como alternativa ao processo judicial,
objetivando a solução negociada fora da esfera jurisdicional, seja incidentalmente, no início do
processo, visando a brevidade da solução judicial. Essa iniciativa decorre da constatação de que muitas
das disputas não precisariam ir a juízo para serem resolvidas, ou ainda poderiam ser rapidamente
resolvidas no início do processo, em uma audiência de mediação e conciliação. Além disso, a disputa
na esfera judicial exige gastos, seja na contratação de advogado, seja com as custas judiciais, o que
tende a favorecer a parte de maior poder econômico. Esse anteprojeto regulamenta o procedimento da
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mediação dentro e fora do processo judicial e espera-se que o mesmo tenha um efeito similar à lei de
arbitragem, que impulsionou o uso desse instrumento após a edição de lei específica em 1996.
3.4.2 Lei de Falências e de Recuperação de Empresas
O aperfeiçoamento do processo falimentar pretende oferecer condições efetivas para que
as empresas viáveis, que estejam passando por dificuldades transitórias, consigam se recuperar.
A nova Lei de Falências tem por objetivo estimular a recuperação das empresas economicamente
viáveis ou a alienação de seus ativos produtivos, preservando-se a sua capacidade produtiva e os
empregos gerados.
A legislação falimentar em vigor encontra-se desatualizada. Nos quase 60 anos de vigência do
Decreto nº 7.661/45, verificou-se um intenso processo de modernização produtiva e financeira, que
não teve o correspondente acompanhamento pela legislação falimentar brasileira. Por essa razão, o
novo projeto procura atualizar a legislação, incorporando novos dispositivos destinados a estimular a
reabilitação de empresas ou a transferência de seu controle ou seus ativos para agentes mais eficientes.
A nova Lei de Falências procura gerar os incentivos corretos para a preservação dos ativos
produtivos nos dois desfechos possíveis para uma empresa que se encontre em dificuldades
financeiras. Se a mesma tem condições para se reerguer, foram desenhados dois modelos para que,
num ambiente de negociação entre o devedor e seus credores, se elabore um plano de recuperação, que
pode ser por meio judicial ou extrajudicial. Mas se o encerramento dos negócios for inevitável, o novo
regime de falências prevê regras e instrumentos para tornar a alienação de ativos eficiente e rápida,
evitando a deterioração da empresa.
A maior novidade do novo arcabouço legal é justamente o incentivo à negociação entre o
devedor e seus credores, os maiores interessados no destino da empresa. Para tanto, prevê-se o
estabelecimento de uma Assembléia Geral de Credores, que constitui o fórum para as discussões dos
interesses dos credores nos processos de recuperação judicial e falência.
Durante a recuperação judicial, a Assembléia tem a missão central de avaliar o plano de
recuperação proposto pelo devedor, que pode implicar em alteração das condições contratuais de
créditos vencidos e vincendos, alienação de ativos ou até mesmo alterações no controle da empresa.
Com o objetivo de contemplar os interesses muitas vezes díspares envolvidos no processo, o plano de
recuperação deve ser aprovado pelas três classes de credores: (i) trabalhadores, (ii) credores com
direitos de garantia real e (iii) credores quirografários.
Durante a falência, a Assembléia deve aprovar a forma de realização dos ativos da companhia,
de forma a garantir que a alienação maximize os recursos destinados a satisfazer os créditos contra a
massa falida.
82
A partic ipação dos credores nos processos de recuperação e falência também é estimulada pela
possibilidade de criação de um Comitê de Credores, formado por representantes de cada uma das três
classes que compõem a Assembléia Geral de Credores, com a função de fiscalizar a administração do
devedor durante a recuperação judicial e a gestão da massa falida, garantindo a transparência dos
procedimentos e coibindo abusos e fraudes.
3.4.2.1 Recuperação Extrajudicial
Como mencionado anteriormente, três são os institutos previstos no novo arcabouço
falimentar brasileiro: recuperação extrajudicial, recuperação judicial e falência.
O regime de recuperação extrajudicial visa conferir segurança jurídica para acordos
privados de reestruturação de dívida, mediante sua homologação pelo Juiz. Cabe lembrar que
atualmente a reestruturação de dívida é um mecanismo aplicável exclusivamente em regime de
falência, não sendo permitido em concordata. Entretanto, as grandes empresas contornam esse
obstáculo pela outorga de mandato a bancos de investimento que recompõem a dívida sem a
necessidade da empresa praticar qualquer ato em nome próprio. O mesmo expediente fica fora de
alcance para empresas de menor porte. Isso significa que a lei é contornada a um alto custo de
transação, de modo que o instrumento adequado da renegociação privada acaba sendo prerrogativa de
poucos.
A recuperação extrajudicial constitui um ambiente mais flexível e informal de
negociações sobre os destinos da empresa. Nela, o devedor pode convocar um número limitado de
credores para elaborar um plano de recuperação. Deve-se ressaltar que esse plano, por não contar com
a participação de todos os credores na sua fase de negociação, só pode conter cláusulas que afetem os
créditos da totalidade dos credores caso o plano seja assinado no mínimo por 60% do total de credores.
De forma a conferir maior segurança e transparência a esse acordo, o plano de recuperação
extrajudicial deve ser homologado na Justiça, abrindo-se espaço para a manifestação contrária de
credores que sintam-se lesados com o acordo extrajudicial. É importante destacar que créditos
tributários e trabalhistas não podem ser contemplados numa recuperação extrajudicial.
3.4.2.2 Recuperação Judicial
A recuperação judicial substitui a atual concordata preventiva, mas com uma amplitude
muito maior. Se a concordata envolve apenas os credores quirografários, a recuperação judicial
submete todos os credores à negociação de um plano de reabilitação da empresa, com a exceção do
83
Fisco. 19De forma a propiciar a tranqüilidade financeira necessária para a elaboração e negociação do
plano de recuperação, o projeto prevê um período de 180 dias em que as ações e execuções contra a
empresa ficam suspensas (o chamado stay period). Durante esse período, o plano deve ser submetido à
apreciação da Assembléia Geral de Credores, que em suas três classes deve aprová-lo por
unanimidade.
Em cada classe, a votação se dá por um critério misto de presença e valor de crédito, com
exceção da classe trabalhista, que vota apenas pelo critério de cabeça, evitando-se que os interesses
dos maiores credores (administradores e controladores da empresa) prevaleçam sobre a imensa
maioria dos trabalhadores. Se o plano for reprovado, é decretada a falência da empresa. E como forma
de impedir um impasse por tempo indefinido que levaria à deterioração da situação da empresa, ao fim
do prazo de 180 dias, as execuções contra a empresa podem ser retomadas. Com a aprovação do plano,
a condução dos negócios da firma, embora permaneça com o devedor, fica sujeita às novas condições,
acordadas com os credores.
3.4.2.3 Regime de Falência
O objetivo de se propor um regime de falência ágil e com a participação de credores é
facilitar a transferência da empresa, ou de suas partes viáveis, para um novo controlador melhor
capacitado para administrá-la. No regime atual, os processos de falências arrastam-se por vários
anos, levando à deterioração dos ativos da empresa, a começar pelos chamados intangíveis (marca,
rede de fornecedores e distribuidores, carteira de clientes, ponto comercial, etc.), atingindo inclusive as
instalações e o maquinário. Ao final desse processo, praticamente não existem ativos para cumprir as
obrigações com os credores. Dessa forma, há perda da capacidade de produção e geração de empregos
e tributos que aquela empresa poderia manter, ou até mesmo ampliar, se conduzida por
administradores mais eficientes. Por essa razão, o novo modelo incentiva uma rápida e ágil realização
dos ativos, permitindo um maior retorno aos credores, empregados, Fazendas Públicas e à sociedade
em geral.
Além da introdução de um rito mais célere para a realização dos ativos da empresa,
privilegiando a alienação em bloco, prevê-se ainda a venda dos mesmos em hasta pública, em leilão
por lances orais, propostas fechadas ou pregão. O objetivo é vender a empresa, ou suas partes, pelo
maior valor possível, distribuindo-se os recursos entre os credores e os trabalhadores. A esse respeito,
o projeto de nova legislação prevê diversas alterações relativas à ordem de preferência dos créditos.
19 O parcelamento das dívidas tributárias está previsto no Projeto de Lei nº 245/2004, de autoria do Senador
Fernando Bezerra, e que se encontra em análise no Senado Federal.
84
Os interesses dos credores trabalhistas foram alterados em duas direções. De um lado, foi
estabelecida uma altíssima prioridade para o pagamento dos salários atrasados nos últimos meses antes
da decretação da falência, limitada a cinco salários mínimos por trabalhador, com o fim de suprir as
carências dos empregados menos favorecidos, principalmente as suas necessidades alimentares
imediatas. Esse pagamento será realizado antes mesmo da quitação dos créditos considerados
extra-concursais.
Além disso, foi estabelecido um limite à prioridade máxima conferida aos credores
trabalhistas. Nas regras atuais, todos os trabalhadores e gestores das empresas são tratados
igualmente, e o valor da massa falida é rateado proporcionalmente aos créditos de cada trabalhador ou
gestor. Dessa forma, os trabalhadores com baixos salários recebem uma proporção dos seus créditos
trabalhistas igual a dos trabalhadores e gestores com altos salários. O limite de 150 salários mínimos
(R$ 36 mil atualmente) garante um tratamento mais favorável aos trabalhadores com menores salários.
Os valores excedentes, em geral devido aos gestores e controladores da empresa, passam a ser, com as
novas regras, quirografários.
Deve-se enfatizar que a prioridade dada aos créditos trabalhistas na nova lei é bastante
superior à verificada nos regimes falimentares de outros países (Tabela V). Sobretudo nos países
desenvolvidos, a prioridade no recebimento dos valores auferidos com a massa falida é dos credores
com garantias reais, havendo em apenas alguns casos a prioridade a alguns créditos trabalhistas, cujo
limite, porém, é bastante inferior ao observado no caso brasileiro.
No novo modelo, ocorre ainda uma alteração entre as posições ocupadas pelos créditos
tributários e aqueles derivados de garantia real. A situação atual, em que o Fisco recebe
imediatamente após os credores trabalhistas, constitui um desincentivo à participação dos demais
credores no processo de recuperação e falência. A elevação dos créditos com garantia real ao segundo
posto na escala de prioridades encontra-se em consonância com o objetivo de aumentar a participação
dos credores no processo e a celeridade na realização dos ativos. Com reais perspectivas de
recuperação de seus créditos, os credores acompanharão de perto os processos e pressionarão por uma
eficaz solução das eventuais dificuldades da empresa.
Merece destaque ainda o fim das sucessões tributária e trabalhista na venda de bens da
massa falida. Atualmente, a incerteza relativa às dívidas do falido afasta o interesse de potenciais
compradores, que não se mostram dispostos a arcar com o risco de responder por elevados e incertos
passivos contingentes de natureza trabalhista e tributária. O fim dessas sucessões estimula a
transmissão do controle de empresas viáveis, na medida que o próprio devedor continuaria sendo o
responsável pelo passivo da empresa.
Dentre os outros dispositivos do projeto, foi elaborado um processo judicial mais célere, que
incentiva a participação ativa dos credores e propicia maior segurança jurídica para evitar a
85
deterioração de ativos. Além disso, a preservação de garantias e o novo status conferido aos créditos
com garantia real estimulam a redução do custo do crédito no Brasil. E os trabalhadores, além de
assistidos pela prioridade de recebimento de seus créditos, se beneficiarão pela maior probabilidade de
manutenção de seus empregos. Com esse novo conjunto de regras, pretende-se dotar a economia
brasileira de uma legislação que estimule a preservação das empresas economicamente viáveis e
maximize o valor daquelas que não têm condições de recuperação.
86
Tabela V – Prioridades na Falência em Países Selecionados
PAÍSES PRIORIDADES NA FALÊNCIA
1 2 3 4
Alemanha Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais
Austrália Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Salários atrasados
Áustria Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais
Bélgica Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Fisco e Prev. Social
Bermudas Créd. c/ Gar. Real Salários e Encargos
(alguns)
Extra-concursais Créditos Fiscais
Bulgária Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais
Canadá Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Salários atrasados
(limitados)
Créditos Fiscais
China Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas (em
algumas regiões estes
recebem antes dos
extra-concursais)
Créditos Fiscais
Coréia Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais
Escócia Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créditos Fiscais Créd. Trabalhistas
Eslováquia Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais
(inclusive eventuais 3
salários atrasados)
Espanha Salários
(últimos 30 dias até 2
salários mínimos)
Créditos Fiscais Créd. c/ Gar. Real
Estados Unidos Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas
(limitados)
Créditos Fiscais
(até 3 anos antes da
falência)
Estônia Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real Créd. Trabalhistas Impostos em atraso
Finlândia Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais
França Salários em atraso Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real
Holanda Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créditos Fiscais Créd. Trabalhistas
Hong Kong Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real Créd. Trabalhistas Fiscais
(alguns associados a
fundos trabalhistas)
Hungria Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real Créd. Alimentícios Créditos Fiscais
Inglaterra Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Fisco e Prev. Social Créd. Trabalhistas
Irlanda Créd. c/ Gar. Real Créditos Fiscais
(limitados)
Créd. Trabalhistas
Israel Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas
(limitados)
Créditos Fiscais
(limitados)
Itália Extra-concursais Fiscais e Trabalhistas
(mediante ações de
apreensão judicial)
Créd. c/ Gar. Real
Japão Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas
Malásia Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas Créditos Fiscais
Polônia Créd. Fiscais Extra-concursais
(dívidas ativas c/
garantia na data da
falência – até 50% do
valor da venda do
ativo garantidor)
Créd. c/ Gar. Real
Portugal Créd. c/ Gar. Real Créd. Trabalhistas Extra-concursais Créditos Fiscais
Rússia Extra-concursais Créd. Trabalhistas Créd. c/ Gar. Real Créditos Fiscais
Singapura Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas
(limitados)
Suécia Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real Créditos Fiscais Créd. Trabalhistas
Suíça Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas
(limitados)
Tailândia Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real Créd. Trabalhistas
Rebública Tcheca Créd. c/ Gar. Real Extra-concursais Créd. Trabalhistas
Vietnã Extra-concursais Créd. c/ Gar. Real Créd. Trabalhistas Créditos Fiscais
Fonte: Insolvency & Restructuring 2003 - Getting the Deal Through Series - London: Law Business Research Ltd.,2003
87
3.5 Ambiente de Negócios
A capacidade de crescimento econômico sustentável no longo prazo é limitada pelas
dificuldades burocráticas e os custos não monetários para a produção, geração de empregos e
investimento. Por essa razão, o Governo tem estudado medidas para melhorar o ambiente de
negócios, de forma a ampliar a concorrência, reduzir custos de transação e fomentar o
empreendedorismo.
Particularmente importante é o estabelecimento de uma institucionalidade que estimule
a concorrência entre as empresas, sobretudo através de mecanismos que reduzam as restrições à
entrada potencial de novos produtores nos diversos mercados. Como forma de ampliar os
benefícios que um ambiente concorrencial confere aos consumidores, o Governo tem estudado
medidas para reestruturar o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência, além de estender a
aplicação da legislação antitruste ao sistema financeiro.
Além disso, o Governo está analisando medidas que diminuam os custos de transação
para a abertura e o fechamento de empresas. Os entraves burocráticos hoje existentes geram uma
perda de recursos para os empreendedores (na forma de tempo, contratação de intermediários, preparo
de documentos e laudos, etc.) que deveriam ser empregados no próprio negócio. Além disso, a
literatura econômica demonstra que quanto maiores os custos para abertura e fechamento de empresas
maior tende a ser a informalidade e a corrupção. Por essa razão, o Governo tem estudado a
simplificação dos procedimentos para a abertura e o fechamento de empresas, com o objetivo de
eliminar duplicações na exigência de documentação e reduzir os prazos para a obtenção de autorização
para atuar.
A melhoria do ambiente de negócios depende também da ampliação dos investimentos
em infra-estrutura. Para isso, o Governo encaminhou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei das
Agências Reguladoras, que define e separa claramente as atribuições das agências e dos Ministérios
setoriais. Além disso, esse projeto de lei assegura a independência das agências ao reforçar a
existência de mandatos fixos para seus presidentes. Com isso, espera-se oferecer a segurança
regulatória necessária para que o setor privado possa investir em setores nos quais o prazo de
maturação dos investimentos é longo. Outra iniciativa importante de ação para o setor de
infra-estrutura é a Lei das Parcerias Público-Privadas, que busca viabilizar a participação da
iniciativa privada em investimentos com alto retorno social. O esforço para construir um arcabouço
legal que viabilize essas parcerias se soma ao esforço para recompor a poupança pública e recuperar a
capacidade do Estado de fazer investimentos em infra-estrutura.
De maneira semelhante, o Governo também tem buscado viabilizar um ambiente
institucional propício à pesquisa e difusão de novas tecnologias, através do estímulo ao
relacionamento entre centros públicos de pesquisa e a iniciativa privada. O investimento em
88
pesquisa e desenvolvimento tecnológico tende a gerar ganhos de produtividade no setor produtivo,
incrementando o crescimento econômico de longo prazo. Por essa razão, aspecto central da Nova
Política Industrial, Tecnológica e do Comércio Exterior, coordenada pelo Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), é o estímulo à inovação e difusão de novas
tecnologias. A recente cria ção da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e do
Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI) permitirão para aprimorar os instrumentos
de política existentes, além de garantir maior eficácia e agilidade ao estímulo ao desenvolvimento
industrial e tecnológico. Igualmente importante é a nova Lei de Inovação, recentemente aprovada pelo
Congresso Nacional, que irá permitir parcerias mais eficazes entre o setor produtivo e os institutos
públicos de pesquisa.
3.5.1 Defesa da Concorrência
3.5.1.1 Reformulação do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência
O Governo está concluindo um projeto de lei para reestruturar o Sistema Brasileiro de
Defesa da Concorrência. Esse sistema é composto pela Secretaria de Acompanhamento Econômico
do Ministério da Fazenda, pela Secretaria de Direito Econômico e pelo Conselho Administrativo de
Defesa Econômica, ambos subordinados ao Ministério da Justiça. O Sistema Brasileiro de Defesa da
Concorrência analisa os casos de fusão e aquisição de empresas e práticas que possam gerar danos ao
ambiente concorrencial.
O projeto em discussão prevê uma integração das ações e estruturas desses três órgãos, com o
objetivo de reduzir a duplicação de tarefas, tornando o julgamento dos processos mais rápido e
eficiente. A demora na análise de eventuais processos de fusão ou aquisição, além de introduzir
elemento de incerteza sobre o funcionamento das empresas envolvidas, podendo afetar, inclusive
decisões de investimento, dificulta até mesmo a imposição de medidas que visem a reversão ou
atenuação de concentrações de mercado indesejáveis.
Pretende-se ainda implantar um sistema de análise prévia dos atos de fusão e aquisição, com
análises expressas para os casos de baixíssima probabilidade de afetar a concorrência. Dessa forma,
pretende-se voltar o foco para a investigação de práticas lesivas, como são os casos dos cartéis.
Espera-se, assim, que o sistema de defesa da concorrência, contribua ainda mais para a eliminação ou
atenuação de práticas anticoncorrenciais.
3.5.1.2 Concorrência no Se tor Bancário
O Projeto de Lei Complementar nº 344/2002 estende a aplicação da legislação antitruste
ao setor bancário. Essa medida pretende resolver a incerteza existente sobre a competência de análise
89
do impacto concorrencial de fusões no sistema financeiro. De acordo com o projeto, o Banco Central
ficará encarregado de determinar, dentre os casos de fusões e aquisições no âmbito do sistema
financeiro, aqueles que envolvem risco sistêmico, cuja análise do ato de concentração caberá ao Banco
Central. Todos os demais casos que não apresentem risco de danos ao sistema financeiro serão
enviados para a análise do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE).
3.5.2 Redução do Tempo para Abrir e Fechar Firmas
Uma das principais reformas necessárias para melhorar o ambiente de negócios no
Brasil diz respeito à regulação de entrada de novas firmas. Os diagnósticos existentes sobre a
regulação de entrada no Brasil demonstram que o custo de registrar e legalizar empresas é elevado,
sobretudo em termos do tempo gasto para se completar todo o processo de registro e legalização. O
custo para fechar uma firma no Brasil também é alto, o que impede que um empreendedor cujo
negócio não tenha dado certo se mova rapidamente para uma nova atividade. A título de ilustração, a
tabela abaixo apresenta o custo de oportunidade do processo de abertura de empresas no Brasil
conforme apurado em diferentes estudos:
Tabela VI – Abertura de Empresas no Brasil - Resultados de Alguns Estudos Selecionados
Estudo Duração do processo Custo
(% renda per capita)
Djankov et alli (2002) 67 dias 6,7%
Zylberstajn (2003) 64 dias 11,3%
Banco Mundial (2004) 152 dias 11,6%
Existem na literatura econômica diversos estudos que confirmam os impactos negativos para o
crescimento de longo prazo de elevados custos para abertura e fechamento de empresas. Djankov et
alli (2002) estudaram o processo de abertura de empresas em 75 países e concluíram que, nos países
onde o processo é mais lento e oneroso, maior tende a ser a corrupção e maior a informalidade.
Zylberstajn (2003), em um estudo específico para o Brasil, corrobora essa conclusão em pesquisa
realizada junto a empresas do setor têxtil em São Paulo e Minas Gerais, em que 11% das empresas
entrevistadas declararam “ter pago propina" para acelerar o processo de abertura e outras 39%
afirmaram já operar na informalidade antes de se legalizarem. Em seu relatório Doing Business de
2004, o Banco Mundial também confirma, ao analisar uma amostra de 130 países, que um processo
90
mais lento e oneroso tende a gerar mais informalidade, mais corrupção, menos investimento e menor
produtividade.
O efeito nocivo sobre a atividade econômica do excesso de burocracia na abertura de empresas
não se restringe ao caso brasileiro, e encontra-se também documentado em um estudo de Bertrand e
Kramarz (2002) sobre a Lei de Orientação do Comércio e Artesanato de 1974 na França, que passou a
exigir a aprovação das comissões locais de zoneamento para a criação ou expansão de grandes lojas de
varejo. Os economistas concluem que, sem essa "inovação legal", o nível de emprego no comércio
varejista na França seria, para o ano de 2002, 10% maior do que aquele que foi efetivamente
verificado. Alesina et alli (2002), em um estudo sobre a regulação de entrada nos setores regulados na
Itália, demonstra que, caso a Itália tivesse uma regulação de entrada semelhante à norte-americana, o
investimento privado como proporção do produto nos setores regulados seria 40% maior.
A importância de se promover reformas no processo de registro e legalização de
empresas desencadeou importantes iniciativas em diferentes países, desenvolvidos e em
desenvolvimento. Na Espanha, por exemplo, priorizou-se o acesso à informação, sendo que vários
ministérios passaram a operar conjuntamente uma página na Internet que informa todos os passos
necessários para o registro e legalização de uma empresa em cada localidade. O Paquistão também
seguiu a tendência de usar a tecnologia para promover a troca de informações entre órgãos públicos, e
interligou eletronicamente todos os órgãos fiscais. O número de registro fiscal, que antes levava uma
semana para ser obtido, passou a ser disponibilizado em poucas horas. Já o Vietnã estipulou em lei
prazos máximos para que os órgãos públicos se manifestassem e respondessem ao usuário. O tempo de
resposta, que era de aproximadamente 45 dias, foi reduzido para 19 dias no período de 1 ano. A África
do Sul, Bélgica, Itália e Moldávia passaram a utilizar um único número de registro para empresas. A
França seguiu a tendência de estabelecer um único local de entrada para o registro (sistema one stop
shop). O Centre de Formalité des Enterprises (CFE) é o local onde o empreendedor pode preencher
todas as declarações e fornecer todos os documentos necessários para o registro e a legalização.
A Turquia recentemente passou a utilizar o órgão de Registro do Comércio para estabelecer
uma entrada única de dados e documentos. Muitos países já fazem o registro de empresas pela
Internet, como o Canadá, Austrália, Áustria, Nova Zelândia e Cingapura. Em vários países, a pesquisa
de unicidade do nome empresarial já é feita via Internet, como na Coréia e no Reino Unido. A
necessidade de autenticação de documentos em cartório também vem sendo abolida. Encontra-se
totalmente abolida nos países nórdicos e raramente é utilizada nos países de influência anglo-saxônica.
No entanto, essa ainda é prática comum em muitos países da América Latina e da África.
No Brasil, o caminho a seguir ainda é longo. Dentre os principais problemas do processo de
registro e legalização de empresas no Brasil está a não-integração do processo, sendo o empresário
obrigado a preencher diversos cadastros e fornecer cópias de documentos a diversos órgãos. Muitas
91
vezes o empresário acaba percorrendo mais de uma vez a seqüência lógica do processo de abertura de
sua empresa, devido a problemas encontrados em uma de suas etapas. A obtenção do alvará de
funcionamento também é demorada, pois os prazos para a obtenção de licenças específicas são, em
geral, bastante longos. A tecnologia de informação ainda é muito pouco usada nesse processo,
havendo inclusive a obrigatoriedade do uso de formulários em papel e do serviço cartorário, o que
eleva o custo do processo. De maneira similar, ainda há pouca sensibilidade quanto à diferenciação
por porte da empresa, exigindo-se comumente o mesmo grau de escrituração e registro tanto de uma
grande empresa como para a pequena empresa.
Existem, porém, algumas tentativas de reformar e simplificar o processo de abertura e
fechamento de empresas. As Centrais de Atendimento FÁCIL, de iniciativa do Departamento
Nacional de Registro do Comércio (DNRC), e que contam com o apoio do Serviço Brasileiro de
Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), foram criadas para a prestação de serviços de
registro e legalização de empresas de forma integrada. Atualmente, existem Centrais FÁCIL em 11
Capitais do País e, na maior parte delas, o tempo gasto para a abertura de empresas é inferior a 10 dias.
Em São Luís do Maranhão, conseguiu-se a integração de etapas desse processo como resultado de
parceria entre o Governo Estadual e a Prefeitura Municipal. A Consulta Preliminar de Empresas de
São Luís permite ao usuário solicitar via Internet, antes de dar entrada no registro, resposta para as
consultas prévias relativas ao nome empresarial, consulta de localização, dentre outros. O Município
de Petrópolis, no Rio de Janeiro, reduziu de 15 para 3 o número de documentos exigidos e criou o
"alvará digital", que pode ser obtido via Internet. Assim, a empresa pode começar a funcionar
enquanto providencia a regularização perante outros órgãos de fiscalização. A Secretaria da Receita
Federal vem trabalhando com os Estados de São Paulo, Bahia e Rio Grande do Norte, para viabilizar o
cadastro sincronizado, unificando a inscrição fiscal no âmbito estadual e federal, o que simplifica o
cadastramento de empresas junto aos órgãos fiscais.
Apesar de já existirem iniciativas de sucesso, como as que foram acima elencadas, há
necessidade de uma maior disseminação dessas iniciativas por todo o País, atrelada à elaboração
de propostas para a desburocratização do processo e à elaboração de um instrumento legal
capaz de institucionalizar e dar amparo legal às iniciativas de integração como a da Central
FÁCIL. Neste mês de dezembro, o SEBRAE realizou o I Encontro Nacional das Centrais FÁCIL,
realizado em Fortaleza-CE, no qual foi pleiteada a elaboração de lei federal institucionalizando e
criando as Centrais FÁCIL nas 27 Capitais do País e em cidades de médio porte.
Diante da necessidade de avançar na reforma do processo de registro e da legalização de
empresas, o Governo elaborou, a partir de sugestões apresentadas por entidades públicas e privadas,
envolvidas direta e indiretamente no processo de abertura e fechamento de empresas, uma agenda de
ações cuja implementação não é imediata e requererá um diálogo permanente com Estados e
Municípios.
92
O primeiro objetivo dessa agenda de ações é aprimorar os instrumentos para a
orientação prévia ao usuário do sistema de registro e legalização de empresas. A principal ação
para atingir esse objetivo seria disseminar os Núcleos de Orientação e Informação (NOIs), nos moldes
daqueles já existentes nas Centrais FÁCIL, e que oferecem serviços como: consulta de nome
empresarial, orientação para descrição do objeto social, consulta de localização e endereço e consulta
de requisitos para atendimento de normas da Vigilância Sanitária e do Corpo de Bombeiros. Outra
ação sugerida é a construção de Portal de Orientação e Informação que visa disponibilizar via Internet
acesso à orientação e informações sobre cada etapa do processo de registro e legalização de empresas.
O segundo objetivo é acelerar a fase preparatória do registro aprimorando os
mecanismos de consultas prévias. Uma das principais ações nesse sentido seria a construção da
Central de Codificação da Classificação Nacional de Atividades Econômicas CNAE-Fiscal, que
permitiria uniformizar a atribuição de códigos de atividades econômicas para uso dos órgãos da
administração pública. A uniformização permite que o código CNAE-Fiscal da atividade seja
utilizado para pesquisar quais licenças e vistorias se fazem necessárias. Adicionalmente, a
uniformização da atribuição de códigos de classificação de atividade econômica abre espaço para a
compatibilização, em nível nacional, das exigências do Corpo de Bombeiros, da Vigilância Sanitária e
do Meio Ambiente segundo a natureza da atividade, permitindo tratamento igualitário de atividades de
mesma natureza em diferentes localidades do País.
O terceiro objetivo é estabelecer entrada única de dados e documentos, por meio da
implantação de Ficha Cadastral Única Eletrônica. O cadastro sincronizado, que vem sendo
desenvolvido pela Receita Federal com os Estados, é um primeiro passo para a unificação da entrada
de dados cadastrais. Contudo, para evitar a apresentação dos mesmos documentos a diversas
repartições públicas, propõe-se uma outra ação que compreende o uso da digitalização de documentos
e a criação de um banco de dados de imagens digitalizadas a ser consultado por todos os órgãos.
Outro objetivo é a simplificação do processo relativo à emissão de alvará, essencialmente
pela adoção do Alvará Provisório, que permitiria à empresa começar a funcionar logo após o
registro, mediante assinatura de termo de ciência e responsabilidade, exceto para algumas
atividades de risco. Com o Alvará Provisório, as empresas poderiam começar a funcionar
imediatamente após o registro na Junta Comercial ou Cartório de Registro Civil e a inscrição junto aos
órgãos fiscais, tendo um prazo maior para a obtenção de todas as licenças e para o cumprimento de
exigências necessárias à obtenção do Alvará definitivo.
O Governo pretende estudar também ações que eliminem excessos na verificação da
regularidade fiscal como fator impeditivo à constituição de nova empresa. Atualmente, no
momento que antecede o registro, procedem-se as mais diversas verificações de regularidade
fiscal. Em alguns casos, aproveita-se a ocasião do registro para checar a adimplência do empresário ou
93
dos sócios quanto ao Imposto Predial Territorial Urbano (IPTU) residencial e até mesmo quanto ao
Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA). Além disso, quando constatado o
impedimento por parte do empresário ou de um sócio, muitas vezes o que ocorre na prática é a
utilização da figura de um "laranja" para burlar o impedimento.
Para perseguir os objetivos acima mencionados e promover a implementação das respectivas
ações, o Governo irá criar Grupo de Trabalho, com representantes das esferas federal, estadual e
municipal. Esse Grupo de Trabalho é uma reivindicação de Estados e Municípios, que desejam
participar de forma mais ativa da discussão de propostas para a simplificação do registro e da
legalização de empresas. Esse grupo estaria também recebendo, permanentemente, sugestões de
entidades representativas das micro e pequenas empresas, como o SEBRAE, o Sindicato da Micro e
Pequena Indústria do Estado de São Paulo (SIMPI) e outras entidades como a Federação Nacional das
Empresas de Serviços Contábeis e das Empresas de Assessoramento, Perícias, Informações e
Pesquisas (FENACON).
3.5.3 Investimentos em Infra-Estrutura
Nas últimas décadas do século XX, o Leste Asiático apresentou um forte crescimento e
desenvolvimento econômico e social, principalmente quando comparado com o desempenho
observado nos países da América Latina. Como conseqüência, a diferença de renda per capita entre
os países dessas duas regiões duplicou. Cerca de um terço do aumento dessa diferença está
correlacionado com o maior investimento em infra-estrutura realizado nos países do Leste Asiático em
comparação com o realizado nos países da América Latina [Calderón e Sérven (2002)].
No caso brasileiro, historicamente, os investimentos em infra-estrutura foram realizados
com recursos públicos. Contudo, a partir dos anos oitenta, observou-se uma deterioração do resultado
fiscal do Estado, em parte devido a uma mudança demográfica com crescentes gastos sociais,
reduzindo a parcela de recursos do Estado brasileiro disponível para investimentos em infra-estrutura.
Nesse período, iniciou-se um processo de redução do investimento e da poupança pública, que se
agravou ao longo da década de noventa, ao longo da qual inclusive foi registrada significativa
despoupança pública.
Atualmente, o Brasil encontra-se ainda em um processo de ajuste, tendo por objetivo a
melhoria contínua da poupança pública e, portanto, da capacidade de realização de investimento
por parte do Governo (Gráfico 3.3). Essa recuperação da capacidade de financiamento do setor
público já tem permitido o aumento do investimento público, que poderá ser ampliado nos próximos
anos na medida em que se consolide o ajuste fiscal.
94
Gráfico 3.3 – Poupança em Conta Corrente do Setor Público
0
1
2
3
4
5
6
7
8
9
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Setor Público Consolidado
Setor Público - Conceito Estatais
Fonte: Secretaria de Política Econômica.
Neste contexto, é essencial que se crie um ambie nte favorável e seguro para que a iniciativa
privada realize os investimentos necessários em projetos de infra-estrutura que apresentem retorno
financeiro positivo, permitindo que o Estado focalize a utilização dos recursos públicos em políticas
sociais e em investimento público nas áreas em que o retorno social seja superior ao retorno privado –
nestas últimas, possivelmente em parceria com a iniciativa privada.
O Governo brasileiro vem construindo também, desde abril de 2004, em conjunto com o
Fundo Monetário Internacional (FMI), um Projeto-Piloto que vai permitir melhorar a qualidade
do gasto, de maneira a aumentar a relação custo-benefício dos investimentos. O objetivo é
introduzir mecanismos de seleção, implementação, monitoramento e avaliação que aumentem a
rentabilidade do gasto público de maneira durável. O Projeto Piloto vai permitir acelerar o gasto em
algumas áreas específicas, aumentar o total de investimentos em áreas específicas, cujo retorno esteja
bem identificado. Por exemplo, deve-se acelerar o gasto na recuperação de várias estradas, o que
permitirá, em muitos casos, pô-las em condições para ser licitada com concessão rodoviária,
diminuindo os compromissos fiscais futuros do país. Esse Projeto se estenderá por 3 anos, para
permitir o fortalecimento institucional e da capacidade de planejamento dos órgãos do governo central,
inclusive setoriais. Em suma, a proposta permitirá ampliar o investimento público em áreas chaves
para a continuidade do processo de crescimento sustentável, evitando o surgimento de gargalos na
infra-estrutura do País, sem comprometer o esforço fiscal empreendido e os conseqüentes ganhos de
credibilidade até aqui obtidos.
A regulamentação das Parcerias Público-Privadas (PPPs), agora concluída com a
aprovação do Projeto de Lei Complementar nº 10/2004 no Congresso Nacional, é também parte
importante da estratégia do Governo para ampliar os investimentos em infra-estrutura,
95
viabilizando a participação do setor privado em projetos com retorno social superior ao retorno
financeiro.
Contudo, são necessários também avanços no marco regulatório. Está em discussão no
Congresso Nacional o Projeto de Lei que define as regras das Agências Reguladoras (Projeto de Lei nº
3.337/2004), com o objetivo de gerar estabilidade regulatória, reduzindo os custos de transação e
criando um ambiente favorável a novos investimentos. A existência de um marco regulatório sólido e
eficiente constitui condição necessária à construção de um bom ambiente de negócios e à atração de
investimentos para o País. A estabilidade legal e institucional, em particular em setores cujas inversões
demoram para garantir o retorno necessário à sua viabilidade econômica e financeira, praticamente
bastam para dar garantias e previsibilidade ao empresário e convencê-lo a realizar seu investimento.
Outro aspecto importante é que os setores regulados são fornecedores de bens e serviços de
primeira necessidade para a população, como energia, água, telecomunicações, transporte terrestre e
aquático, vigilância sanitária, saúde e combustível.
O Projeto de Lei nº 3.337/2004 procura estabelecer de maneira clara e objetiva o limite
entre a regulação econômica – a cargo das Agências – e a formulação de política setorial – a
cargo do Ministério responsável. O Projeto de Lei procura ainda criar mecanismos mais
eficientes de controle social e de prestação de contas por parte das agências. Como resultado desta
regulamentação, procura-se estabelecer um conjunto estável – e homogêneo entre os setores regulados
– de regras para a atuação das Agências Reguladoras.
3.5.4 Política Industrial, Tecnológica e de Comércio Exterior (PITCE)
O conjunto de medidas que compõem a Política Industrial, Tecnológica e de Comércio
Exterior, coordenada pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), tem
como principal objetivo desenvolver o parque produtivo brasileiro, tornando-o mais eficiente,
competitivo e inovador, por meio do estímulo à inovação tecnológica, à diferenciação produtiva e
a expansão do comércio exterior.
O foco da nova política industrial proposta é o desenvolvimento de novos produtos, processos
e formas de aplicação, visando sempre a valorização dos recursos e vocações nacionais, a fim de
explorar nossas vantagens comparativas estáticas e dinâmicas. Dessa forma, quatro linhas de ação
foram propostas para a nova política: a inovação e o desenvolvimento tecnológico com aumento da
capacitação da indústria; a inserção externa mediante expansão do parque exportador; a modernização
industrial e a identificação de setores estratégicos com atributos específicos.
Os setores estratégicos foram identificados pelo seu forte dinamismo, distantes do ponto de
saturação tecnológica, como os que compõem a "Nova Revolução Industrial", como o de
96
biotecnologia e tecnologia da comunicação, e os setores com efeitos difusos sobre a estrutura
produtiva, como bens de capital.
Algumas medidas já foram adotadas no âmbito dessa nova política industrial. Uma primeira
foi a criação de uma linha de financiamento à aquisição de máquinas e equipamentos voltada para a
modernização da indústria: o MODERMAQ. Foi também lançado o Programa de Extensão Industrial
Exportadora a fim de promover e desenvolver o parque exportador brasileiro. Além disso, estão sendo
instituídos a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e o Conselho Nacional de
Desenvolvimento Industrial (CNDI), por meio de projeto de lei (Projeto de Lei nº 3.443/2004),
aprovado pelo Congresso Nacional e já enviado à sanção presidencial, que dotarão o Poder Executivo
de instrumento ágil, competente e capaz de executar a nova política industrial brasileira.
3.5.5 Pesquisa e Inovação
O apoio à inovação e difusão de novas tecnologias é uma das principais dimensões da
atual política governamental. Por essa razão, uma das prioridades da agenda em 2004 foi o trabalho
conjunto com o Congresso Nacional para aprimorar e aprovar a Lei de Incentivos à Pesquisa e
Inovação (Lei nº 10.973/2004), sancionada em dezembro.
O principal objetivo dessa Lei é a superação dos históricos entraves existentes na relação
entre as entidades públicas de pesquisa e a iniciativa privada, que limitam os possíveis benefícios
de parcerias entre o setor produtivo e os centros de pesquisa. Com a nova Lei de Inovação, foram
criados instrumentos e incentivos eficazes destinados a superar essa deficiência e, assim, permitir
maiores ganhos de produtividade por parte do setor produtivo.
O novo marco legal apresenta três principais direções: o estímulo a uma participação
mais efetiva das chamadas Instituições Científicas e Tecnológicas - ICTs (universidades, centros
e institutos de pesquisa públicos) no processo de inovação; o incentivo à inovação no setor
privado; e o estreitamento do relacionamento entre as esferas pública e privada na pesquisa e no
desenvolvimento.
Dentre os instrumentos previstos estão a possibilidade de celebração de convênios e parcerias
entre as ICTs e empresas privadas, a transferência de tecnologia desenvolvida pela ICT ao setor
privado (com a definição de pagamento de royalties e participações no faturamento), a participação de
pesquisadores públicos em projetos de outras ICTs e o compartilhamento da infra-estrutura de
laboratórios, equipamentos e instrumentos públicos com empresas privadas envolvidas em projetos de
inovação.
97
Com esse projeto, espera-se uma melhor interação entre universidades e o setor produtivo,
celebrando parcerias para reforçar ainda mais a busca pela inovação, colaborando decisivamente para
o crescimento econômico de longo prazo.
3.5.6 Desburocratização das Exportações
Estão sendo implementadas reformas que buscam tanto a ampliação do comércio
externo e dos fluxos de capital, quanto a redução das distorções nos sistemas tributário e
financeiro. Como destacado no documento “Política Econômica e Reformas Estruturais”, publicado
pelo Ministério da Fazenda em 2003, países com maior volume de comércio tendem a apresentar
menor volatilidade da taxa de câmbio em resposta a choques externos. Dessa forma, o estímulo ao
aumento do volume de comércio (exportações mais importações como fração da renda nacional) tem
como conseqüência importante a redução da vulnerabilidade externa da nossa economia.
O aumento do volume de comércio exterior permite também o acesso, via importações, a
novos insumos e a bens de capital mais baratos e mais eficientes [Lisboa, Menezes-Filho e Schor
(2002)]. Além disso, a produtividade de uma firma que exporta tende a crescer mais
rapidamente que a média, incrementando o crescimento do País. O gráfico 3.4 mostra que as
firmas exportadoras tiveram uma taxa média anual de crescimento da produtividade (2,9%) quase duas
vezes maior que a taxa média anual de crescimento da produtividade das firmas que não exportam
(1,5%). A exposição das empresas exportadoras ao padrão de competição internacional funciona como
um incentivo à agregação tecnológica e à inovação, constituindo importante fonte de ganhos de
produtividade para as firmas brasileiras. Além disso, o aumento das exportações melhora a solvência
externa do País e abre espaço para a importação de produtos cada vez mais sofisticados e necessários à
modernização do parque produtivo brasileiro. Finalmente, os empregos gerados em setores
exportadores são de melhor qualidade e remuneram acima da renda média do trabalhador brasileiro.
A desburocratização das exportações é peça chave neste processo ao permitir ganhos de
eficiência que também propiciam crescimento e desenvolvimento econômico. Diversas medidas
foram tomadas e outras estão em estudo para simplificar, dar maior agilidade e competitividade às
exportações e incentivar a produção voltada para o mercado externo. Busca-se, além disso, ampliar e
desconcentrar a base exportadora brasileira, com a inclusão de pequenas e médias empresas. A
integração da política de comércio exterior com a política industrial e tecnológica visa orientar a
expansão da pauta de produtos primários e ampliar ainda mais a pauta de produtos com maior
conteúdo tecnológico.
98
Gráfico 3.4 - Crescimento Médio Anual da Produtividade das Firmas Brasileiras: 1996-2000
(por característica da indústria ou das firmas)
2,8
3,8
1,5
3,4
2 , 1
2 , 9
3,0
1,5
2 , 9
2,0
3,2
1,9
0 , 0 0,5 1,0 1 , 5 2,0 2 , 5 3,0 3,5 4 , 0
MANUFATURAS (TOTAL)
PRODUÇÃO DE COMERCIALIZÁVEIS
PRODUÇÃO DE NÃO-COMERCIALIZÁVEIS
COMERCIALIZÁVEIS NO MERCOSUL
NÃO-COMERCIALIZÁVEIS NO MERCOSUL
EXPORTADORES
EXPORTADORES NO MERCOSUL
NÃO-EXPORTASDORES
USUÁRIOS DE INSUMOS IMPORTADOS
NÃO-USUÁRIOS DE INSUMOS IMPORTADOS
EMPRESAS DOMÉSTICAS
EMPRESAS MULTI-NACIONAIS
Fonte: López-Córdova e Moreira (2003).
Dentre as medidas lançadas nesse contexto, até o momento, merece destaque o Programa
Brasil Exportador, lançado em novembro de 2003, com a finalidade de desenvolver a cultura
exportadora do País e dar condições para que se possa exportar mais e melhor. O Programa é
composto por 44 projetos, envolvendo campanhas institucionais que buscam difundir a cultura e
imagem do Brasil no exterior; o fortalecimento do seguro de crédito à exportação; a criação de linhas
de crédito para o pequeno exportador; o treinamento de profissionais em comércio exterior; a
capacitação de micro e pequenas empresas em relação ao design do produto; a criação de consórcios
de exportação; a adequação tecnológica dos produtos entre outros.
Outra medida importante para a desburocratização dos procedimentos de comércio exterior foi
a publicação da Portaria SECEX nº 11/2004, que trata da simplificação do Regime de Drawback20,
regime este que permite a suspensão ou isenção de impostos de mercadorias ou insumos importados,
desde que sejam utilizados em bens que serão exportados posteriormente. Segundo dados do MDIC,
em agosto de 2004, 2.700 empresas faziam uso desse sistema e, em 2003, US$ 20 bilhões dos US$ 70
20 Na legislação atual, há duas modalidades de drawback: suspensão do pagamento e isenção dos tributos. Na
primeira modalidade, que corresponde a 80% das operações e é feita eletronicamente, o pagamento dos tributos
fica suspenso até que o empresário comprove que a matéria prima importada irá ser destinada à fabricação de
produto exportado. Na segunda modalidade, o exportador está isento de pagamento dos tributos exigíveis na
importação, em quantidade e qualidade equivalente à utilizada no beneficiamento ou fabricação de produto já
exportado. Neste tipo de modalidade, o drawback ainda é feito de forma documental.
99
bilhões exportados utilizaram o mecanismo de drawback. Até agosto de 2004, foram registradas cerca
de 6.000 operações de drawback, com 75% dos pedidos aprovados automaticamente pelo sistema.
A Portaria SECEX nº 11/2004 consolida e simplifica 11 atos normativos, representando mais
um passo na desburocratização dos procedimentos de comércio exterior. Seu principal benefício é a
elevação do prazo de comprovação de 30 dias para 60 dias das exportações na modalidade suspensão.
Dessa forma, o exportador passa a ter um prazo maior para o preenchimento eletrônico dos
documentos que comprovam o compromisso assumido para o uso do incentivo à exportação. Nos
casos em que a mercadoria chegar ao exterior sem condições de uso, foi eliminada a necessidade do
Departamento de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
(MDIC) examinar a documentação da mercadoria exportada, nas hipóteses aceitas pela Secretaria da
Receita Federal (SRF). A partir de agora, a empresa precisará apenas consultar a SRF, evitando gastos
desnecessários.
A Portaria SECEX nº 12/2003, conhecida como Portaria Consolidada de Exportação consolida
leis, atos, normas, outras portarias da SECEX e decretos que regiam o comércio exterior em um único,
revogando-se assim 29 Portarias do MDIC. Essa portaria inclui 200 novos produtos que não estão
mais sujeitos à anuência prévia, ou seja, não será mais necessária a autorização anterior à exportação
de vários produtos controlados por 11 diferentes órgãos governamentais. Também consta dessa
portaria a eliminação do Registro de Venda (RV) para a exportação de alumínio, café solúvel e cacau.
O RV é um documento informatizado que permite ao exportador realizar vendas para embarques
futuros, utilizando-se de mecanismos e garantias das bolsas internacionais de mercadorias. Como a
comercialização destes produtos não se baseia direta e necessariamente nas cotações das bolsas
internacionais, o RV passa a não ser mais necessário quando se referem à exportação desses itens.
Amplia-se também a lista de produtos passíveis de exportação em consignação, que é um
procedimento fundamental para permitir que os exportadores disponibilizem o produto, no mercado
externo, antes que a venda tenha sido efetivamente realizada. A portaria ampliou a lista dos itens
amparados por este instrumento, que passa a abranger desde produtos agrícolas, até produtos
intermediários e finais, aumentando a competitividade brasileira no mercado mundial. Outra mudança
trazida por essa portaria foi a anulação do limite de US$ 50 para Registros de Exportação (RE), no
caso de agrupamento de diferentes preços unitários para mercadorias classificadas de acordo com o
mesmo código de produtos. O exportador deve preencher agora apenas um RE, quaisquer que sejam
os preços unitários. Antes os exportadores deviam preencher um RE para cada faixa de preço e tipo de
produto.
100
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ITANHAÉM, MEU PARAÍSO

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MARQUINHOS, NOSSAS ROSAS ESTÃO AQUI: FICARAM LINDAS!

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COMO NASCEU ESTE BLOG?

Cursei, de 2004 a 2008, a graduação em Direito na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (FDSBC).

Registrava tudo o que os professores diziam – absolutamente tudo, incluindo piadas, indicações de livros e comentários (bons ou maus). Por essa razão, eram as anotações bastante procuradas.

Entretanto (e sempre existe um entretanto), escrevia no verso de folhas de rascunho, soltas e numeradas no canto superior direito, sem pautas, com abreviações terríveis e garranchos horrorosos que não consigo entender até hoje como pudessem ser decifradas senão por mim.

Para me organizar, digitava os apontamentos no dia seguinte, em um português sofrível –deveria inscrever sic, sic, sic, a cada meia página, porque os erros falados eram reproduzidos, quando não observados na oportunidade em que passava a limpo as matérias -, em virtude da falta de tempo, dado que cumulei o curso com o trabalho e, nos últimos anos, também estagiei.

Em julho de 2007 iniciei minhas postagens, a princípio no blog tudodireito. A transcrição de todas as matérias, postadas em um mesmo espaço, dificultava, sobremaneira, o acompanhamento das aulas.

Assim, criei, ao sabor do vento, mais e mais blogs: Anotações – Direito Administrativo, Pesquisas – Direito Administrativo; Anotações – Direito Constitucional I e II, Pesquisas – Direito Constitucional, Gramática e Questões Vernáculas e por aí vai, segundo as matérias da grade curricular (podem ser acompanhados no meu perfil completo).

Em novembro de 2007 iniciei a postagem de poemas, crônicas e artigos jurídicos noRecanto das Letras. Seguiram-se artigos jurídicos publicados noJurisway, no Jus Navigandi e mais poesias, na Sociedade dos Poetas Advogados.

Tomei gosto pela coisa e publiquei cursos e palestras a que assistia. Todos estão publicados, também, neste espaço.

Chegaram cartas (pelo correio) e postagens, em avalanche, com perguntas e agradecimentos. Meu mundo crescia, na medida em que passava a travar amizade com alunos de outras faculdades, advogados e escritores, do Brasil, da América e de além-mar.

Graças aos apontamentos, conseguia ultrapassar com facilidade, todos os anos, as médias exigidas para não me submeter aos exames finais. Não é coisa fácil, vez que a exigência para a aprovação antecipada é a média sete.

Bem, muitos daqueles que acompanharam os blogs também se salvaram dos exames e, assim como eu, passaram de primeira no temível exame da OAB, o primeiro de 2009 (mais espinhoso do que o exame atual). Tão mal-afamada prova revelou-se fácil, pois passei – assim como muitos colegas e amigos – com nota acima da necessária (além de sete, a mesma exigida pela faculdade para que nos eximíssemos dos exames finais) tanto na primeira fase como na segunda fases.

O mérito por cada vitória, por evidente, não é meu ou dos blogs: cada um é responsável por suas conquistas e a faculdade é de primeira linha, excelente. Todavia, fico feliz por ajudar e a felicidade é maior quando percebo que amigos tão caros estão presentes, são agradecidos (Lucia Helena Aparecida Rissi (minha sempre e querida amiga, a primeira da fila), João Mariano do Prado Filho e Silas Mariano dos Santos (adoráveis amigos guardados no coração), Renata Langone Marques (companheira, parceira de crônicas), Vinicius D´Agostini Y Pablos (rapaz de ouro, educado, gentil, amigo, inteligente, generoso: um cavalheiro), Sergio Tellini (presente, hábil, prático, inteligente), José Aparecido de Almeida (prezado por toda a turma, uma figura), entre tantos amigos inesquecíveis. Muitos deles contribuíram para as postagens, inclusive com narrativas para novas crônicas, publicadas no Recanto das Letras ou aqui, em“Causos”: colegas, amigos, professores, estagiando no Poupatempo, servindo no Judiciário.

Também me impulsionaram os professores, seja quando se descobriam em alguma postagem, com comentários abonadores, seja pela curiosidade de saber como suas aulas seriam traduzidas (naturalmente os comentários jocosos não estão incluídos nas anotações de sala de aula, pois foram ou descartados ou apartados para a publicação em crônicas).

O bonde anda: esta é muito velha. A fila anda cai melhor. Estudos e cursos vão passando. Ficaram lá atrás as aulas de Contabilidade, Economia e Arquitetura. Vieram, desta feita, os cursos de pós do professor Damásio e da Gama Filho, ainda mais palestras e cursos de curta duração, que ao todo somam algumas centenas, sempre atualizados, além da participação no Fórum, do Jus Navigandi.

O material é tanto e o tempo, tão pouco. Multiplico o tempo disponível para tornar possível o que seria quase impossível. Por gosto, para ajudar novos colegas, sejam estudantes de Direito, sejam advogados ou a quem mais servir.

Esteja servido, pois: comente, critique, pergunte. Será sempre bem-vindo.

Maria da Glória Perez Delgado Sanches